11 dezembro, 2010

As palavras que te envio são interditas


As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma  regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.
 
Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.
 
E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.
 
(Eugénio de Andrade)

restou a rosa

cuido das minhas rosas melhor das minhas roseiras na verdade rosa neste momento há apenas uma mas é uma bela rosa vermelha sangue e enquanto isso os espinhos arranham-me e não sei porquê penso em ti e na rosa que nunca me deste fosse como esta cor de sangue ou negra branca amarela apenas a rosa que não existiu como tu afinal não exististe foste apenas mais um personagem que criei para fazer parte dos meus cenários apenas uma invenção mais uma só isso e então pergunto-me porque mentes tanto afinal se és só uma personagem se não passaste nunca disso porque te dei tanto porque te dei tudo o que era porque fiquei assim com cara de parva quando tu mesmo me chamaste a atenção e me disseste porque te dás inteira se não tenho nada para te dar e tu a repetires e eu teimosa dizendo não percebes nada eu não te dei nada que não tivesse recebido e era assim mas não tinha recebido de ti e o que te dei não te pertencia não era para ser desperdiçado com alguém que nunca me deu uma rosa qualquer rosa que não foste capaz de roubar num jardim como as crianças fazem no dia da mãe e deve ser a única coisa que acho que foi feita para ser roubada mas mesmo assim eu teimava em dar como se o mundo fosse todo meu e agora sinto uma coisa pegajosa que se solta das roseiras algo que me incomoda como isto de estar a pensar em ti quando devia apenas estar a pensar no que estou a fazer. tão insólito este sentimento de saber que afinal o que me fez lembrar de ti quando cuido das rosas não são os espinhos como não foi a rosa que nunca me deste mas esta coisa viscosa que se cola à minha pele. restou a minha rosa.

10 dezembro, 2010

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Chico Buarquechico_buarque@chicolatras "As pessoas têm medo das mudanças. Eu tenho medo que as coisas nunca mudem"

Clã - Vamos esta noite (clica aqui)



Vamos
Dançar até cair, ir
Juntos vamos
Morrer de rir

De verdade não quero mais que a vida

Sob a leve tutela
De deuses descuidosos,
Quero gastar as concedidas horas
Desta fadada vida.
Nada podendo contra
O ser que me fizeram,
Desejo ao menos que me haja o Fado
Dado a paz por destino.
Da verdade não quero
Mais que a vida; que os deuses
Dão vida e não verdade, nem talvez
Saibam qual a verdade.

(Ricardo Reis)

cenários


construo cenários faço esboços e rascunhos junto tudo e deito tudo fora ou. às vezes guardo linhas soltas à espera que um dia se tornem textos e sei que não jamais se tornarão textos eu não sei. fazer textos só rascunhos apenas coisas que sei que amanhã estarão escondidas no fundo do baú da minha memória e eu já sem memória dessas memórias dos cenários dos rascunhos da vida que afinal me disseram que vivi devagar e eu a pensar estás enganado abreviei tudo como as pessoas que lêem em diagonal para andar mais depressa e mais e mais e eis-me chegada ao ponto. sem retorno. sem memória. esqueci gente que me sorriu e me falou mesmo sem saber que eu era apenas virtual não mais que um cenário um rascunho de gente que ainda assim me falava escrevia ligava com ou sem fio e quando com fios eu apenas uma boneca articulada. mal articulada. uma coisa assim desengonçada sem saber porque alguém fala com ela. claro as pessoas são simpáticas. sobretudo com as bonecas de cenário aqueles rascunhos que hoje morenas daí a nada ruivas a gente muda-lhes a cor do cabelo e dos vestidos (a minha cabeça... quais vestidos) trapos sim trapos cosidos com outros trapos como remendos de cenários rascunhos de gente que pode ser tenha passado na minha vida e a minha memória ai doutora a minha memória a senhora desculpe mas não me lembro de si para falar verdade não me lembro de nenhum doutor simpático todos sérios todos sisudos a senhora desculpe mas tem a certeza que é doutora tem a certeza que é assim amável e conversadora? veja lá não seja apenas mais um rascunho num cenário que amanhã estará no lixo da minha memória.

