31 janeiro, 2007

Tu eras também uma pequena folha




Tu eras também uma pequena folha
que tremia no meu peito.
O vento da vida pôs-te ali.
A princípio não te vi: não soube
que ias comigo,
até que as tuas raízes
atravessaram o meu peito,
se uniram aos fios do meu sangue,
falaram pela minha boca,
floresceram comigo.
(Pablo Neruda)

Faz de conta...


Hoje vamos brincar ao "faz de conta". Faz de conta que eu estou muito bem disposta para falar e que vocês estão cheios de paciência para me escutarem.

Faz de conta que és o Luís Sepúlveda e que eu sou uma amiga tua. Combinámos encontrar-mo-nos no café e tu já estás à minha espera... sento-me peço uma "italiana" e peço-te desculpas porque me atrasei no cabeleireiro. Ficas entusiasmado por eu ter ido ao cabeleireiro. Aliás, notaste logo que eu tinha ido ao cabeleireiro, porque és um tipo observador e não és casado comigo. Pedes-me como uma criança

- Conta-me tudo o que se passou no cabeleireiro!

Fico contente porque notaste que eu fui ao cabeleireiro. Quando chegar a casa o meu marido olhará "através" de mim e é claro que não notará diferença nenhuma no tamanho do cabelo... tu notaste e eu sinto, só por isso, que passei a existir. Há pelo menos alguém neste mundo, para quem existo! Decido então que tu mereces que eu te conte tim-tim-por-tim-tim o que se passou no cabeleireiro.

- Vou sempre ao mesmo cabeleireiro aqui do bairro. Sou cliente da "patroa" que já morou no meu prédio e de quem conheço o marido, os filhos, os netos... Costumamos falar de tudo e de nada. Peço-lhe muitas vezes que esteja atenta quando a minha mãe lá vai (e essa é uma boa cliente, porque vai pelo menos uma vez por semana), por causa das confusões que ela faz com datas e dinheiro, devido à arteriosclerose avançada... ela conta-me sempre as ultimas peripécias passadas com ela e afinamos estratégias para a ajudar sem que ela dê conta.

Hoje quando cheguei, e porque sou a única cliente que ela atende sem marcação prévia, porque sabe que eu sou repentista e não me dou bem com marcações de cabeleireiro, porque tenho que estar "para ali virada" no momento. Então, como te digo, ela tinha saído há dez minutos conforme me informou a empregada, que também conheço há imensos anos, pois que ali está há uma pequena eternidade. Não havia clientes e perguntei-lhe se ela se importava de me atender. Respondeu-me que me atendia, mas que não se responsabilizava, uma vez que a patroa é que conhece bem o meu cabelo. Disse-lhe que não havia drama nenhum. O cabelo cresce rapidamente, por isso nunca me ralo muito quando não fica exactamente como eu quero.

Lá fui tentando explicar como era o "corte". Falei-lhe numa personagem de uma novela para ela saber o que eu queria mas ela disse-me que não via novelas. Deu-me então uma revista e penteados para a mão para eu ver o que queria. Disse-lhe o que queria "mas mais curto".

Ela começou a cortar. Entretanto o telefone tocou e ela foi atender. Olhei para a parede à minha direita e vi uma fotografia do "corte" que eu queria exactamente. Quando ela desligou e voltou, disse-lhe, isto mesmo aqui à nossa frente e eu sem ver.

E ela lá foi cortando e fomos conversando como sempre da minha mãe, porque é lá que eu me informo melhor do que ela se queixa e das mazelas que as pessoas lhe notam. Podes crer, Luís, não existe melhor sítio para se ficar a saber tudo de uma mulher que o cabeleireiro. Entretanto uma senhora de nacionalidade brasileira que estava a ser "tratada" pela manicura, começou a falar de novelas e eu fiquei a saber que ela via tudo quanto é novela brasileira. Ficou desiludida por eu não saber do que ela estava a falar. Mas aconselhou-me vivamente a ver a da TV Record às 20.30. Disse-lhe que a essa hora via as notícias e ela informou-me logo que eu podia bem ver as notícias antes ou depois... pois claro. O que eu não posso é perder aquela novela. Parece que tem muitos funerais, mas depois as pessoas "regressam", o que me deixa um pouco mais sossegada quanto ao meu futuro.

E agora Luís, meu querido Luís Sepúlveda, diz-me do que trata o teu próximo romance.

30 janeiro, 2007

À breve, azul cantilena


À breve, azul cantilena
dos teus olhos quando anoitecem.
(Eugénio de Andrade)

Há coisas que nunca mudam: a amizade de verdade é uma delas!

Os amigos servem para os maus momentos. E para os bons dir-me-ão... mas há amigos com que estou apenas nos momentos muito maus. Porque a distância a que vivem de mim é tão grande que não dá para ser de outra maneira. Não percebo como se pode viver atrás das pedras uma vida inteira, passar anos sem ver o mar... não percebo!
Pois o que se passa nos funerais é que para além da tristeza, geralmente existe a alegria de rever velhos amigos. Hoje revi pessoas que não via há 30 ou 35 anos. É verdade. Hoje revi o meu primeiro namorado, (vive no Porto e eu nem sabia...) e o que nos rimos, porque ele conheceu-me (deve ser devido à minha imagem de marca) e eu não conseguia sequer imaginar quem era... se passasse na rua pela maior parte das pessoas que ali estavam e que fizeram parte da minha infância não conheceria nenhuma. É verdade. O que o tempo faz connosco! O marido da minha amiga estava chocado comigo. Realmente é dos poucos que eu tenho visto com alguma regularidade ao longo dos anos. Pois não o conheci! Ele dizia-me com um ar muito triste "mas eu estou assim tão velho"?. Não amigo, na verdade nunca consegui imginar-te assim para o "gordito", tu que eras um pau de virar tripas, nem calvo, tu que até há pouco tempo tinhas uma farta cabeleira. Mas estás bonito na mesma, não te preocupes. Gosto muito de ti, porque tens sido sempre o amparo da minha amiga. Que tem penado muito nesta vida, mas tem uma bela família: um marido como tu e duas filhas amorosoas.
Para além de todas as mães destes amigos que me perguntavam "sabes quem sou Bebé?" e eu a disfarçar "sim claro, é uma das tias". Porque na verdade eles eram a família que eu nunca tive em Angola e o "Dadinho"/ Eduardo, já se vê era assim a modos que primo meu... e quando eu dizia isto a malta gozava e saía-se com a célebre "quanto mais prima, mais se lhe arrima". A verdade é que foi um namorico infantil que nunca passou do beijo ao de leve nos lábios e que eu já achava uma grande "ousadia"... parece que ainda me sinto corar quando penso naquele beijinho...
Como o tempo passa... mas o meu primeiro namorado continua bem giro, lá isso é verdade. E vaidoso sem incomodar, porque continua a dizer tudo a "brincar".
Apesar do desgosto dos meus amigos e dos filhos deles, soube-me bem levar um dia inteiro a ouvir chamar por mim como "Bebé". Ao princípio ainda disse sou a Maria Eduarda, mas logo me responderam que para eles seria sempre a Bebé. Fico contente por me verem ainda dessa maneira...

