30 abril, 2009

Deixa-te Ficar na Minha Casa - Filarmonica Gil (clica aqui)

Tenho livros e papeis espalhados pelo chão.
A poeira duma vida deve ter algum sentido:
Uma pista, um sinal de qualquer recordação,
Uma frase onde te encontre e me deixe comovido.
Guardo na palma da mão o calor dos objectos
Com as datas e locais, por que brincas, por que ri
E depois o arrepio, a memória dos afectos

As frageis hastes


Não voltarei à fonte dos teus flancos 
ao fogo espesso do verão 
a escorrer infatigável 
dos espelhos, não voltarei. 

Não voltarei ao leito breve 
onde quebrámos uma a uma 
todas as frágeis 
hastes do amor. 

Eis o outono: cresce a prumo. 
Anoitecidas águas 
em febre em fúria em fogo 
arrastam-me para o fundo. 

(Eugénio de Andrade)

fica aí


deixa-te estar assim. gosto que me olhes assim. não fales. não digas nada. não me perguntes nada. eu sei que tu queres saber mas ambos sabemos já tudo o que importa. sempre soubemos. antes de nos conhecermos já éramos íntimos. depois de nos separarmos continuámos assim. ninguém que passe pela vida de cada um de nós pode destruir isso. estava escrito. está escrito. nada é para sempre. excepto o que está escrito. não muda. nada pode mudar esse facto. não nos conhecíamos mas sabíamos que existíamos. sabíamos que éramos um do outro. não importa por quanto tempo. não importa desde quando. isso só foi importante antes de nos separarmos. agora já não é. porque agora aprendemos que não podemos viver um com o outro mas seremos eternamente um do outro. como era antes de nos conhecermos. os filhos de cada um de nós só eram filhos de outros corpos mas sempre foram os nossos filhos. nem a morte foi capaz de alterar esta evidencia. e se quero que fiques aí sentado a olhar-me enquanto escrevo é porque quero dizer-te o que sabes. o que sempre soubeste. faltas-me. sempre me faltaste. mesmo quando estávamos juntos. sempre me faltaste. por isso agora que estás aí quieto como te peço estás mais perto de mim do que nunca. agora sim. agora já não saio sem te dizer para onde. agora já não tenho que te deixar. agora já posso ser tua para sempre como querias. porque estava escrito e eu não posso mudar a escrita do tempo. e não quero. fica aí. como estás. quieto. a olhar para mim.

Bem na minha mão - Susana Félix (clica aqui)

Não me venham buzinar
Vou tão bem na minha mão
Então vou para lá
Ver o que dá
Pé atrás na engrenagem
Altruísta até mais não

Confusão


Meu coração 
é teu coração? 
Quem me reflexa pensamentos? 
Quem me presta 
esta paixão 
sem raízes? 
Por que muda meu traje 
de cores? 
Tudo é encruzilhada! 
Por que vês no céu 
tanta estrela? 
Irmão, és tu 
ou sou eu? 
E estas mãos tão frias 
são daquele? 
Vejo-me pelos ocasos, 
e um formigueiro de gente 
anda por meu coração. 

(Federico García Lorca)

falo de burros


gosto imenso de burros. não. não gosto de gente burra. nem um bocadinho. a bem dizer devia ser proibida no género humano. a burrice claro. porque é um insulto para o nobre animal que é o burro. quando era menina andei muitas vezes de burro. estava no meio do mato no coração de Angola. foi quando tomei conhecimento que os homens não faziam xixi como eu. até aí pensava que só os meninos da minha rua faziam de maneira diferente para me chatearem. e eu tentava e acabava toda mijada. acontece que por ali os homens usavam apenas umas tiras à roda da cintura e quando pegavam na enxada mostravam o sexo. aí fiquei descansada. se bem que as mulheres mostravam uma espécie de mucuas que lhes desciam até à cintura e eu não notasse no meu corpo nada daquilo. mas de qualquer modo era um descanso perceber que os meus amigos afinal não me punham de parte. era assim mesmo que tinham que fazer. eu estava em desvantagem mas paciência. onde é que eu já vou? vinha falar de burros. os animais claro. havia um burro por ali. e éramos 4 crianças a montar o burro. o pobre mal tinha lombo para nos aconchegarmos. por isso um dia decidiu que estava farto de nos aturar e baixou a cabeça tão de repente que o miúdo da frente que não por acaso era o meu irmão caiu com o rabo bem em cima de uma pedra.  foi aí que nasceu a minha paixão pelo animal. que pelos vistos tem toda a razão de ser. um dia destes vou à festa dos burros. vou pois. e levo comigo a filha de Pepe que gosta tanto de burros como eu. de animais claro. porque de gente burra eu não gosto. e ela também não.