19 novembro, 2010

no país do faz de conta


nunca digas desta água não beberei é provérbio e verdadeiro. tantas vezes pensei que certos amimais eram amados de modo extremo pelos seus donos e eis-me caminho de lisboa com o mika na box a miar e eu a falar com ele para o acalmar como quem fala com um bebé a explicar que tem que ir à senhora doutora e que faço isto para o bem dele embora compreenda as suas razões e afinal ele deixa de miar e escuta-me de vez em quando mais um miado mas cada vez mais espaçado. em sete rios a polícia afoba-se a rebocar carros mal estacionados faço ideia a cara dos donos quando chegarem e virem que o carro já ali não está hoje é dia grande para motoristas de táxi que quem anda de carro geralmente não sabe usar o metro ali mesmo ao lado e paro para fazer uma pergunta a um polícia e ele diz-me não sei não sou daqui pergunte ao meu colega ali abaixo e eu pergunto e o homem entretido a preparar a grua para levar mais um responde desculpe sou do porto não conheço lisboa e então passa-me pela cabeça vagamente a ideia da cimeira da nato e percebo que o panfleto que um velhote me depositou nas mãos é sobre a cimeira e é do pcp o velhote foi muito simpático e explicou tudo o que eu queria só que eu ainda tive que encontrar um polícia com vontade de me ajudar que foi buscar ao carro o guia da cidade de lisboa e confirmou o que o velho camarada indicara. será que estes dois minutos o impediram de levar mais um carro? não claro que não podem levar a noite toda afinal a polícia de todo o país está a postos é preciso mostrar uma cidade inventada sem carros à superfície muito menos estacionados em cima dos passeios é preciso fazer de conta no país do faz de conta. que é país.

14 novembro, 2010

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os chicólatraschicolatras "Qualquer prazer é pouco"

O ron ron do gatinho - Adriana Calcanhoto ( clica aqui)

No passado se dizia
que esse ron-ron tão doce
era causa de alergia
pra quem sofria de tosse.

Tudo bobagem, despeito,
calúnias contra o bichinho:
esse ron-ron em seu peito
não é doença - é carinho


Desnecessária explicação

Que importa a melodia,
se acaso aos outros dou,
com pávida alegria,
o pouco que me sou?

Que importa ao que me sabe
estar só no meu caminho,
se dentro de mim cabe
a glória de ir sozinho?

Que importa a vã ternura
das horas magoadas,
se ao meu redor perdura
o eco das passadas?

Que importa a solidão
e o não saber onde ir,
se tudo, ao coração,
nos fala de partir?

(Daniel Filipe)

já podes vir

não venhas ainda que estou acordada. ouço a chuva lá fora e o gato não sai da janela mesmo quando lhe digo que hás-de vir mais tarde quando ele estiver deitado na minha almofada. sai da janela enfim e estende-se aos meus pés enquanto eu te peço que esperes um pouco porque há muita chuva e muito vento. chego a temer que as vidraças se quebrem sabendo que há anos espero que isso aconteça e afinal não. afinal só o meu receio que te esqueças que ainda estou aqui. não venhas já que a mãe não gosta que andes à chuva. mesmo sabendo que gostas tanto de o fazer como eu sabes é inverno e mais difícil que disparate então não é que me esqueci que não te molhas quase como eu sem guarda chuva e ela nem aí para mim mas que importa se sei que virás depois de adormecer passar-me a mão na cabeça e deixar-me um beijo na testa e eu farei de conta que não fizeste nada como quando era pequena e tu partias em viagem de madrugada e eu fazia de conta que não sentia a tua carícia fazia de conta que não sentia o teu beijo e esperava que saísses do quarto escondia a cabeça debaixo da almofada e chorava como se o mundo fosse acabar porque ficava apenas um vazio e um nó na garganta qualquer coisa que me afligia e eu queria dizer amo-te por favor fica desta vez não vás eu preciso tanto tanto de ti e afinal apenas as lágrimas e os soluços sufocados pela almofada e começava a escrever-te cartas diariamente e nunca as enviava porque não sabia como e não queria partilhar o meu segredo com mais ninguém aquilo era algo entre nós. apenas. agora já podes vir pai.

