E aí me dá uma tristeza
No meu peito
Feito um despeito
De eu não ter como lutar
E eu que não creio
Peço a Deus por minha gente
É gente humilde
Que vontade de chorar
Um blog do dia a dia, com muitas estórias, alguma poesia, música, fotografia, crítica, comentários... para desabafar, porque sem um grito ninguém segura o rojão!
28 novembro, 2008
Ocaso
Hora de tédio e de meditação!
Longe agoniza o sol num poente de ouro e de aço,
e em meu peito outro sol de luz magoada e fria,
pinta o pálido azul com as cores da agonia.
Andam asas no espaço.
Asas cor de carvão.
Na torre lanceolada de minh'alma
há vagos sons de violino
chorando o ritornelo gris da mágoa.
Expira a tarde, plange o sino,
é morta a luz, morta a ilusão...
(Óscar Magalhães)
da gente humilde
ao frio juntou-se a chuva aqui por terras lusitanas. estou de férias menos mal. amanhã parto em busca de amigos e familiares ou de familiares e amigos ou de gente que considero amiga e familiar ou familiar e amiga... o que para aqui vai de conversa da treta. se isto fosse trabalho pago à linha dir-se-ia que estou a fazer linhas. se calhar estou. ainda que não pagas. na Índia parece existir uma guerra civil. parece que ninguém percebe muito bem o que se passa. percebem-se os mortos e feridos mas o porquê como sempre ninguém percebe. ou eu não percebo que sou assim um bocadinho a atirar para o lerda das ideias. não consigo perceber a violência embora por vezes pareça que apelo ao extremismo. no fundo o que eu quero mesmo é que nos deixem a todos dormir em paz já basta um governo que tira do bolso dos contribuintes para cobrir más gestões de banqueiros que até podem estar presos mas que estão cheios de dinheiro e o resto é conversa...na América do Sul o povo é atormentado pelo mau tempo. populações inteiras que já pouco tinham agora ficam sem nada. apenas lama e mais lama para limpar. é esta gente que eu tenho vontade de ajudar. esta gente humilde que tantas vezes me dá vontade de chorar.
27 novembro, 2008
Nem um Dia (....um dia frio) - Djavan (clica aqui)
Se eu soubesse brincar
Si eu tivesse seis anos si soubesse brincar
pedia ao Menino Jesus que viesse me dar
seus brinquedos coloridos
E ele dava mesmo dava tudo
dava brinquedos variados de todas as cores
brinquedos sortidos
dava bolas lustrosas pra mim soltar de noite e
mandar todas pro céu com minha reza
Dava bolas dava quitanda dava bala
se havia de ficar melado, todo doce de minha baba.
E dava homenzinhos, arvinhas, bichinhos, casinhas e
em minhas mãos ingênuas eu tirava o mundo novinho,
cheiroso de cola e verniz, das caixas nurembergue
pra recomeçar deslumbrando a brincadeira da
vida
O Menino Jesus dava tudo si eu fosse menino
si soubesse brincar pra brincar com ele.
(Pedro Nava)
menos gente
se passasse por ti na rua de certeza não restaria nada na minha memória. mas se me olhasses e sorrisses sim. aí ficas na lembrança. porque existe no teu olhar e no teu sorriso uma enorme doçura. algo que faz com que tenha vontade de parar de falar de ouvir a tua voz igualmente doce. falamos pouco. mal nos conhecemos. almoçámos juntos uma vez lembras-te? não mais do que isso. e no entanto vejo-te dias após dia e pelo canto do olho observo sempre que posso o teu sorriso. como uma figura tão apagada se pode iluminar dessa maneira... como consegues? hoje decidi escrever-te porque me perguntaste se deixei de ler emails. disse-te que sim. deixei. é difícil conseguir tempo para manter este blogue que provavelmente nem conheces e abrir cerca de 30 emails por dia. e é como te digo. vou tentando a ver se arranjo tempo mas como não consigo ultrapassados os 1000 emails recebidos vai tudo para o lixo. para o lixo eterno sabes como é. preciso do pouco tempo que me resta para manter este espaço e ler e ver cinema e ouvir música. se não o fizer começo a sentir-me dependente desta coisa. e agora que me libertei de quase tudo o que me fazia sentir estúpida prefiro ocupar o tempo de uma maneira mais enriquecedora. e olhar-te é também uma maneira de ficar com o dia mais rico. mais doce. só isso. acho que já devia ter escrito isto há muito tempo mas que queres... eu sou assim. por fora uma coisa mas por dentro outra. menos alegre menos doce menos gente... do que tu.