QUESTÕES SEMPRE ADIADAS

O mês de Janeiro está chegando ao fim.Apetece-me dizer que não foi grande coisa . Mas que culpa tem Janeiro das negligências de um país que deixa o mar invadir violentamente as suas costas, a avisar-nos, mais uma vez, que isto agora é muito a sério? Que culpa tem Janeiro, que até nos mimoseou, há dias, com neve em Lisboa, para alegria das crianças, que o governo de Sócrates fuja, como o diabo foge da cruz, de atacar seriamente o problema sério da corrupção? Que culpa tem Janeiro do estado ingovernável e com suspeitas graves de negócios ilícitos e de corrupção na Câmara de Lisboa?Que culpa tem Janeiro das fugas de Informação precisamente quando o processo do Apito Dourado foi reaberto, com base no surgimento de novos indícios de corrupção?Que culpa tem Janeiro que o sr engenheiro Sócrates continue em alta de popularidade nas sondagens de opinião a despeito de ter governado, criando inimigos em todos os grupos profissionais, com excepção da Direita e dos srs empresários que com ele vão de avião para a China, no momento em que escrevo? Como é possível isto acontecer, quando o investimento não existe, o desemprego mantem-se elevado, a inflação também, estamos cada vez mais afastados, em termos de crescimento e desenvolvimento, dos outros países europeus, dos quais nos queremos aproximar, os preços dos bens sobem todos os meses, as taxas de juro continuam em alta progressiva,com os reflexos conhecidos no encarecimento do crédito e no enriquecimento das instituições bancárias, que não pagam, em termos relativos, os impostos que deviam pagar, as urgências dos hospitais fecham,( a ideia de fechar as urgências no Curry Cabral e enviar as pessoas para o S. José até parece maldade... ), as matenidades também e as crianças já nascem nas ambulâncias?Que culpa tem Janeiro da demagogia desenfreada usada na campanha do referendo à despenalização da IVG ( Interrupção Voluntária da Gravidez ), em que as forças do Não já compararam o aborto à pena de morte de Saddam e coisa igual, para quem o pratica, sabe Deus com que dôr e sofrimento, a pessoas como Hitler?!Que culpa tem Janeiro de vivermos num país em que as pessoas parecem adormecidas, sem espírito crítico, a esmagadora maioria dos analistas políticos analisando dentro dos limites do politicamente correcto ( com pequenas excepções)?!Será este um país livre, participativo, democrático?! Não me parece.O que me parece é que existem problemas graves, cuja resolução pemanece adiada.
Um país em que problemas, como o da corrupção, que se arrasta, há anos e anos, continua como algo em que o poder político tem medo de meter as mãos, não vá ele também queimar-se.E porquê?Basta pensar que é muito delicado - e exige coragem - um poder político, cujo financiamento depende,grosso modo, do mundo empresarial, ir tomar medidas contra os laços demasiado estreitos que existem entre os empresários e os governos, incluindo este, como é evidente, desde o princípio...
Também não deposito grandes esperanças que lá se vá através do processo Apito Dourado. Não obstante a competência de Maria José Morgado, vejam como o Polvo atacou de imediato quando ela reabriu o processo, num sinal/aviso de que era melhor ela não se meter em territórios, onde os papalvos estão proibidos de entrar.... Claro que Maria José Morgado não vai desistir. Só que o problema é outro: como se vai provar que os árbitros receberam dinheiro? Onde estão os recibos?. De facto, as provas...nunca aparecem...Por isso receio bem que esta batalha vai levar ainda excessvo tempo, mesmo com um governo socialista, e de maoria absoluta!
E na Câmara de Lisboa, não se assiste também ao mesmo desejo de adiamento, aqui com a particularidade de convir dexar afundar o barco, à espera de melhor oportunidade... táctica? Parece mentira, mas é verdade!.. Convém ao PS deixar apodrecer a situação para mais tarde, juntamente com as legislativas, tirar proveito e ganhar. O PS, que neste processo tem mostrado, como sabemos, uma divisão enorme, entre os seus elementos, com o Professor Carrilho a abandonar o barco e com o Partido a desautorizar o nº 2 da lista, indiferente ao facto de este ter dito a verdade: Carrilho não ia às reuniões, não conhecia os dossiês.Também ao PSD não convém que haja eleições intercalares!Seria uma derrota estrondosa e o Partido tem outros problemas, de liderança e de credibildade , para resolver!Como vêem, num momento em que a autarquia não funciona e nãio tem condições para funcionar, estes partidos,os maiores, tão democráticos,não defendem o veredicto popular!
Outro problema, sempre adiado, é o do avanço do mar.Há muitos anos que o mar já tinha avisado que tal podia acontecer com estas dimensões.Não só na Costa da Caparica, mas também na Costa Oeste e na Ria Formosa.Os técnicos tinham a obrigação de saber. Então o que dizem agora sobre o erro grave de não se deixarem os sedimentos dos rios descerem até ao mar, devido à construção de muitas barragens, não permitindo que eles fossem formar uma protecção natural, isso que dizem agora, eles não o sabiam já? Por que não serviu tal conhecimento para que o poder das autoridades fosse iluminado, refreando interesses materiais e privados? Não sabiam os técnicos e os srs engenheiros que o retirar das areias de um local para outro era abrir caminho para que o mar avançasse?!Não sabiam os autarcas e as restantes autoridades que o centro da Costa da Caparica fica abaixo do nivel do mar?!Não sabemos já todos que o aquecimento global não é uma hipótese, mas uma certeza, com resultados evidentes de há uns anos a esta parte?! E havendo já esse cnhecimento foi-se roubar areia à Costa da Caparica para a Expo?!Quantas mortes não houve já em Portgal por causa do roubo das areias à mãe Natureza?!Não se lembram da tragédia da ponte de Entre- os- Rios? Quantas mais mortes vai haver, se permitirmos continue esta negligência?
Entretanto, o Sr engenheiro Sócrates, depois de ter sido mal-criado e agressivo, no Parlamento, rotulando de asneiras, propostas válidas de luta contra a corrupção, apresentadas por João Cravinho, parte para mais uma viagem à China, acompanhado de mais de meia centena de empresários, viagem em que deposito poucas ou nenhumas esperanças, por motivos que já tive a oprtunidade de explicar, há pouco tempo, no nosso blogue.(1)A sua popularidade continua em alta, por enquanto. Embora o povo português goste de pessoas autoritárias, penso que não tardará que mude de opinião. É uma questão de se certificar que os resultados da política prosseguida não são aqueles que têm sido servidos na bandeja populista da propaganda. Ainda não se certificou. Leva algum tempo.. Mas não tardará, penso. Bastará a escassez dos resultados. Quando esse momento chegar, toda esta irmandade, esta família cinzenta, esta falsa segurança, começará a desfazer-se com a mesma facilidade, descaramento e portunismo com que se uniu. Claro que o momento a que me refiro poderá ser abreviado. Tal acontecerá se surgir uma liderança de oposição e de poder com criatividade e força. Pode acontecer.Entendo que Sócrates só é bom porque não apareceu aé agora alternativa. Domina no deserto dos adversários e das ideias, o que é fácil.Outro factor que pode abreviar a sua queda será, no mundo político dos negócios, que o governo parece ter privilegiado, que os negócios não dêem logo lucro, como é do gosto e da pouca visão dos nossos empresários...