12 novembro, 2010

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os chicólatraschicolatras "Preciso encontrar um homem bom; Que estenda um tapete vermelho e me beije a mão; Que me arranque a roupa no meio da multidão"

Valsa de um homem carente - Jorge Palma (clica aqui)

Se alguma vez me vires fazer
Figuras teatrais
Dignas de um palhaço pobre
Sou eu a dançar a mais nobre
Das danças nupciais
E em minhas plumas cardeais
Em todo o meu esplendor
Sou eu, sou eu nem mais
A suplicar o teu amor

É a dança mais pungente
Mão atrás e outra à frente
Valsa de um homem carente

Serenata

" ... Permita que eu feche os meus olhos,
pois é muito longe e tão tarde!
Pensei que era apenas demora,
e cantando pus-me a esperar-te.
Permite que agora emudeça:
que me conforme em ser sozinha.
Há uma doce luz no silencio,
e a dor é de origem divina.
Permite que eu volte o meu rosto
para um céu maior que este mundo,
e aprenda a ser dócil no sonho
como as estrelas no seu rumo ... "

(Cecília Meireles)

não sei onde nem porquê


dizem que dizia adeus. em lisboa. não sei mais nada. não vi notícias apenas uma imagem da avenida da liberdade cheia de gente dizendo adeus. não sei quem era. só que diz adeus. sim talvez devesse mudar o tempo do verbo. talvez. mas não mudo. alguém que ocupa a sua vida dizendo adeus há-de fazê-lo onde quer que esteja. em lisboa a dizer adeus e eu não sei quem era. apenas que tinha oitenta anos. teria... não sei. se era alto baixo magro gordo careca ou não olhos escuros ou azuis. teria barba ou bigode ou apenas a cara escanhoada. não sei. não conheci o homem que dizia adeus. e percebo de repente que não conheço nada do dia a dia de lisboa. os meus caminhos não passaram nunca que me lembre pelo homem que diz adeus. quero dizer de dia. é lugar onde passo de noite é verdade quando vou a um concerto por ali na zona da liberdade. ou por baixo no canudo que a rasgou. durante o dia. estou vazia. não conheci o homem do adeus. não conheço lisboa. aquela que lembro não tem nada a ver com a cidade em que se tornou. a aldeia grande que era cheia de saloios e pacóvios tornou-se cosmopolita. é o que vejo em imagens agora de madrugada e percebo que esta não é a aldeia grande que conheci. esta é ainda uma grande aldeia. que se atravessa em pouco tempo se não houver trânsito. nada como londres ou madrid aqui ao lado. uma cidade que tem tudo para ser uma bela cidade mas não é mais do que uma grande aldeia vibrante de noite e triste de dia quando as pessoas passam todos os dia pelos mesmos lugares e se conhecem de vista mas ao contrário das aldeias ninguém diz bom dia ou se diz há o espanto do outro lado. e é por isso que hoje me espanto. havia um homem em lisboa que dizia adeus e a quem as pessoas respondiam. continua a dizer adeus. não sei onde nem porquê.

11 novembro, 2010

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os chicólatraschicolatras “O que está havendo com as flores do meu quintal? O amor-perfeito, traindo; A sempre-viva, morrendo e a rosa, cheirando mal"

Cotidiano - Chico Buarque

Todo dia eu só penso em poder parar;
Meio-dia eu só penso em dizer não,
Depois penso na vida pra levar
E me calo com a boca de feijão.

Seis da tarde, como era de se esperar,
Ela pega e me espera no portão
Diz que está muito louca pra beijar
E me beija com a boca de paixão.

O terceiro fiho


Em busca dos irmãos que tinham ido
Eu parti com pouco ouro e muita bênção
Sob o olhar dos pais aflitos.
Eu encontrei os meus irmãos
Que a ira do Senhor transformou em pedra
Mas ainda não encontrei o velho mendigo
Que ficava na encruzilhada do bom e do mau caminho
E que se parecia com Jesus de Nazaré...

(Vinicius de Moraes)