26 novembro, 2008
Anel de Rubi - Rui Veloso (clica aqui)
Poema do jornal
os vagabundos estão em extinção
no conforto da minha casa e sobretudo quando me deito coberta pelo edredon penso nos desabrigados de todo o mundo. bem sei que os desabrigados de Portugal são privilegiados em relação aos de outros países. mas também sei que as capitais europeias costumam abrir as estações de Metro nas noites muito frias para que os desabrigados possam ter um pouco mais de conforto. dir-me-ão e eu sei que é verdade que para a maior parte deles é uma opção de vida. há uns anos bons trabalhava num sítio em cuja rua existia um velho carro abandonado. um homem que tinha tido uma boa vida tinha sido emigrante na Alemanha quando se soube traído pela mulher saiu de casa e foi viver para dentro daquele carro. um colega meu por mais de uma vez pegou nele e tentou dar-lhe um pouco de conforto um tecto e alimentação numa das instituições que em Lisboa se ocupam de gente que por um motivo ou outro acaba por viver na rua. o homem não se aguentava por mais de dois dias. não trocava a liberdade e a fome por um tecto e alimentação a horas certas. compreendo muito bem esta gente . adoro os vagabundos. infelizmente quase desapareceram da face da terra e o que de mais parecido existe são parasitas que pedem esmola ou arrumam carros e ganham em média mais do que eu. e nem sequer pagam impostos sobre o trabalho. os vagabundos não. fazem alguma coisa em troca de um abrigo e uma refeição. mas que é feito deles... desses que não se deixavam acorrentar pelas convenções mas ganhavam honestamente a o que comiam sem se vergarem. livres.
25 novembro, 2008
Três - Adriana Calcanhoto (clica aqui)
Poesia-Orgasmo
De silabas de letras de fonemas
se faz a escrita. Não se faz um verso.
Tem de correr no corpo dos poemas
o sangue das artérias do universo.
Cada palavra há-de ser um grito.
Um murmurio um gemido uma erecção
que transporte do humano ao infinito
a dor o fogo a flor a vibração.
A poesia é de mel ou de cicuta?
Quando um poeta se interroga e escuta
ouve ternura luta espanto ou espasmo?
Ouve como quiser seja o que for
fazer poemas é escrever amor
a poesia o que tem de ser é orgasmo.
(José Carlos Ary dos Santos)
quero descansar
e tal como Vinicius não mais que de repente pergunto-me o que fiz da minha vida... agora que começo a pensar que a eternidade não é para mim pergunto-me o que fiz da minha vida e se ainda terei tempo de fazer alguma coisa que valha a pena. para além dos amores das paixões dos filhos da família dos netos o que fiz da minha vida que realmente valha a pena. que importância tem as pequenas vitórias do dia a dia. que é que eu posso dizer que fiz de que possa realmente orgulhar-me... nada. o meu neto mais novo acaba de me oferecer um desenho e emociono-me porque apesar de viver tão longe sempre se lembra de mim e fala a minha língua para além da língua materna. olho para os meus filhos penso nos meus avós no meu pai na minha irmã também desaparecida tão cedo e penso que as minhas avós tiveram sorte. viveram muito tempo. tiveram netos bisnetos e trisnetos. o meu pai apenas netos e um bisneto e a minha irmã só conheceu o primeiro neto. eu tenho dois netos fui despachada como em tudo na minha vida. por isso agora penso que não tardará muito que deixe para trás tudo e todos. quero acabar de ler uns livros que ainda não li mas sinto-me tão cansada. como se o peso do mundo me caísse em cima dos ombros e o sono fosse a única coisa importante que me resta fazer. não morrerei jamais. mas vou dormir um sono muito longo. e vai saber-me muito bem descansar.
24 novembro, 2008
Dois Poemas - Vinicius de Moraes (clica aqui)
Encomenda
Desejo uma fotografia
como esta — o senhor vê? — como esta:
em que para sempre me ria
como um vestido de eterna festa.