29 abril, 2009

Aqui em baixo - João Afonso (clica aqui)

Aqui em baixo é tudo azul 
o arco-íris é azul 
e é azul a chuva quando molha 
a minha casa está no mar 
no fundo bem fundo, azul 
sem fronteiras a dividir corações 






Ali



Ali sofreste. Ali amaste. 
Ali é a pedra do teu lar. 
Ali é o teu, bem teu lugar. 
Ali a praça onde jogaste 
o que o destino te quis dar. 

Ali ficou tua pegada 
impressa, firme, sobre o chão. 
Ninguém a vê sob o montão 
de cinza fria e poeirada? 
Distingue-a, sim, teu coração. 

Podem talvez o vento, a neve, 
roubar a flor que tu criaste? 
Ali sofreste. Ali amaste. 
Ali sentiste a vida breve. 
Ali sorriste. Ali choraste. 

(Saúl Dias)
 o presidente Obama está há 100 dias na presidência e mantém intocável a sua popularidade. é realmente um homem espontaneamente simpático e jovial. é um homem bastante bonito. e elegante. para além da sua popularidade parece que há quem esteja preocupado com os seus deslizes. aquelas "gaffes" que podem acontecer a qualquer ser humano. e acontece que Obama é antes de mais um ser humano. estávamos todos à espera que surgisse um super herói que salvasse não apenas os USA mas todo o mundo desta crise profunda em que fomos arrastados mas da qual não podemos alijar as nossas responsabilidades. é muito fácil dizer que os USA são os únicos culpados. se seguimos maus exemplos a culpa não é de quem os dá é nossa que tendo cabeça para pensar preferimos a preguiça e o facilitismo e seguir a cabeça de quem quer que seja... como a maria vai com as outras... a mim o que me preocupa após estes 100 dias não são os deslizes de Obama nem me ocupo com as gracinhas do cão Bo. os vestidos de Michelle também não me interessam nem me impressionam. o que me preocupa e impressiona é o crescimento diário das cidades de tendas nos USA. se este estado de coisas não melhorar como é que aquela gente vai sobreviver no inverno rigoroso dos USA? é este tipo de coisas que parece não preocupar os media. eu bem sei que todos temos o direito de nos distrair um pouco desta crise que nos aflige a todos. mas não vejo que a melhor solução seja começar a fingir que está tudo bem. porque não está. e não estará tão depressa quanto alguns nos querem fazer crer. isto não é ser pessimista. eu até sou uma pessoa bem optimista. mas de momento prefiro ser apenas realista.

O tempo não pára - Cazuza (clica aqui)

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

a vizinha reclama


17 anos de vida
Eu tô perdido
Do joelho até o umbigo
Tudo é perigo

Resolve logo
Ou transa ou sai de cima
Mas não me olha assim
Mas não me ri assim
Que eu piro

Arranjo emprego
Monto apartamento
Te levo em lua-de-mel
Pra onde você quiser

Só, brotinho, não me obrigue
A usar cinismo
17 anos de vida
Eu também tive
Ah eu tô perdido


(Cazuza)

viva Cazuza!