balha-me deuje zé


tenho estado calada zé logo eu que sempre gostei de dar à língua vejo-me paralisada os dedos inchados o ego murcho a dificuldade de te dizer zé lixaste-me a vida. mas já que comecei hei-de fazer um esforço para que os dedos atinem com as teclas e me deixem dizer gritar sei lá lixaste-me zé. e eu nem fiz nada para isso. lixaste-me zé. andas a lixar-me há muito. e eu a ver. não contente por me teres lixado zé deprimes-me. consegues que me sinta muito muito lixada e lá vou eu contra todos os meus princípios procurar alguém que me ajude. ir ao médico é como ir à bruxa. a gente chega lá e fala. depois da resposta ficamos a saber se acreditamos ou não. sem isto não vamos a lado nenhum. tenho sorte. arranjo uma bruxa em que acredito. passa a ser uma fada. pergunta porque estou a chorar e eu digo foi o zé. não preciso dizer mais nada. ela também está lixada com o zé. sempre que a visito queixa-se do zé. eu faço coro ou vice versa. é a vida. temos que ser uns para os outros. vou ao boticário mais próximo e compro a mezinha que me há-de manter a boiar. faz efeito. o mundo desmorona à minha volta e eu não ligo pevas. a mezinha é boa. melhor que branquinha porque me mantém num mundo azul sem alucinações. é certo que faz com que passe a sentir uma enorme indiferença pelo zé. não me interessa o que diz. está tudo bem e eu sei que não é verdade mas fico aqui sentada a ver imagens na televisão os fatos elegantes o cabelo grisalho bem cortado o sorriso agreste. fico aqui como se nada do que diz me dissesse respeito. a minha fada manda-me a outra bruxa. uma especialista para outro problema. vou a todas. estou por tudo. e depois manda-me a uma terceira que se encarrega de outras mazelas. estas bruxas não são como as que põem anúncio no jornal e garantem resolver todos os problemas de amor e dinheiro e droga e álcool ossos e alma tudo no mesmo saco. estas não. uma cuida da alma outra do corpo outra dos ossos. nenhuma delas tem poções para resolver problemas de amor e dinheiro. pior para mim. para que serviu esta conversa toda? fui ao boticário e piorei de repente. num segundo. bastou ele pedir-me mais de cinquenta euros pela mezinha para a alma. balhame deuje zé. tem dó das almas cansadas de penar.

29 setembro, 2010

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os chicólatraschicolatras "As pessoas têm medo das mudanças. Eu tenho medo que as coisas nunca mudem"

Lisboa que amanhece - Sérgio Godinho e Caetano Veloso

Não sei se dura sempre esse teu beijo
Ou apenas o que resta desta noite
O vento, enfim, parou
Já mal o vejo
Por sobre o Tejo
E já tudo pode ser
Tudo aquilo que parece
Na Lisboa que amanhece

Os Namorados Lisboetas


Entre o olival e a vinha
o Tejo líquido jumento
sua solar viola afina
a todo o azul do seu comprimento

tendo por lânguida bainha
barcaças de bacia larga
que possessas de ócio animam
o sol a possuí-las de ilharga.

Sua lata de branca tinta
vai derramando um vapor
precisando a tela marinha
debuxada com os lápis de cor

da liberdade de sermos dois
a máquina de fazer púrpura
que em todas as coisas fermenta
seu tácito sumo de uva.

(Natália Correia)

em lisboa


é claro que vos devo uma explicação. afinal há muito que não passo por aqui. a explicação é fácil. digamos que estou a seguir indicações médicas. coisas da vida. e da idade dizem alguns. adiante. já sei que para fazer 100 metros na avenida duque de loulé em direcão ao marquês de pombal, seja a que horas for levo cerca de 15 minutos. a gertrudes está cansada é o que é. e quando ao cansaço da gertrudes se junta uma imensa manifestação dos trabalhadores o resultado é uma hora até conseguir entrar no túnel do marquês. enquanto espero que o semáforo fique verde vou observando as pessoas que passam. a maior parte não me desperta grande atenção. mas dou por mim a olhar um rapaz a falar sozinho em linguagem gestual. penso pronto afinal não sou a única a falar sozinha. o rapaz faz gestos enérgicos e eu penso que problema o pode atormentar para que prossiga avenida acima com os mesmos gestos. as pessoas passam por ele indiferentes. de repente lembro-me que estou no centro de lisboa esta cidade que cada vez mais nos engole e nos torna fantasmas de nós mesmos. que é feito da velha lisboa dos bairros populares... está cada vez mais cheia de estrangeiros que aproveitam o melhor desta belíssima cidade enquanto nós lhe virámos as costas e tudo o que deixámos para trás foi gente a falar sozinha.