Como tenho a testa sombria,
derrame luz na minha testa.
Deixe esta ruga, que me empresta
um certo ar de sabedoria.
Não meta fundos de floresta
nem de arbitrária fantasia...
Não... Neste espaço que ainda resta,
ponha uma cadeira vazia.
(Cecília Meireles)
e se afinal
e se afinal eu não mais uma gaivota mas uma cegonha. se afinal apesar de comer mais peixe que insectos e pequenos répteis mesmo assim eu uma cegonha e não mais uma gaivota... e se afinal em vez da gaivota que fica nas rochas do paredão eu afinal uma gaivota no alto do campanário de uma igreja digamos na Comporta porque perto do mar e assim posso decidir quando quero ser gaivota e quando quero ser cegonha... mas realmente porque não uma cegonha voando 400 km por dia que é o ideal para alguém como eu que não gosta de pressas prefere planar ou até ficar parada em cima de uma rocha como uma gaivota olhando outras aves que conversam entre si formando grupos etários e não me intrometendo nas conversas eu uma gaivota ou uma cegonha educada.. mas realmente se afinal eu uma gaivota que partilha com o seu parceiro a criação dos filhotes sem nunca nos zangarmos cada um fazendo a sua parte agora choco eu e depois chocas tu... agora eu vou em busca de alimento e tu aí a chocar... e se de repente eu resolvo fazer 400 km em direcção ao norte de África e não voltar mais... e se afinal eu uma cegonha solitária como a maioria dos humanos.
23 novembro, 2008
Dia de Domingo - Gal Costa e Tim Maia
As sem-razões do amor
Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.
(Carlos Drummond de Andrade)
sonho de um fim de dia de domingo
um objectivo um sonho o que posso chamar-lhe? de repente desperto para a necessidade de ter que arranjar algo que seja importante para mim realizar antes de morrer. não sei ninguém sabe o tempo que tem. mas a verdade é que descobri a urgência de traçar um objectivo. se fosse escritora poderia querer ser melhor que Lobo Antunes. mas isso seria escolher um objectivo inatingível claro. se fosse pintora quereria ser melhor que Paula Rego e morreria igualmente frustrada. se fosse compositora de música popular quereria ser melhor que Chico Buarque e bateria com a cabeça nas paredes por não ser capaz. tenho portanto que arranja um objectivo perfeitamente capaz de ser alcançável apesar de com algum esforço claro. no filme Conversas com o meu jardineiro o objectivo do dele é pescar uma carpa. mais uma vez. quer dizer quando ele fala da carpa refere-se ao peixe e fica-se com a impressão de que ele sabe qual o peixe que quer pescar que o conhece mas que nunca o pescou. porém antes de morrer o jardineiro vai à pesca com seu amigo pintor e juntos conseguem pescar a carpa. depois de a deixarem uns momentos no barco o jardineiro diz que o melhor é devolverem-na ao lago. afinal esta é a terceira e última vez que pescou a mesma carpa. e a última. o peixe como ele lhe chama. e é de uma coisa assim mais ou menos simples que preciso. porque percebi que fazer o meu trabalho o melhor possível não chega. remar contra a maré tornou-se uma banalidade dos meus dias. tenho que arranjar uma coisa qualquer que queira muito fazer e ainda não tenha feito. aqui há uns anos diria que não poderia morrer sem conhecer La Valeta. se calhar agora o que me falta mesmo é voltar a La Valeta e quem sabe ficar por lá a olhar o mar das estreitas ruas cheias de flores nas varandas.
22 novembro, 2008
Com Açucar, Com Afeto - Fernanda Takai (clica aqui)
Aos que se foram
Não sei dos homens que ficaram
E guardam seus segredos
No fundo dos olhos banhados de medo
a ruminar a verde folhagem da esperança
a embalar a coragem que ainda não nasceu.
E guardam seus segredos
No fundo dos olhos banhados de medo
a ruminar a verde folhagem da esperança
a embalar a coragem que ainda não nasceu.
Sei dos homens que se foram
E se perderam
Com seu medo
Desejos e sonhos secretos.
E se perderam
Com seu medo
Desejos e sonhos secretos.