Eduardo Aleixo

(1) A não ser que Sócrates tenha falado com Virgínia Trigo, especialista da cultura chinesa. Vale a pena ler o artigo que escreveu hoje, no Diário de Notícias, com o título: " Toca e foge", sem sucesso na China. Enumera 8 pontos, cujo conteúdo considera fundamental para que se tenha êxito na China. Eu compreendo-a muito bem, porque lá vivi. Não resisto a transcrever parte de apenas dois pontos, importantes para quem quer ir à China e fazer negócios duradouros.Mas todos os oito pontos são essenciais:

Ponto 4: « Nenhuma estratégia de " toca e foge" poderá ter sucesso na China. Se as visitas oficiais,por importantes que sejam - e sem dúvida são-no - não forem de imediato e continuamente seguidas no terreno quer a nível oficial quer particular, em consonância, jamais passarão de boas, mas inconsequentes intenções.»

Ponto 7: « Uma decisão na China não é o resultado de um debate nem da decisão de um chefe, mas antes o produto da adesão de todos ,o que pode demorar tempo e nem sempre é visível aos olhos dos ocidentais...»

29 janeiro, 2007

Soneto


Fecham-se os dedos donde corre a esperança,
Toldam-se os olhos donde corre a vida.
Porquê esperar, porquê, se não se alcança
Mais do que a angústia que nos é devida?
Antes aproveitar a nossa herança
De intenções e palavras proibidas.
Antes rirmos do anjo, cuja lança
Nos expulsa da terra prometida.
Antes sofrer a raiva e o sarcasmo,
Antes o olhar que peca, a mão que rouba,
O gesto que estrangula, a voz que grita.
Antes viver do que morrer no pasmo
Do nada que nos surge e nos devora,
Do monstro que inventámos e nos fita.
(José Carlos Ary dos Santos)















O que não se sabe não magoa.



A morte não torna as pessoas melhores nem piores. Pelo menos para mim. O que foram, o que fizeram em vida é o que conta. E quando pensei que de hoje não passava, olhei para trás e achei que tenho feito muito pouco pelos meus semelhantes. Tenho que me tornar mais atenta... não estou a falar dos amigos, estou a falar das pessoas que passam por mim sem que eu as veja, sem que eu me dê conta se precisam ou não de ajuda. Tenho que me tornar mais atenta. Não posso prestar atenção apenas à beleza mas também aos que me rodeiam. A partir de agora vou fazer os possíveis por me tornar mais atenta... não quero volta a ter este sentimento de... nem sei que nome dar-lhe... arrependimento, não: é demasiado forte e não é coisa que eu use. Não importa o nome. Importa é que me torne mais atenta a partir de agora e pronto.
E estava a eu a pensar que não passava de hoje, completamente de gatas, quando recebo a notícia da morte do pai de uma amiga de infância, daquelas quase irmãs, com quem partilhámos os segredos de adolescência, daquelas a quem ajudámos a esconder dos pais o namorado, daquelas por quem fizemos o que podíamos e o que não devíamos.
Quando era miúda, lembro-me bem, gostava muito deste homem. Pessoalmente não tenho nada que dizer... só que depois de adulta soube de coisas tão horríveis a seu respeito que lhe perdi todo o respeito e tanto o evitei que há anos não o via. Quando era miúda pensava que era um homem branco, só depois soube que era de cor: e por sinal de uma cor bem feia.
Mas os filhos não sabem e é por eles que amanhã estarei no velório e no funeral. Porque fui muito amiga de ambos (ainda sou), uma vez que sou vizinha do mais velho que casou com alguém de quem gosto muito e que me visita frequentemente.
Mas do morto não me ficam saudades. Fica apenas a mágoa de ter descoberto tarde demais quem era e a incerteza do dever de contar ou não aos filhos o que ele fez. Mas agora prefiro que guardem uma boa memória do pai. O que não se sabe, não magoa.

O HOMEM VELHO E A SUA HORTA


POEMA

A horta que plantaste
Toda a vida
Como o sonho
Da tua vida
Olhas para ela agora
Velho
Sentado
Inválido.
Como podes evitar as lágrimas?
( Quintela de Azurara,16 /2/1999 )
Eduardo Aleixo

28 janeiro, 2007

Samba da Benção - Vinicius de Moraes

... a alegria é a melhor coisa que existe


Fala

Fala a sério e fala no gozo
Fá-la pela calada e fala claro
Fala deveras saboroso
Fala barato e fala caro
Fala ao ouvido fala ao coração
Falinhas mansas ou palavrão
Fala à miúda mas fá-la bem
Fala ao teu pai mas ouve a tua mãe
Fala francês fala béu-béu
Fala fininho e fala grosso
Desentulha a garganta levanta o pescoço
Fala como se falar fosse andar
Fala com elegância - muito e devagar.


(Alexandre O'Neill)

Obrigada, José Sá Fernandes


Muita gente me critica por votar em partidos como o Bloco de Esquerda. Não tenho quaisquer problemas em admitir em quem voto. Nunca votei em grandes partidos. Nunca votei para o governo. Nunca o farei.

Porque, um governo por melhor que seja, precisa sempre de uma oposição excelente. Voto, portanto para a Assembleia da República.

Quando se trata de autárquicas, o sentido do meu voto é o mesmo.

O caso da Câmara de Lisboa, vem agora, pelas piores razões, dar-me razão (preferia não a ter, neste caso). Mas a verdade é que, até prova em contrário, José Sá Fernandes é incorruptível. É um homem branco. Sempre acreditei nele e até agora não tenho qualquer motivo para me arrepender. Deve ser mesmo este sexto sentido que me alerta. Quando olho para alguém, quase sempre consigo saber se é branco, negro ou de cor.

Em relação a Cravinho, de quem nunca gostei, continuo na minha: se o homem fosse branco não partia para Londres: agora menos que nunca!

Portanto meus amigos, escusam de me vir dizer que se os partidos em que voto chegassem ao governo, fariam o mesmo. É preciso que entendam que há partidos que não têm vocação para governar. A sua missão é fazer oposição, denunciar o que está errado, estar do lado da justiça e da verdade.

É por isso que sempre votei e continuarei votando na oposição que sinto mais próxima da minha maneira de viver a vida!

Obrigada José Sá Fernandes por mostrares que ainda há homens brancos algures em cargos plíticos.

Tenho saudades do meu amigo.



Às vezes pomo-nos a pensar em amigos de quem não temos notícias há muito tempo. Foi o que aconteceu comigo hoje. Dei comigo a pensar num amigo de quem não sei nada há pelo menos 2 anos. E pelos vistos ninguém sabe. Sumiu-se, evaporou-se... e eu tenho muita pena. A última vez que estive com ele, foi para lhe oferecer um bilhete para um concerto do Caetano Velso no Coliseu de Lisboa, a que à última da hora não pude assistir. E como ele era das poucas pessoas que conheço, capaz de o fazer só como eu, fui ter com ele para lhe oferecer o bilhete. Nunca cheguei a saber se foi, se gostou, nada...

Isto não me deixou nada magoada. Foi o único amigo que tive até hoje, capaz de me aceitar tal como sou. Entendia os meus dias seguidos de silêncio, entendia as minhas neuras, as minhas tristezas, as minhas explosões, os meus desaparecimentos... nunca me perguntou porque fazia isto ou aquilo, nunca se intrometeu na minha intimidade. Sabia que eu falaria quando tivesse que falar. E então ele ouvia, atento e não emitia opinião a menos que eu lhe pedisse!

Às vezes diziam-lhe que ele me amava. E ele respondia que sim, que me amava mas que como eu era comprometida, nem sequer lhe passava pela cabeça ser mais para mim do que aquilo que era: um AMIGO.

