25 janeiro, 2007

É DO AMOR QUE FALO

POEMA


A dádiva total dos corpos às águas que desabam das montanhas,
A vitória dos peixes sobre as pedras,
O riso do sol face ao espanto
Do corvo hierático sobre as rochas.

Canto a placidez das cegonhas sobre as calmas enseadas,
O rumorejar dos barcos,
O farfalhar dos choupos,
A correria infantil dos cães sobre as areias inclinadas dos rios.
É do amor que falo,
Do riso contra a bruma,
Do teu corpo liberto dançando violento sobre o verde
Onde os insectos enlouquecidos incomodam a casa
Que arde nas veias do centro da terra descoberta.
Beijo líquido e resinoso à sombra do mês de Abril
Que aspira o aroma das estevas e das urzes,
Nudez agreste e calma.
Canto contra a morte
Que nem lembro, renasço, pleno, babado de raízes,
Admiro o céu,
As águas sobre o corpo.
Ainda há pouco chorava como um ramo
Em orvalho de manhã
O sonho de ser água.
Criança sem mais nada que o riso numa taça.
A eloquente solidão,
A festa que dança com teu corpo nu e vitorioso sobre as dunas.
Ah, meu amor, as palavras nada valem
Quando se dança como tu à beira-mar...
Os barcos param os motores e as gaivotas dizem
Nunca vi coisa mais bela sobre o mar e sobre a terra,
As conchas esquecem a saudade dos corpos que tiveram,
Os peixes saltam sobre as ondas...
Embevecido,
Vejo o teu corpo que dança sobre os barcos,
Vejo as gaivotas que dançam sobre os mastros
E sinto a voz do mar,
A música difícil que coroa o teu corpo de vitória.
Não,
Difícil foi chegares à dança com que danças,
Sem tempo sobre o tempo.
Difícil, foi cresceres e nasceres para o riso e para a espuma
Espantada com a leveza das palavras
E o regresso ao vento aberto,
Às ânsias do sol-posto,
Aos dedos
Loucos de inocência,
Descobrindo as grutas sobre a pele.
A noite já chegou e eu não tenho mais palavras, meu amor,
Senão conchas em repouso sobre as rosas do regresso.
Ajuda-me a escrever este poema de amoras mansas, livres,
Com gestos de silêncio,
Com cansaços de quem merece as madrugadas...
Eduardo Aleixo

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