Desconheço todos os homens de fé
E todas as formas de felicidade
Que espalham-se em inumeráveis cartazes
a sujar com seu estrume todas as faces da cidade
a subjugar os miseráveis com sua faca de dois gumes.
E todas as formas de felicidade
Que espalham-se em inumeráveis cartazes
a sujar com seu estrume todas as faces da cidade
a subjugar os miseráveis com sua faca de dois gumes.
Não sei dos homens que ficaram
A tramar o futuro.
Sei dos homens que se rebelaram
E voaram para desencontrá-lo.
A tramar o futuro.
Sei dos homens que se rebelaram
E voaram para desencontrá-lo.
(Nelson Nunes)
o que faz falta
no nosso país as coisas funcionam assim. há classes profissionais capazes de se desunharem por tudo e por nada mas na hora de unir estão lá. quando é preciso lutar estão presentes. se têm que sair à rua saem aos milhares. se é preciso fazer greve fazem e não ficam a pensar no dinheirito que deixam de ganhar... eu até já fiz greves que me deram dinheiro a ganhar vejam lá. é só fazerem contas. mas não é por isso que eu faço greve. é só porque sou coerente. não faz sentido andarmos todos a dizer mal do governo e depois continuarmos as nossas vidinhas de merda (desculpem mas saiu já está paciência) inventando desculpas que não "colam". pelo menos comigo não. os professores estão empenhados e bem na alteração da sua avaliação e insistem na extinção de quotas. pois o grande problema são mesmo as quotas. para quem avalia e para quem é avaliado. porque ser excelente é uma coisa quase absurda. trabalhei com gente que obteve excelentes tendo cometido muitos erros. mas ser muito bom é bastante mais corriqueiro. não pode ser sujeito a quotas. não faz sentido. um serviço pode ter só funcionários bons e muito bons e outro não ter nenhum que valha o pão que come. as quotas não fazem sentido. foram criadas com a intenção economicista do governo. um funcionário que tenha bom (e a maior parte é o que tem porque as quotas não permitem outra coisa) levará dez anos a dar um pulinho na carreira. quando eu entrei na administração pública e a letra é mesmo tão minúscula quanto a administração os funcionários eram aumentados de 5 em 5 anos. agora que trabalham cada vez mais e com mais formação e mais responsabilidade levam 10 anos para poderem progredir na carreira. é esta a motivação que o José deseja? não me lixem. o problema das quotas não é apenas dos professores mas de todos os que trabalham nesta administração que está cada vez mais doente e esvaziada de sentido. o que faz falta é unir a malta. é o que faz falta.
21 novembro, 2008
Put Your Hands On Me Joss Stone (clica aqui)
teatro da boneca
A menina tinha os cabelos louros.
A boneca também.
A menina tinha os olhos castanhos.
Os da boneca eram azuis.
A menina gostava loucamente da boneca
A boneca ninguém sabe se gostava da menina.
Mas a menina morreu.
A boneca ficou.
Agora já ninguém sabe se a menina gosta da boneca.
A boneca também.
A menina tinha os olhos castanhos.
Os da boneca eram azuis.
A menina gostava loucamente da boneca
A boneca ninguém sabe se gostava da menina.
Mas a menina morreu.
A boneca ficou.
Agora já ninguém sabe se a menina gosta da boneca.
E a boneca não cabe em nenhuma gaveta.
A boneca abre as tampas de todas as malas.
A boneca é maior que a presença de todas as coisas.
A boneca está em toda a parte.
A boneca enche a casa toda.
A boneca abre as tampas de todas as malas.
A boneca é maior que a presença de todas as coisas.
A boneca está em toda a parte.
A boneca enche a casa toda.
É preciso esconder a boneca.
É preciso que a boneca desapareça para sempre.
É preciso matar, é preciso enterrar a boneca.
A boneca.
É preciso que a boneca desapareça para sempre.
É preciso matar, é preciso enterrar a boneca.
A boneca.
A boneca.