Tenho saudades tuas e sobretudo, custra-me o teu desparecimento sem justa causa. Receio que algo de mau te tenha acontecido e por isso tenhas desaparecido de livre vontade, ou talvez não... Espero bem que tenhas desaparecido de livre vontade. Prefiro pensar que continuas a calcorrear Lisboa com os teus caracóis ao vento.

Mas sei que nunca mais encontrarei ninguém que me entenda como tu o fazias... O que sentias por mim era mesmo amor, eu sei... porque se fosse apenas encantamento, que às vezes confundimos com amor, a nossa amizade não teria resistido a tantos anos de convívio diário... éramos demasiado parecidos para nos aturarmos se não fosse o teu amor verdadeiro e a minha amizade honesta e sincera.

27 janeiro, 2007

O que será - Chico Buarque e Miton Nascimento

Clique no link abaixo, para assistir um belo vídeo

http://del.icio.us/url/1bcd1578cdd7c9849ebe511ca783e8a4

Uma bela canção, dois belíssimos compositores

Inventário



Um dente d'ouro a rir dos panfletos
Um marido afinal ignorante
Dois corvos mesmo muito pretos
Um polícia que diz que garante


A costureira muito desgraçada
Uma máquina infernal de fazer fumo
Um professor que não sabe quase nada
Um colossalmente bom aluno


Um revolver já desiludido
Uma criança doida de alegria
Um imenso tempo perdido
Um adepto da simetria


Um conde que cora ao ser condecorado
Um homem que ri de tristeza
Um amante perdido encontrado
Um gafanhoto chamado surpresa


O desertor cantando no coreto
Um malandrão que vem pe-ante-pé
Um senhor vestidíssimo de preto
Um organista que perde a fé


Um sujeito enganando os amorosos
Um cachimbo cantando a marselhesa
Dois detidos de fato perigosos
Um instantinho de beleza


Um octogenário divertido
Um menino coleccionando estampas
Um congressista que diz Eu não prossigo
Uma velha que morre a páginas tantas
(Alexandre O'Neill)

O vendedor de bugigangas e o frio.



O frio continua e é nele que eu penso. No sem abrigo aqui ao lado que, no pico do Verão se me apresentou de fato completo e me convidou para tomar um café. Depois disso só o vi de relance uma vez. De vez em quando pergunto-me o que será feito dele e tento sossegar-me pensando que anda a vender as suas bugigangas por outros lados que eu não frequento... mas agora, com o frio que tem feito, tenho pensado muito nele. Como é que um homem daquela idade e sem abrigo há-de sobreviver a estas noites geladas? Será que alguém lhe deu um abrigo, pelo menos por estes dias? Será que está bem de saúde? Ou será que já partiu? E eu que nem sequer lhe perguntei o nome! Só mesmo da minha cabeça esquecer algo tão importante quanto saber o nome de alguém que de algum modo me tocou. Que me tocou fundo... bem fundo!

Tenho que saber deste homem, mas como? A sensação com que fiquei é que é um tipo orgulhoso que não aceita qualquer tipo de humilhação... e para este homem receber uma esmola é, definitivamente uma humilhação. Ele faz questão de ganhar a vida. É um sem abrigo sim, mas tem uma profissão, tão digna quanto qualquer outra: vendedor de bugigangas.

Tomara que volte a encontrá-lo de boa saúde, para lhe perguntar o nome e dar-lhe uma quantidade de "Selecções do Reader's Digest" que tenho guardado para ele. Se o virem por aí, digam-lhe que o espero na "linha verde" ou na "linha de Cascais", por favor.

ANDORINHA


POEMA

ANDORINHA lá fora está dizendo:
- " Passei o dia à toa, à toa! "
Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais triste!
Passei a vida à toa, à toa...
( Manuel Bandeira )

IRENE NO CÉU


POEMA
IRENE PRETA
Irene boa
Irene sempre de bom humor.
Imagino Irene entrando no céu:
- Licença, meu branco!
E São Pedro bonachão:
- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.
( Manuel Bandeira )

26 janeiro, 2007

Auto-retrato


Espáduas brancas palpitantes:
asas no exílio dum corpo.
Os braços calhas cintilantes
para o comboio da alma.
E os olhos emigrantes
no navio da pálpebra
encalhado em renúncia ou cobardia.
Por vezes fêmea. Por vezes monja.
Conforme a noite. Conforme o dia.
Molusco. Esponja
embebida num filtro de magia.
Aranha de ouro
presa na teia dos seus ardis.
E aos pés um coração de louça
quebrado em jogos infantis.
(Natália Correia)

"Escrever é apenas uma maneira de falar mais alto"



Não me parece que viver fora dos grandes centros acrescente qualidade de vida à maioria das pessoas. Até me parece que cada vez a qualidade de vida é menor. Porque para as terras de província se desenvolverem têm que levar com fábricas que as poluem sem grandes preocupações (nem pequenas). As multas para os actos contra o ambiente são tão ridículas que mais vale naquelas cabeças pequeninas, poluir e pagar. Sai mais barato que arranjar meios de tratamento de resíduos, sejam ele quais forem... A juntar a isto as pessoas estão mais longe dos cuidados de saúde mais essenciais, da cultura que devia chegar a todo o lado e ali só chega de vez em quando.

Lá terão que se entreter com o joguito de cartas ou dominó... quiçá uns matrecos de vez em quando... Por falar em matrecos, um dia destes vi um tipo que parecia mesmo ser o filho da Alice. Não é essa, a do país das maravilhas não tinha idade para ter filhos. Estou a falar da Alice do Sérgio Godinho, a do país dos matraquilhos que teve um casal de filhos que olhando bem "têm mesmo pinta, assim sei lá de matraquilhos..."

E também descobri alguns espécimes humanos (da melhor qualidade, diga-se de passagem) com pinta de bonecos de banda desenhada... e também alguém que faz um gesto com muita frequência e que levei anos a descobrir o que me fazia lembrar, mas um dia destes soube quem era: nada mais nada menos que Miss Piggy com aquele gesto tão peculiar de afastar os cabelos da cara... mas esta não é de qualidade, quer dizer, é uma daquelas pessoas de cor de quem ultimamente temos falado por aqui, acerca da teoria de Luís Sepúlveda sobre as raças.

E tenho estado a enrolar, a enrolar para não ter que admitir o meu fracasso: corri todos os cais de embarque do Cais do Sodré com os "faróis" no máximo e não descobri o "espécie" de gente que me roubou o telemóvel. Uma coisa é certa. Mesmo que não o volte a usar, também ninguém poderá fazer uso dele. Mas que a raiva ficou, ficou... nem dormi! Mas vou ultrapassar esta raiva... mais dia menos dia descubro-o senhor ladrão... nem que seja só para dormir dez horas de seguida! Sabendo que pelo menos incomodei mais um tipo de cor!

AFINAL O AMOR TAMBÉM É DOR


POEMA
Afinal o Amor também é dor
Uma dor feita de Amor!
.
De pouco valem as fontes ensinadas
Das quimeras,
Se não soubermos
Que somos filhos da Terra,
Onde
Nascemos,
Respiramos.
Crescemos,
Sonhamos,
Cantamos,
Choramos,
Ganhamos,
Perdemos,
Passamos...
Neste mundo
A que nos damos...
E é assim
Que nos
Amamos...
Eduardo Aleixo

25 janeiro, 2007

É TRISTE ESTAR TRISTE!