31 agosto, 2010

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Chico Buarquechico_buarque "Agora mora o meu coração; Sozinho como quer; Sem outra dor senão; A dor de ser mulher"

Oxalá - Madredeus (clica aqui)

Oxalá, me passe a dôr de cabeça, oxalá
Oxalá, o passo não me esmoreça;

Oxalá, o Carnaval aconteça, oxalá,
Oxalá, o povo nonca se esqueça;

Oxalá, eu não ande sem cuidado,
Oxalá eu não passe um mau bocado;
Oxalá, eu não faça tudo à pressa,
Oxalá, meu Futuro aconteça

Oxalá, que a vida me corra bem, oxalá
Oxalá, que a tua vida também;

Oxalá, o Carnaval aconteça, oxalá
Oxalá, o povo nunca se esqueça;

Oxalá, o tempo passe, hora a hora,
Oxalá, que ninguém se vá embora,
Oxalá, se aproxime o Carnaval,
Oxalá, tudo corra, menos mal

Até amanhã

Sei agora como nasceu a alegria,
como nasce o vento entre barcos de papel,
como nasce a água ou o amor
quando a juventude não é uma lágrima.

É primeiro só um rumor de espuma
à roda do corpo que desperta,
sílaba espessa, beijo acumulado,
amanhecer de pássaros no sangue.

É subitamente um grito,
um grito apertado nos dentes,
galope de cavalos num horizonte
onde o mar é diurno e sem palavras.

Falei de tudo quanto amei.
De coisas que te dou
para que tu as ames comigo:
a juventude, o vento e as areias.

(Eugénio de Andrade)

no dia do blogue

O Meu Tempo é Quando

a caminho de lisboa ouço na rfm a notícia. hoje é dia do blogue. e penso como tenho abandonado este espaço que tem sido a minha companhia nos últimos anos. não quero alegar falta de tempo.não posso. sempre achei a desculpa mais esfarrapada do mundo. por isso não alego coisa nenhuma. deixo-me apenas ficar por aqui a contar algumas das coisas que ouvi na última semana. na caixa do hipermercado o cliente à minha frente está acompanhado por uma criança. o carrinho está cheio de coisas para o menino. as compras vou passando para os sacos e deseguida para o carrinho. quando os produtos estão todos no carrinho vejo a empregada começar a tirar tudo o que não dizia respeito à criança. disse para os meus botões coitado deste pai que prefere passar fome a negar o que o filho pediu. o homem desaparece com a criança à procura de uma mochila com código. quando reaparecem o homem paga a conta dos produtos do miúdo. é então que a menina da caixa começa a passar o resto dos produtos. não percebi muito bem o que se tinha passado mas acabei por dar por mal empregue os quase vinte minutos que esperei para ser atendida. hoje demorei 20 minutos para percorrer cerca de 100 metros da avenida defensores de chaves ao marquês de pombal. o tempo tem estado quente e a gertrudes ficou perturbada. é só o que tenho para dizer no dia do blogue... ainda não percebi a importância do dia mas deve ser uma questão de falta de inteligência.

22 agosto, 2010

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Chico Buarquechico_buarque
"Nas noites em câmera lenta; Espero por meu bem"

Um dia de domingo - Ana Carolina e Celso Fonseca (clica aqui)

Eu preciso te tocar
E outra vez te ver sorrindo
E voltar num sonho lindo...

Já não dá mais prá viver
Um sentimento sem sentido
Eu preciso descobrir
A emoção de estar contigo...

Ver o sol amanhecer
E ver a vida acontecer
Como um dia de domingo...

Dia

De que céu caído,
oh insólito,
imóvel solitário na onda do tempo?
És a duração,
o tempo que amadurece
num instante enorme, diáfano:
flecha no ar,
branco embelezado
e espaço já sem memória de flecha.
Dia feito de tempo e de vazio:
desabitas-me, apagas
meu nome e o que sou,
enchendo-me de ti: luz, nada.

E flutuo, já sem mim, pura existência.

(Octavio Paz)