(Carlos Queirós)
não quero ajuda. ponto final
mais um dia. cada dia mais difícil de viver do que o anterior. agora os meus pais não me dão dinheiro nenhum e tu também não. vasculho tudo em casa à procura e não consigo perceber se não tens mesmo dinheiro ou se o escondes tão bem que não o encontro. mas acho difícil. afinal somos só nós aqui em casa e eu conheço-lhe todos os cantos. deves andar com o dinheiro todo contigo ou levantas tão pouco que quando entras em casa não resta nada. é cada vez mais difícil arranjar algo que possa trocar por um pouco de branquinha. e se o faço vens logo com quatro pedras na mão acusando-me de ter levado o que vai desaparecendo e que tenha alguma utilidade para mim. percebo que não queres dizer claramente que sou uma ladra que não passo de uma ladra porque me amas ainda mas no fundo envergonhas-te por viveres com alguém capaz de mentir roubar enganar a todo o instante. de viveres com alguém que todos os dias promete que vai mudar porque te ama mas que te troca por um charro ou um pedacinho de pó. porque a felicidade está ali. cada vez mais está ali. porque se entro em casa começas logo a acusar-me e eu descontrolo-me e digo o que não devo e tu não acreditas mas é verdade quando eu digo que vou mudar. é verdade quando eu digo que não estou "agarrada". é verdade. porque naquele momento em que to digo eu acredito. acredito que posso deixar a droga quando quiser. mas agora neste momento em que escrevo mais um papel para queimar sei que jamais deixarei o prazer que me é proporcionado por ela. e é por isso que este papel vai ser queimado. porque só serviu para me exorcizar. será feito em cinzas para que não saibas que nos meus momentos cada vez mais raros de lucidez eu sei que tu os meus psi os meus amigos têm razão. eu não vou deixar de fazer o que faço sem ajuda. e eu não quero ajuda. ponto final.
20 novembro, 2008
Terra dos Sonhos - Jorge Palma (clica aqui)
Mãos dadas
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considere a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.
Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,a vida presente.
(Carlos Drummond de Andrade)
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considere a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.
Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,a vida presente.
(Carlos Drummond de Andrade)
mais um papel para o lixo... como eu
saio e digo-te que não demoro vou fazer uma compra ou assim. pedes que seja mais específica e respondo-te com agressividade. não quero sentir que me controlas mete-te na tua vida não é porque vivo contigo que tenho que te dar conta de todos os meus passos. não me queres ver irritada tentas acalmar-me e dizes que me esperas com um chá que vais fazer e uns biscoitos que a tua mãe ofereceu. volto a repetir agora com alguma calma eu já volto. e vou. vou ter com o meu amante que por acaso tem um nome masculino mas que misturo com um nome feminino. com os amigos que agora tenho fumo uns baseados e cheiro uma branquinha. digo que tenho que voltar para casa que estás à minha espera e propõem-me algo mais. acabo por ceder. afinal tá-se bem porquê parar logo agora que estamos todos no céu... quando enfim decido voltar a casa esperas-me com um ar cansado de que não dormiu. estás zangado quando dizes que me procuraste por hospitais e esquadras de polícia e eu reajo mal. digo que não há razão para todo aquele drama. eu estou bem só me despistei um pouco com as horas porque tive que cuidar de uma amiga doente. e minto. minto sempre. todos os dias. vou continuar a mentir mas tu julgas que não. julgas que podes fazer alguma coisa por mim. no fundo eu também. morro de medo que me abandones. morro de medo que os meus pais me abandonem. mas logo ou amanhã voltarei a fazer o mesmo. depois de fazer mil promessas de que não voltará a acontecer desaparecerei novamente quem sabe por quanto tempo... quando estou lúcida está tudo bem. digo o que se passa de verdade. mas nunca a ti. nunca aos que me amam. nunca a mim mesma. só aqui neste pedaço de papel que acabarei por amarrotar e deitar no lixo...
19 novembro, 2008
Restolho - Mafalda Veiga (clica aqui)
Canto o povo de um lugar
um arquipélago para os menos loucos
não sei se é comum não sei se tenho vindo a atravessar uma depressão que tento esconder de mim mesma. sei que desde que adoeci há 6 meses nunca mais peguei num livro... compro mas nem os abro. o mesmo me aconteceu em relação a outras coisas de que gosto de fazer pequenas coisas que me dão imenso prazer como caminhar. tive que me obrigar a sair de casa para voltar a fazer as minhas caminhadas à beira mar. ja quanto aos livros só o António com o seu Arquipélago da Insónia me tirou do marasmo. mal comecei a ler e já quase acabei. é um dos talentos do meu querido António. despertar-me para a vida através da sua poesia um tanto amarga um tanto desiludida. porque o António não se limita a escrever romances. acho que nem ele mesmo os vê dessa maneira. eu vejo-os como poesia. pura e dura. e necessária. mais do que isso imprescindível. por isso António mais uma vez o meu obrigada por fazeres um trabalho que não é apenas arte mas socialmente necessário. pelo menos para os que como eu se sentem um pouco à deriva neste mundo de loucos.