POEMA
É triste estar triste.
Amo a alegria,
A festa,
O sorriso pleno.
Assm foram os meus sonhos.
Assim são os meus sonhos.
Estar triste é como estar doente
Ainda que sem culpa
E quantas vezes
Sem a gente perceber!
A alegria do navio que vence o mar com um sentido,
Livre de receios dos dragões na noite escura...
Assim quero a vida, que assim não é!
Mas a vida... não sou eu que quero?!
Eduardo Aleixo

Soneto a duas mãos



A mão que me sustenta e eu sustento
é mão capaz das vinte e cinco linhas
e do selado azul de um requerimento
ou doutras diligências comesinhas...


Habituada por secretarias,
esperta, decidiu de um grave acento,
a vírgulas guindou torpes cedilhas
e mastigou papel, seu alimento...


Contraiu calos, revoltou-se às vezes,
contra certos despachos, tão soezes
que até o dedo auricular se ria...


Com dois dedos de aumento se curvava
e logo, altiva, à esquerda se mostrava... Agora?
Estão as duas na poesia...
(Alexandre O'Neill)

De braços cruzados, não!



Foi pelas cinco da tarde. Saí do Metro e vinha a fazer o balanço do dia: trabalhei imenso; isto é: consegui despachar imensas coisas; a meio do dia dei por mim a cantarolar uma velha canção em kimbundu (há quanto tempo não dava por mim a cantar?). Vinha satisfeita. Subi as escadas rolantes em direcção à plataforma número 4 para entrar no comboio das 17 horas. Não me deixei levar pelas escadas, subi pelas minhas pernas porque estava em cima da hora. Entrei no comboio e senti qualquer coisa atrás de mim. Virei-me e vi um sujeito a dar meia volta e sair pela mesma porta em que entrara atrás de mim. Escolhi um lugar junto à janela do lado do mar, como é costume meu e quando procurei pelo telemovel, já só lá estava o sítio! Procurar o celular foi instintivo porque tinha sentido realmente qualquer coisa nas minhas costas.
Entretanto o comboio partiu. Ia pouca gente na carruagem. O revisor não apareceu. A polícia não apareceu. Quando cheguei a Oeiras, dirigi-me à esquadra da estação. Descrevi o que tinha acontecido. Tenho esperança que as câmaras estivessem ligadas e não sirvam apenas para "enfeitar". Estava um homem a apresentar queixa... a descrição correspondia à minha, só que ele foi assaltado ontem e nas escadas rolantes. Ainda tentou enfrentar o assaltante mas logo surgiu um segundo. Só hoje ali estava. Mas não registou a queixa.
Eu resolvi registar. Estive cerca de 2 horas a descrever enquanto um agente escrevia. Obriguei-o a refazer uma página para que tudo ficasse correcto. Foram simpáticos sim... mas é tudo muito lento. Deram logo o alerta para a estação do Cais do Sodré e puseram agentes à paisana em campo. A ver no que dá. Sei que terei que me deslocar à PJ para identificar o possível ladrão, sei que arranjei uma carga de trabalhos, mas não estou disposta a "deixar andar". Estou farta deste país de faz de conta. Se mais pessoas se dispusessem a "chatear" as autoridades, se calhar a vigilância seria efectiva e não apenas aquela brincadeira do par que passeia pelos cais de embarque e pelos comboios, mais preocupados com o pessoal que tenta viajar de borla do que com situações de assalto.
Quando cheguei a casa liguei para a esquadra para dar o IMEI do telemovel. A ver o que acontece: o que quer que seja que me faça crer que ainda posso andar por Lisboa às 5 da tarde sem me preocupar com assaltos... Mas não creio!
Pelo menos faço o que me manda a minha consciência. Já lá vai o tempo em que eu me ficava sem mover uma palha. Temos que ser todos mais interventivos ou estaremos todos cada vez mais "lixados". O comodismo não ajuda senão os prevaricadores. É preciso ganhar o direito a ser cidadão e interventivo. E já descobri que não o conseguirei de braços cruzados, faz tempo!

É DO AMOR QUE FALO

POEMA


A dádiva total dos corpos às águas que desabam das montanhas,
A vitória dos peixes sobre as pedras,
O riso do sol face ao espanto
Do corvo hierático sobre as rochas.

Canto a placidez das cegonhas sobre as calmas enseadas,
O rumorejar dos barcos,
O farfalhar dos choupos,
A correria infantil dos cães sobre as areias inclinadas dos rios.
É do amor que falo,
Do riso contra a bruma,
Do teu corpo liberto dançando violento sobre o verde
Onde os insectos enlouquecidos incomodam a casa
Que arde nas veias do centro da terra descoberta.
Beijo líquido e resinoso à sombra do mês de Abril
Que aspira o aroma das estevas e das urzes,
Nudez agreste e calma.
Canto contra a morte
Que nem lembro, renasço, pleno, babado de raízes,
Admiro o céu,
As águas sobre o corpo.
Ainda há pouco chorava como um ramo
Em orvalho de manhã
O sonho de ser água.
Criança sem mais nada que o riso numa taça.
A eloquente solidão,
A festa que dança com teu corpo nu e vitorioso sobre as dunas.
Ah, meu amor, as palavras nada valem
Quando se dança como tu à beira-mar...
Os barcos param os motores e as gaivotas dizem
Nunca vi coisa mais bela sobre o mar e sobre a terra,
As conchas esquecem a saudade dos corpos que tiveram,
Os peixes saltam sobre as ondas...
Embevecido,
Vejo o teu corpo que dança sobre os barcos,
Vejo as gaivotas que dançam sobre os mastros
E sinto a voz do mar,
A música difícil que coroa o teu corpo de vitória.
Não,
Difícil foi chegares à dança com que danças,
Sem tempo sobre o tempo.
Difícil, foi cresceres e nasceres para o riso e para a espuma
Espantada com a leveza das palavras
E o regresso ao vento aberto,
Às ânsias do sol-posto,
Aos dedos
Loucos de inocência,
Descobrindo as grutas sobre a pele.
A noite já chegou e eu não tenho mais palavras, meu amor,
Senão conchas em repouso sobre as rosas do regresso.
Ajuda-me a escrever este poema de amoras mansas, livres,
Com gestos de silêncio,
Com cansaços de quem merece as madrugadas...
Eduardo Aleixo

24 janeiro, 2007

Fiz um conto para me embalar


Fiz com as fadas uma aliança.
A deste conto nunca contar.
Mas como ainda sou criança
Quero a mim própria embalar.


Estavam na praia três donzelas
Como três laranjas num pomar.
Nenhuma sabia para qual delas
Cantava o príncipe do mar.

Rosas fatais, as três donzelas
A mão de espuma as desfolhou.
Nenhum soube para qual delas
O príncipe do mar cantou.

(Natália Correia)

Às vezes apetece ser pequenino...