um dia de domingo

o dia bonito e eu pronta para o viver o melhor possível. manhã de praia surpreendentemente pouco frequentada (para um domingo claro). a água uma delícia mas pouca gente a nadar. e então penso este país é de marinheiros e não de nadadores. os marinheiros deviam ser obrigados a saber nadar. os pescadores também. e lá vou eu voando pelas teclas para um sítio que não sei qual é. será que alguma vez escreverei o que tenho na cabeça. não mando nos meus dedos. não mando no meu gato. não mando em mim. não mando em ninguém. e é assim que sou feliz. voltando ao dia. o mika está zangado comigo. não gosta de ter as unhas cortadas. eu é que já estava cansada de arranhões na brincadeira. depois vou ao centro de recuperação ver a minha mãe. e não só. há lá muito mais gente que me interessa. sobretudo a mané. uma autista de cerca de quarenta anos com quem comunico facilmente. é vaidosa. gosta que lhe pinte as unhas. peço-lhe para tocar piano. não lhe apetece. faço um pouco de chantagem: tocas piano e depois pinto-te as unhas. dirige-se ao piano. o anjo da guarda da casa ajuda-a a sentar-se no banco. toca "parabéns a você". depois passa os dedos pelas teclas tentando lembrar-se de alguma peça que não sabemos qual é. pouco importa. um dia destes ouviremos a peça. estou certa. passo uma parte da tarde com o meu anjo da guarda terrestre. gosto de conversar com ela. faz-me bem. dá-me calma. e também vontade de chorar abraçada a ela. não o fiz. vontade não me falta. passeei a minha mãe pelo jardim. quase sempre calada e quando diz alguma coisa é como se estivesse noutro mundo. na volta para casa o meu filho mais novo dorme. penso várias vezes em acordá-lo pois estou cheia de sono. os olhos fecham-se várias vezes. conduzo sempre pela direita. de repente o meu filho grita o que foi isto? nada filho. só adormeci. tinha saltado o passeio. mais uma vez estou certa que o meu pai avisou o meu anjo da guarda que retirou do meu caminho todos os veículos. na segunda circular. em lisboa.

21 agosto, 2010

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Ondjakiondjaki um sol aceso / a dizer manhãs. / os prédios / rebeldes / eram o vértice do colectivo anonimato. / era um lugar chamado São Paulo...

Caçador de sóis - Ala dos Namorados (clica aqui)

Pelo céu às cavalitas,
Escondi nos teus caracóis,
A estrela mais bonita, que eu já vi

Eu cresci com um encanto,
De ser caçador de sóis,
Eu já corri tanto, tanto para ti

Pai, a minha sombra é tu


a cadeira está vazia, um corpo ausente
não aquece a madeira que lhe dá forma

e não ouço o recado que me quiseste dar
nem a tua voz forte que grita
meninos
na hora de acordar
ouço o teu abraço, no corredor em gaia
e os olhos molhados pela inusitada despedida

o sol foge
mas o crepúsculo desenha a sombra que
tenho colada aos pés
ou o espelho, coberto com a tua face

pai, digo-te
a minha sombra és tu

(Jorge Reis-Sá)

conversa com o meu pai

desculpa pai estar tanto tempo sem te falar. a verdade é que ando tão cansada de não ter com quem desabafar que fica difícil tomar coragem para te incomodar aí onde deves estar inventando estórias que contas tão seriamente que toda a gente acredita. por mais fantásticas e inverosímeis que sejam. mesmo assim a verdade é que não te esqueces nunca de avisar o meu anjo da guarda quando estou em perigo. se assim não fosse como explicar o facto de sair sã e salva de tantos possíveis acidentes. eu sei que o meu anjo da guarda é muito rápido e muito atento. mas também sei que tem que estar em muitos lugares ao mesmo tempo. só posso explicar que me salve a toda a hora porque tu estás aí atento e o ajudas a proteger-me. mas fazes-me tanta falta pai. encho a minha vida como posso. a mãe já não está aqui para cuidar dela. mas está bem. não precisas que te diga. tu sabes. e assim vou inventando hobbys para me manter ocupada. mas tu sabes como eu sou exagerada e acabo sempre por ficar tão ocupada que fico sem tempo para coisas que gostaria tanto de fazer. mas o que mais dói pai é a solidão. por isso agora falo para o mika. é apenas um gato. mas à sua maneira faz-me companhia. os amigos desapareceram ou estão demasiado longe. vou acabar porque estou a ficar com pena de mim que é uma coisa que odeio. tu sabes de tudo. e hás-de arranjar maneira de me ajudar. até sempre pai.

14 agosto, 2010

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Ondjakiondjaki não havia música / nos intervalos vazios / onde o meu corpo resvalava / para pequenas mortes. / só a aspereza / do silêncio...

The Will to Live- Jack Johnson e Ben Harper

I met a girl whose heart
was on the right hand side
and upon the left
an angel did reside
they told her mother
that she never would survive
but she kept the rhythm
and is still alive
We must all have
the will to live
you got to have
the will to live

Homem

Inútil definir este animal aflito.
Nem palavras,
nem cinzéis,
nem acordes,
nem pincéis
são gargantas deste grito.
Universo em expansão.
Pincelada de zarcão
desde mais infinito a menos infinito.

(António Gedeão)