18 novembro, 2008
Estou além - António Variações (clica aqui)
A concha
A minha casa é concha. Como os bichos
Segreguei-a de mim com paciência:
Fachada de marés, a sonho e lixos,
O horto e os muros só areia e ausência.
Segreguei-a de mim com paciência:
Fachada de marés, a sonho e lixos,
O horto e os muros só areia e ausência.
Minha casa sou eu e os meus caprichos.
O orgulho carregado de inocência
Se às vezes dá uma varanda, vence-a
O sal que os santos esboroou nos nichos.
O orgulho carregado de inocência
Se às vezes dá uma varanda, vence-a
O sal que os santos esboroou nos nichos.
E telhados de vidro, e escadarias
Frágeis, cobertas de hera, oh bronze falso!
Lareira aberta ao vento, as salas frias.
Frágeis, cobertas de hera, oh bronze falso!
Lareira aberta ao vento, as salas frias.
A minha casa. . . Mas é outra a história:
Sou eu ao vento e à chuva, aqui descalço,
Sentado numa pedra de memória.
Sou eu ao vento e à chuva, aqui descalço,
Sentado numa pedra de memória.
(Vitorino Nemésio)
a culpa de tudo é do Gepeto
a Nélita é uma menina que todos conhecemos. a sua melhor qualidade é ser feia. como se dizia no tempo em que o serviço militar era obrigatório feia como uma bota da tropa. ela vai ao cabeleireiro mas não adianta nada. continua feia. creio que a culpa não é do cabeleireiro. para além de ser feia muito feia mesmo horrorosa a Nélita quando fala tem propensão para as saídas infelizes. antigamente a Nélita estava calada e todos a criticavam por isso. agora parece que todos já percebemos porque é que muitas vezes é preferível o silêncio. é que para vir dizer que talvez seja bom interromper uma democracia com uma ditadura durante 6 meses para pôr o país na ordem e depois então retomá-la é uma ideia tão estapafúrdia que daria com certeza uma comédia hilariante. ou um drama de ir às lágrimas. pena que não tenho tempo para me dedicar a escrever argumentos. com personagens assim seria bem fácil fazê-lo. e já agora a talhe de foice e porque prosa já vi longa queria só falar-vos do Zézinho um menino que de frente até nem é feio o pior é mesmo de perfil quando se nota aquele nariz copiado do Pinóquio e que é claro que cresce quando ele diz que está muito satisfeito com os actuais números do desemprego. nem o Gepeto já acredita nele.
17 novembro, 2008
Samba do Grande Amor - Djavan e Chico Buarque (clica aqui)
Estado de coisas
Eram todos bons meninos
Comeram e se lambusaram.
Limparam a língua nos pratos.
Derramaram na mesa.
Gritaram a plenos pulmões.
Ainda era verão
e não era banquete
mas tinha sorvete de mamão.
E depois da sobremesa
refresco de limão.
E de bocas meladas
com as mãos lambusadas
deixaram a mesa arrumada
de desarrumação.
Pegaram seus bonés
espalitando os dentes
contentes se foram
na mais completa falta de educação
dando grandes risadas
e longos arrotos.
Eram todos garotos
hão-de compreender.