Lembro-me bem: muitas vezes quando era pequena e me contrariavam, eu desejava acordar já grande para poder fazer tudo o que me "desse na telha". Agora, apetecia-me ter a idade do Daniel aqui ao lado, para que não tivesse que mover uma palha, senão abrir um pequeno choro, para que me dessem atenção. Não me estou a queixar de falta de atenção. Antes pelo contrário: tenho amigos e colegas da melhor qualidade (quase todos) que me têm acarinhado e mimado, mais do que eu mereço. Mas a verdade é que mesmo assim, acordo triste, sem vontade de cantar... e até as pessoas que me conhecem de passagem já me vão perguntando o que tenho, porque deixei de cantar... e eu não gosto mesmo de estar triste, mas isto há-de passar. Há-de passar porque estou rodeada de gente de bem, que nem sempre me entende, mas que eu sei que me quer bem.
A questão é que as pessoas não podem gostar de mim pela minha maneira de ser livre e espontânea e depois quererem "aperrear-me". Não dá! Eu sou animal do mato e não bicho de capoeira. Quem me quer bem tem que entender que o meu coração é suficientemente grande para albergar todos os amigos; mas os meus amigos não têm que ser amigos dos meus amigos. Portanto, se eu sei que alguém precisa de estar comigo a sós, não posso levar o rebanho de amigos comigo. Todos têm o seu lugar e o seu espaço.
E também não posso ser mãe dos meus amigos por muito jovens que eles sejam. Sinto-me muito mais como amiga dos meus filhos do que como mãe, desde que eles se tornaram adultos... e não tenciono adoptar mais filhos...
Agora é a vez de adoptar netos como o Daniel, que hoje me foi fazer mais uma visita: está assim, grande e bonito como podem ver. Uma delícia que me deixa babada. Este puto não é um bebé. É um espectáculo.
Amanheci triste, mas a tarde correu melhor: fui tomar café com um amigo e embora tenha sido só um pedacinho de tempo fez-me bem arejar. Depois tive o Daniel para mimar e finalmente a minha Sandra (sobrinha? eu vejo-a mais como uma amiga muito carinhosa e querida) com quem estive ao telefone durante quase uma hora, o que deu para pormos em dia as nossas vidas: eu dou-lhe colo e ela retribui e ficamos assim, mais aliviadas e mais unidas.
Daqui um grande beijo a todos os meus amigos que me têm aturado tanto...

23 janeiro, 2007

O Rio


Uma gota de chuva
A mais, e o ventre grávido
Estremeceu, da terra.
Através de antigos
Sedimentos, rochas
Ignoradas, ouro
Carvão, ferro e mármore
Um fio cristalino
Distante milênios
Partiu fragilmente
Sequioso de espaço
Em busca de luz.
Um rio nasceu.
(Vinicius Moraes)

Amizade e outras conversas...

E ali estivemos as três: tu sempre mais calada. Sabes como eu e a Lena somos fala barato... mas foi bom falarmos das nossas infâncias, das nossas adolescencias. A Lena tem sempre qualquer coisa para nos ensinar não é? Conhecias a estória da "viuvinha"? Eu não. Não deves estar zangada com ela como diz "a boneca de louça". Tu sabes que a Lena te adora... e se não estiveste mais vezes connosco foi pela doença. Mas eu sei muito bem que "a boneca de louça" está a inventar... é a ciumeira do costume! Está acostumada a comprar tudo e todos... não sabia que ainda há muita gente que não se vende, nem se rende aos casacos de peles, oferecidos pelos esposos em segunda mão... Já sei: sou mázinha e "o jesus castiga"!
Hoje escrevo para ti. Só para ti. Por isso se mais ninguém entender o que digo, não faz mal... quer dizer apenas que o nosso código continua a funcionar em pleno. Entre nós as três não é apenas uma questão de cumplicidade... é a defesa que os outros não suportam... alguns outros, felizmente não muitos... Há gente que não entende senão o que está completamente a descoberto. Há gente que não entende a magia das conversas em código... que são apenas possíveis quando as pessoas se conhecem tão bem quanto nós... e se hoje ficam admirados é apenas porque nunca precisámos de fazer alarde do que sentimos umas pelas outras; é só porque nunca sentimos necessidade de nos sentirmos "aprovadas" pelos outros; é só porque o que se passa entre nós não sai dali: é nosso. E é por isso que somos todas tão diferentes e formamos um belo ramalhete: a sábia mas medricas; a generosa mas medricas; a mázinha mas impulsiva...
E depois, percebeste aquela da Lena? O que ela inventa para que os nossos almoços sejam mais assíduos... pronto: de hoje a uma semana estaremos de novo juntas. Não te preocupes: nós falamos por ti. à velocidade a que tu estás acostumada. Beijos.

CANTAREI SEMPRE A TUA VOZ DE POMBA












POEMA
Cantarei sempre a tua voz de pomba
Como um violino
Nas ruas da cidade.
O encontro festejamos,
Necessário
E livre.
Adulto.
O caminho que trilhamos é belo,
Sem exigências,
Nem prisões forçadas.
É como um rio,
E nós somos dois meninos
Que se beijam
E cantam.
É um bosque construído,
Um prado merecido,
Um fruto dividido
Que aos céus agradecemos.
Companheira das estrelas,
Dos caminhos,
Dos risos claros,
Dos silêncios partilhados com o mar,
Cantemos,
Cantemos os oásis dos eleitos,
As manhãs que nunca morrem,
Nos desertos destruidos.
Cantemos
Lado a lado
A comunhão possível
Da infância permanente,
Escondida no dia a dia descontente,
De cada rosto tão distante!...
Que música brota dos teus lábios,
Que viagem tão longa
Fazem as palavras que dizemos,
Que harmonia,
Que encanto!...
Até custa acreditar
Esta maneira sem nome
De soletrar o verbo amar...
Eduardo Aleixo

22 janeiro, 2007

Anda vem...









Anda vem..., porque te negas,
Carne morena, toda perfume?
Porque te calas,
Porque esmoreces,
Boca vermelha, rosa de lume?

Se a luz do dia
Te cobre de pejo,
Esperemos a noite presos num beijo.

Dá-me o infinito gozo
De contigo adormecer
Devagarinho, sentindo
O aroma e o calor
Da tua carne, meu amor!

E ouve, mancebo alado:
Entrega-te, sê contente!
Nem todo o prazer
Tem vileza ou tem pecado!

Anda, vem!... Dá-me o teu corpo
Em troca dos meus desejos...
Tenho saudades da vida!
Tenho sede dos teus beijos!

António Botto

Recado breve para uma amizade maior...



Amiga,

só para te dizer que hoje te prestaram mais uma homenagem (não sei bem se é uma homenagem, mas gosto de pensar que é uma homenagem) em que eu não participei. Porque não é coerente com a minha forma de estar na vida. Tu sabes que eu sou ateia e agnóstica, e é por isso que as missas para mim não fazem qualquer sentido. Ainda por cima sei que a existir um paraíso, tu não precisas de ajuda para lá chegar. Nunca precisaste de cunhas. Não é agora que vais precisar...

Foste à velocidade da luz, porque toda a vida te esqueceste de ti para que os outros fossem felizes. Engoliste muitos sapos. Não o devias ter feito. Devias ter procurado ser feliz e não viver essa mentira que foi a tua vidinha... Mas não adiantava dar-te conselhos... tu sempre foste muito maior do que eu. Mas sinceramente amiga, prefiro a minha pequenez à tua grandeza... que não serviu senão para fazeres bem aos que te rodeavam... de ti nunca te lembraste. Nunca te amaste de verdade. Agora já não adianta...

Amanhã presto-te a minha homenagem. À minha maneira: entre amigas, lembrando tudo o que fizeste de bom pelos outros e de mau por ti. Desculpa lá este desabafo... Eu sei que "o jesus castiga", mas não faz mal... pior castigo é comer e calar.