(Geraldo Maia)
uma voltinha vai fazer-lhe bem vai ver
a ministra da educação e isto é tudo em minúsculas porque mais não merece nem a ministra nem a educação em Portugal. afinal de contas ficámos todos a saber professores alunos encarregados de educação e população em geral que estávamos enganados quanto ao regime de faltas dos alunos. ficámos mais descansados? eu não. como é que um professor que tem que perder horas (e olhem que eu sou daquelas que defende que o tempo nunca se perde) a preencher fichas para a sua avaliação pode dar aulas no seu horário normal quanto mais dar aulas de recuperação a um aluno que esteve ausente por doença durante bastante tempo? andamos a brincar à educação e aos ministérios pois claro. até o Zé Carlos sabe mais de educação do que a ministra. não há dúvida que a ideia de senhas para ser atendido pelo professor é genial. assim o professor consegue pelo menos manter alguma disciplina e adiar os problemas dos alunos para resolver os seus que são aqueles que lhe vão dar o pãozinho para a boca... é que afinal eles não são jogadores de futebol verdadeiramente profissionais. só para terminar senhora ministra vá dar uma volta a ver se aprende alguma coisa sobre modelos de avaliação. dos professores em particular e da função pública em geral. porque quem sai mais prejudicado no meio de toda esta confusão é aquele a quem deveriam ser prestados serviços.
16 novembro, 2008
Que Sera, Sera - Doris Day (clica aqui)
Depois do sol...
Fez-se noite com tal mistério,
Tão sem rumor, tão devagar,
Que o crepúsculo é como um luar
Iluminando um cemitério . . .
Tudo imóvel . . . Serenidades . . .
Que tristeza, nos sonhos meus!
E quanto choro e quanto adeus
Neste mar de infelicidades!
Oh! Paisagens minhas de antanho . . .
Velhas, velhas . . . Nem vivem mais . . .
— As nuvens passam desiguais,
Com sonolência de rebanho . . .
Seres e coisas vão-se embora . . .
E, na auréola triste do luar,
Anda a lua, tão devagar,
Que parece Nossa Senhora
Pelos silêncios a sonhar . . .
(Cecília Meireles)
peço-te perdão
quando te perguntei se querias casar comigo respondeste imediatamente que sim. eu tinha apenas 18 anos tu eras um homem feito meu professor na faculdade. como eu muitas alunas estavam apaixonadas por ti. não era exactamente pela beleza mas pelo charme. tu sabes sempre soubeste como seduzir uma mulher tivesse ela a idade que tivesse. mas disseste sim. contavas isto aos amigos aos conhecidos a toda a gente e explicavas que a força que em mim existia era irresistível e quando percebeste que aquela era a maneira de me teres sempre junto de ti disseste sim. ao longo de trinta anos deste algumas facadinhas a que fechei os olhos. as mulheres são demasiado exigentes. querem estar constantemente apaixonadas e muitas não perdoam um caso uma aventura uma coisa de nada. mas eu fazia de conta que não sabia que continuavas a ter os teus encontros com jovens alunas... e eu entendia. como resistir à juventude de um corpo belo e são? agora que comecei a esquecer o que fiz há duas horas sei que dentro de algum tempo terei esquecido também os 30 anos que vivemos juntos como terei esquecido os meus pais e irmãos e amigos. terei até esquecido os filhos que não temos. tudo ficará para trás. tu deixarás de existir para mim. passarás a ser um estranho. sabes não sabes? mas eu sei que jamais me abandonarás. ficarás ali ao meu lado a ver-me distante a tentares formas de me trazer para perto de ti e eu... eu estarei cada vez mais longe. até que um dia não voltarei mais a estar junto de ti. troco-te por um senhor chamado Alzheimer. é se calhar a minha pequena vingança pelos erros que cometeste. mas peço-te perdão assim mesmo pois sei que é uma pena demasiado pesada para quem tanto me amou.
15 novembro, 2008
Bom Prazer - Sergio Godinho (clica aqui)
Fio
com a alegria possível
um dia de sábado que senti intenso sem saber muito bem porquê. na verdade não há qualquer razão para este sentimento. desliguei-me do mundo e comecei o dia pelas 8 e pouco passeando junto ao mar. as gaivotas estavam lá. em todo o lado. passeei-me pelo meio delas não me passaram cartão. entretidas que estavam a conversar umas com as outras assim se deixaram ficar. como sou bem educada não me meti na conversa. afinal são coisas delas do mundo delas. aos meus olhos têm que se manter tal como são para todos os humanos. gaivotas. e segui o resto do dia cumprindo horários como se tivesse um dia muito cheio pela frente e tive não sei porquê sei que fiz bem desligar os telefones afinal sempre foi menos uma coisa a ter que fazer ler mensagens e atender chamadas logo eu que não gosto de falar ao telefone (acabo de atender mais uma que se há-de fazer). a ver se amanhã me desligo de horários (outra chamada agora de mensagem gaita isto assim não dá pareço mais uma central telefónica) e me preparo para mais uma semana de trabalho. com a alegria que ainda é possível.
14 novembro, 2008
O Sopro do Coração - Clã (clica aqui)
O louco
feliz aniversário pai
hoje ter-te-ia dado um livro provavelmente o último do Saramago que ainda não tenho nem li. havias de ralhar comigo como sempre dizendo que eu não devia gastar dinheiro contigo em prendas que os meus beijos bastavam que a minha presença é que era importante e eu havia de rir e dizer não vês que eu estou a dar-te um livro para que depois de leres tu mo emprestes? e tu dirias pronto está bem és tão teimosa não vale a pena repetir as mesmas coisas... que repetias pelo Natal pelo dia do Pai e pelo teu aniversário. as saudades que sinto hoje são as mesmas de sempre quer dizer são sempre maiores à medida que o tempo passa mas nesta altura instala-se-me um nó na garganta porque tu já não estás aqui para te dar um beijo e um livro e rir com as tuas estórias que nunca sabia se eram ou não de verdade. a mãe tem lido todas as cartas que lhe escreveste e eu tento convencê-la a deixá-las em testamento aos filhos e netos. afinal que herança maior podemos ter nós que te amámos tanto senão guardar para sempre aquilo que escreveste aquilo que pensavas sobre cada um de nós as saudades que expressavas sempre que estavas longe. hoje como ontem estás aqui. muito perto de mim. muito perto de nós que te amamos. sempre. para sempre. feliz aniversário pai.
13 novembro, 2008
Most Likely You Go Your Way - Bob Dylan (clica aqui)
Letra para um hino
É possível falar sem um nó na garganta
É possível amar sem que venham proibir
É possível correr sem que seja a fugir.
Se tens vontade de cantar não tenhas
medo: canta.
É possível andar sem olhar para o chão
É possível viver sem que seja de rastos.
Os teus olhos nasceram para olhar os astros.
Se te apetecer dizer não grita comigo:
Não.
É possível viver de outro modo.
É possível transformares em arma a tua mão.
É possível o amor.
É possível o pão.
É possível viver de pé.
Não te deixes murchar.
Não deixes que te domem.
É possível viver sem fingir que se vive.
É possível ser homem.
É possível ser livre livre livre.
(Manuel Alegre)
tenho vergonha
de há uns anos para cá a revolução de Abril foi completamente esquecida pelos políticos deste país que se têm servido (há excepções claro ainda que raras) a encher os bolsos à custa dos contribuintes ou seja dos trabalhadores. vou agora tendo conhecimento de estórias que não me entrariam na cabeça há muito pouco tempo. gente que teve dinheiro de berço de família e que hoje não paga a conta do telefone porque o dinheiro não chega para tudo e é preciso fazer opções. gente honesta que não roubou nada a ninguém que toda a vida deu um pouco do seu aos mais pobres e que agora se vê em situações perfeitamente inacreditáveis. neste país onde começo a ter vergonha de viver onde começo a ter vergonha de ter um bilhete de identidade que me identifica com gente que se encheu à custa dos outros e que agora cada vez mais somos nós que pagamos a factura. nós que toda a vida cumprimos e trabalhámos por ordenados miseráveis somos olhados de lado e vemos ainda as pessoas afastarem-se dos mais miseráveis como se de doentes contagiosos se tratassem. tenho tanta vergonha deste país!
12 novembro, 2008
Leonard Cohen - Everybody Knows
Boneca
Porque ela é tão pequena e tão franzina
até receio quando alguém nos vê
beijar suas mãositas de musmê
ante seus olhos grandes de menina.
Ela parece assim (não sei porquê)
tendo uma boca rubra e pequenina,
uma boneca original da China
que ri e dança namora e lê.
Tenho receio de tocar de leve
aquela alvinha como a neve,
aquela carne tentadora e louca.
Se beijo-a muito, tenho muita pena
porque ela é tão franzina e tão pequena
que o meu beijo mau cabe em sua boca.
(Nonato Marques)
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