INCOMODIDADES



1. Gosto de João Cravinho.

Estou a vê-lo ( ontem),

a falar na TV, e vejo uma sintonia entre o que diz, o que pensa e o que sente. Não sendo eu de todo ingénuo, sei que é um homenm com grande experiência política. Portanto, mede as palavras. Mas vejo que deixou a máscara nos bastidores. Que ainda é capaz de o fazer. Que é daqueles que tem alma ao fazer política. Ainda há!

Fala na sua ida para o Banco Europeu. Mais uma pessoa que parte, porquanto temos excesso de valores!É preciso mandar embora os Cravinhos. Estão a mais. Por que será?.

A gente sabe.. O homem apresentou um projecto, com medidas de combate à corrupção. Ora eis uma coisa muito perigosa: combater a corrupção. Não pode ser.

Mas não é o PS um partido que está no poder, fazendo a grande reforma de Portugal?

Dizem. Mas pelos vistos, a corrupção, não.

Cravinho ainda tinha esperanças de que fosse possível que a sua proposta fosse analisada e aprovada pelos seus camaradas. Mas tudo leva a crer que analisada, sim, mas aprovada, não.

Ele terá de ir pregar para outra freguesia.

Mas teve o gesto. A frontalidade. Não foi politicamente correcto. Foi incómodo. Que é coisa que está faltando.

Boa sorte, Cravinho.

2. Ana Gomes.

Ana Gomes é outra incomodidade. Mas por outras razões, a primeira é que ela já tinha sido enviada para o exílio dourado da Europa, mal Sócrates chegou ao poder. Claro que ele viu logo o explosivo que ela significava, se cá ficasse.Mas Ana Gomes é um explosivo em todo lado...

Mas para mim é mais difícil falar sobre esta personagem. Tenho e sempre tive em relação a ela, como em relação a toda a gente da extrema-esquerda, um conflito que me vai acompanhar até ao fim da vida ( não é por acaso que tenho amigos e amigas com mentalidade de Ana Gomes, há muitos anos, e que não é por causa disso que deixamos de ser amigos, bem pelo contrário, parece que é uma atracção recíproca...). Não é agora o momento de fazer a análise psicológica deste fenómeno. Fiquem-se apenas com esta: tenho sempre uma necessidade profunda de atacar as Ana Gomes, mas não posso viver sem elas...

Dizendo isto, deixem-me falar com ela, como se ela me estivesse a ouvir:

Ouça lá, Ana Gomes, não sabe a sra. que, em todos os Estados, há assuntos confidenciais que não se tratam na Praça Pública? ( Disse ao público, por acaso, tudo o que sabe sobre Timor?? ).Vocè não sabe que a luta contra o terrorismo é algo legitimamente susceptível de ter tratamentos secretos? Você não sabe que não é só a CIA que terá esses comportamentos? Você não sabe que a Europa a que pertencemos muito deve a medidas de segurança secretas?. Caro que você sabe. Terá agido com bom senso em todo este processo?

Claro que Ana Gomes é incómoda também, como João Cravinho o é.

Pretendo ser justo. Acho que Ana Gomes tem uma virtude neste caso, já que o governo de Sócrates, inflexivo como é, não deve ter dado os passos indispensáveis para que o diálogo se tenha estabelecido,num caso delicado como este, talvez porque veja aqui uma oportunidade para a lixar definitivamente.

E qual é a virtude? De ser frontal e corajosa, nestes tempos que correm, de tanta paralisia intelectual e de tanto medo, que até faz comichões!..Outra questão, Sra Ana Gomes, seria discutir consigo um assunto essencial que é o de saber se o seu comportamento, que tanto admiro, de coragem e de frontalidade, se deve a um traço de personalidade independente e isento, ou se tal se deve antes ( e voltamos ao meu conflito circular, eterno) a um ódio visceral, que V.Exª deve ter contra o imperialismo americano?...

3. Outra incomodidade provável será se o político e filósofo Manuel Maria Carrilho, cuja fotografia não pus no blogue, porque a inflacção mediática já é muito elevada, no que lhe concerne, for para a UNESCO, como já ouvi dizer, o que seria uma pena, não para a autarquia de Lisboa, de que já se despediu, também não para o Parlamento, que carece de deputados mais trabalhadores e assíduos, mas para a investigação teórica e para o ensino da Filosofia, disciplina que o Governo tanto despreza ,onde podia fazer um brilharete, desde que não aparecesse muito na TV...

Eduardo Aleixo

POEMA















AS MINHAS PEGADAS QUERO EU GRAVÁ-LAS...
As minhas pegadas quero eu gravá-las
Sobre as areias do Mar que eu amo
Onde os barcos passam
Cheios de homens e mulheres
Com sonhos carregados nas cabeças
E tantas dores sobre os ombros!
As minhas pegadas quero eu deixá-las
Sobre as areias do Mar que eu amo
Onde me sinto como um grão de areia
A olhar para as constelações
Quando a noite me cobre de silêncio
E o corpo escuta
Até adormecer
O sentido que procuro para os passos
Que o mar já desfez
Deixando apenas sons nos búzios e nas conchas...
Eduardo Aleixo

O QUE SE PASSA COM A VISITA DE SÓCRATES À CHINA?










Têm saído notícias que indiciam indecisões sobre a data mais conveniente da ida deste governo e de mais empresários à China, o que é muito estranho, uma vez que a data da visita já tinha sido anunciada e uma viagem destas não pode deixar de ser rigorosa e atempadamente planeada, tanto mais que se Sócrates é rigoroso em tudo o que diz respeito aos negócios do Estado, também a China o é indubitavelmente.

Também já foi noticiado que se a viagem se realizar na data prevista, no fim deste mês - princípios de Fevereiro, Sócrates não terá a recebê-lo, nem o Primeiro Ministro chinês, nem o Ministro dos Negócios Estrangeiros - ambos vão deslocar-se nessa data a Angola - o que também é muito estranho e naquele pais tem um significado, que não é, por certo, um certificado de grande importância dada à visita dos representantes do Estado português ao antigo Império do Meio.

Se levarmos em conta que o objectivo mais importante para a visita de Socrates, seria dizer à China que podem contar com a nossa experiência e saber em África, para os ajudarmos a eles, chineses, a investirem em Angola, não valerá a pena fazermos tal visita, pois, pelos vistos, eles sabem ir a Angola sòzinhos, como representantes políticos da China,tendo negociado com Angola esta visita, (para esta data?!, para outra?!, sem que Portugal o soubesse para planear devidamente a sua viagem?!..).Além disso, sabe-se que os chineses já estão em força negociando em Angola e também se sabe que Portugal não o tem conseguido fazer por razões várias que nao vêm agora a talho de foice.Por isso não se percebe bem que o objectivo da viagem à China seja o de abrirmos as portas de Angola aos chineses!..

Cheira-me sinceramente que algo se está a passar, ou se teria passado, e que não foi divulgado. Até me cheira que estas indecisões possam ter a ver com uma entrevista, na minha opinião, infeliz, que Cavaco Silva deu à imprensa indiana, antes dè partir para a Índia, na qual afirmou que era mais fácil negociar com a Índia do que com a China, uma vez que a Índia é uma democracia e a China, não!..

Quem conhece o suficiente da mentalidade chinesa ( e Cavaco devia ter ouvido assessores com esses conhecimentos ) sabe que se esta entrevista foi do conhecimento de Pequim, e foi-o, certamente, poderá levantar problemas. Na China, "perder a face" é uma coisa muito grave. Receber com toda a pompa com que os chineses gostam de receber os outros Estados, com uma entrevista destas por detrás, podem crer que é, para eles, perder a face. E " perder a face " eles não gostam. A não ser que se trate de uma coincidência e que haja outros motivos. Mas aqui fica a minha opiniao.

Eduardo Aleixo

21 janeiro, 2007

Epístola para Dédalo





(Esta é a singela homenagem do nosso blogue à grande poetisa que partiu hoje)




Porque deste a teu filho asas de plumagem e ceras
e o sol todo-poderoso no alto as desfaria?
Não me ouviu, de tão longe, porém pensei que disse:
todos os filhos são Ícaros que vão morrer no mar.
Depois regressam, pródigos, ao amor entre o sangue
dos que eram e dos que são agora, filhos dos filhos.

(Fiama Hasse Pais Brandão)

Presença Africana










E apesar de tudo,
ainda sou a mesma!
Livre e esguia,
filha eterna de quanta rebeldia
me sagrou.
Mãe-África! Mãe forte
da floresta e do deserto,
ainda sou,
a irmã-mulher
de tudo o que em ti vibra
puro e incerto!...

- A dos coqueiros,
de cabeleiras verdes
e corpos arrojados
sobre o azul...
A do dendém nascendo dos abraços
das palmeiras...
A do sol bom,
mordendo o chão das Ingombotas...
A das acácias rubras,
salpicando de sangue
as avenidas,
longas e floridas...

Sim!, ainda sou a mesma.
- A do amor transbordando
pelos carregadores do cais
suados e confusos,
pelos bairros imundos e dormentes
(Rua 11...Rua 11...)
pelos negros meninos
de barriga inchada
e olhos fundos...

Sem dores nem alegrias,
de tronco nu e musculoso,
a raça escreve a prumo,
a força destes dias...

E eu revendo ainda
e sempre, nela,
aquela longa historia inconseqüente...

Terra!
Minha, eternamente...
Terra das acácias,
dos dongos,
dos cólios baloiçando,
mansamente... mansamente!...

Terra!
Ainda sou a mesma!
Ainda sou
a que num canto novo,
pura e livre,
me levanto,
ao aceno do teu Povo!...

(Alda Lara)

No terceiro mundo as crianças são mais respeitadas!



Muito se tem falado de Esmeralda, a menina que foi entregue pela mãe aos 3 meses de idade a uma casal de Torres Novas. Só agora que conheço melhor os contornos desta história decidi falar nela: porque como toda a gente me sinto incomodada com a decisão de um tribunal português. Porque esta decisão vem mostrar que, afinal tudo continua muito lento e, pior ainda, muito errado, no que deveria ser a justiça em Portugal.

A história é breve mas tem contornos sinistros que parecem estar a ser esquecidos por muita gente. Uma mulher, imigrante brasileira em situação ilegal, engravida de um português com quem mantém uma relação amorosa que, pelo menos para ela, é uma estória de amor. Quando lhe diz que está grávida ele nega a paternidade da criança que ela carrega no ventre. Apesar de várias vezes o procurar a ele e à família com quem ele vive, é sistematicamente escorraçada. No dia em que ele devia aparecer para proceder ao registo da criança no notário, não aparece.

É então que o MP decide abrir um processo de averiguação para que se esclareça quem é o pai da criança. Entretanto a mãe, sem recursos e em situação ilegal, decide entregar a criança a um casal que não pode ter filhos. Passa um documento que, embora não tenha validade legal, prova que a Esmeralda não foi raptada mas entregue para adopção ao referido casal.

Quando se esclarece quem é o pai da criança, este procura os pais "adoptivos" da sua filha. Não porque queira a menina.... o que ele quer é dinheiro. E é nesta parte da estória que não se tem ouvido falar. Quem decidiu aplicar uma pena de 6 anos de prisão ao homem que durante 5 anos deu tudo à Esmeralda, incluindo o amor de que qualquer criança necessita tanto como do pão para a boca, nem sequer tem em conta a conduta do pai biológico, que é uma atitude mercenária, a meu ver.

Parece que finalmente, haverá diálogo entre a família adoptiva e o pai biológico. Até me custa chamar "pai" a um tipo destes! A verdade é que até aqui ninguém se deu ao trabalho de ouvir quem tem amado e tratado desta menina. E não me venham falar em laços de sangue... a mãe biológica separou-se da filha por amor a esta e merece toda a minha admiração. Mas o mercenário devia ser acusado de tentativa de extorsão e condenado, esse sim, pelo que tentou fazer contra a filha de quem nunca quis saber.

Pobre país este que precisa que os seus cidadãos façam baixo-assinados para que se faça justiça... Que vergonha me dá viver num país que, depois disto tudo, ainda tem coragem para se dizer europeu.

20 janeiro, 2007

Mesa dos sonhos










Ao lado do homem vou crescendo

Defendo-me da morte quando dou
Meu corpo ao seu desejo violento
E lhe devoro o corpo lentamente

Mesa dos sonhos no meu corpo vivem
Todas as formas e começam
Todas as vidas

Ao lado do homem vou crescendo
E defendo-me da morte
povoando de novos sonhos a vida.

(Alexandre O' Neill)

Seria ridículo, se não fosse tão triste!



Nesta falésia que fotografei o mês passado, um homem, hoje, sentiu-se mal. Ontem tinha estado no Centro de Saúde de Odemira, onde foi examinado e enviado para casa. Esta manhã, estava nesta falésia e sentiu-se mal de novo.

É o terceiro caso em poucos dias ocorrido no concelho de Odemira e a segunda morte. Um dos casos encontra-se em coma induzido, depois de ter sofrido um acidente em casa e ter ficado com uma grande parte do corpo queimado. Depois de ter sido transportado para o hospital de Beja, a mais de 100 km da sua residência, foi levado para o hospital de S. José em Lisboa, pois Beja não tem unidade de queimados. O INEM não sabia que Beja não tinha recursos para cuidar do acidentado? É estranho. Muito estranho... que num país tão pequeno quanto o nosso, alguém tenha que esperar 9 (nove!) horas para ser convenientemente assistido.

O senhor Correia de Campos, não abre inquéritos. Na verdade faz bem. Ele sabe que não se pode culpar ninguém das culpas do governo. Ele sabe que os profissionais fazem o que está nos manuais. Cumprem com as regras que lhes são impostas. Portanto, inquirir o quê? Para quê? Todos sabemos que não faz sentido, que as pessoas que vivem num concelho que se encontra muito mais próximo dos hospitais do Algarve tenham que ser levadas para Beja por estradas que nem sempre são das melhores.

Eu mesma fiz há pouco mais de um mês o percurso Odemira / Beja e sei do que estou a falar. Quando disse à senhora que me atendia na pousada do Cerro da Nave Redonda que tinha estado em Beja, ela olhou para mim com um ar de espanto. Como quem diz: quem quer ir a Beja? Intrigada com a expressão facial dela, perguntei porque se espantava e ela respondeu-me: "é que nós aqui, só vamos a Beja, quando é preciso ir ao hospital, porque não nos atendem no Algarve que fica a meia hora de viagem; só vamos a Beja por maus motivos, é por isso que não gostamos de lá ir".

É portanto uma questão burocrática. As parturientes de Elvas (portuguesas) podem ter os seus bebés em Badajoz (Espanha), mas os alentejanos (Portugueses) não podem ser atendidos no Algarve (Portugal)...

Ridículo, não é?

English man in New York - Sting




O que me apetecia mesmo era ser agora, uma viajante no Tibete.