nascido em 1958 Cazuza seria um homem da minha idade se tivesse sobrevivido à AIDS. filho de classe média alta desde criança foi sempre excessivo. tudo para Cazuza era alegria e vida. viver era tão importante que Cazuza viveu tudo a que tinha direito. sexo droga e rock and roll como se dizia na altura em que crescemos. talentoso como poeta e como músico deixou apesar do pouco tempo que teve para viver um vasto reportório de alegria e belas canções. Caetano Veloso disse um dia num show seu no Canecão que Cazuza era o melhor poeta brasileiro do século XX. isto ajudou a lançar definitivamente a carreira de Cazuza. como amante de excessos nada lhe escapou. o amor para ele não tinha sexo. amou meninas e meninos homens e mulheres. os pais não conseguiram nunca "botar cabresto" naquele menino cara de anjo mau. quando lhe foi diagnosticada a AIDS Cazuza não queria acreditar. ele só queria viver cantar compor e embriagar-se de sexo álcool e drogas. sem excessos Cazuza não teria sido senão mais um entre os demais. marcar a diferença foi o que fez dele um original. o AZT não chegou para que Cazuza sobrevivesse aos 33 anos mas deixou que ele desse alguns shows e chamasse  a atenção do mundo para o AIDS. infelizmente muita gente menos excessiva e considerada mais responsável expõe-se todos os dias mais do que devia. infelizmente a igreja optou por condenar o uso do preservativo. infelizmente continuamos a assistir à morte de gente de todas as idades. infelizmente muita gente continua convencida que a AIDS está ligada aos homossexuais e aos toxicodependentes. todos os dias há gente que adopta comportamentos de risco como se se tratasse da coisa mais natural do mundo. a fundação criada pelos pais de Cazuza com o dinheiro dos direitos autorais do filho para ajudar gente com AIDS é importante. mas mais importante é a consciencialização de cada um de nós sobre os comportamentos de risco que assumimos como naturais. é que já não estamos nos anos 70 meus amigos. viva Cazuza!

28 abril, 2009

Faz parte do meu show - Cazuza (clica aqui)

Confundo as tuas coxas com as de outras moças
Te mostro toda a dor
Te faço um filho
Te dou outra vida pra te mostrar quem sou
Vago na lua deserta das pedras do Arpoador
Digo 'alô' ao inimigo
Encontro um abrigo no peito do meu traidor

A ausente


Amiga, infinitamente amiga
Em algum lugar teu coração bate por mim
Em algum lugar teus olhos se fecham à idéia dos meus.
Em algum lugar tuas mãos se crispam, teus seios
Se enchem de leite, tu desfaleces e caminhas
Como que cega ao meu encontro...
Amiga, última doçura
A tranqüilidade suavizou a minha pele
E os meus cabelos. Só meu ventre
Te espera, cheio de raízes e de sombras.
Vem, amiga
Minha nudez é absoluta
Meus olhos são espelhos para o teu desejo
E meu peito é tábua de suplícios
Vem. Meus músculos estão doces para os teus dentes
E áspera é minha barba. Vem mergulhar em mim
Como no mar, vem nadar em mim como no mar
Vem te afogar em mim, amiga minha
Em mim como no mar...

(Vinicius de Moraes)

apenas a verdade


Rachel é mulher mãe jornalista. ou Rachel é mãe mulher jornalista. ou ainda Rachel é jornalista mãe mulher. ou... a estória conta que Rachel como jornalista descobriu que o relatório de uma agente secreta da CIA foi ignorado e um atentado contra o presidente foi perpetrado. consegue que a revista em que trabalha permita que o publique. recusa-se a divulgar a sua fonte mas assegura que é a mais segura possível. o marido de Rachel é escritor e quando lê o que a mulher escreveu diz-lhe que ela ganhará o Pulitzer. quando lhe pergunta quem é a sua fonte Rachel responde também não me contas as tuas estórias antes que estejam prontas. horas depois de ter sido publicado o artigo Rachel é presa por se recusar a revelar o nome da sua fonte. e o que se pensa que será uma prisão de alguns dias transforma-se num calvário. o filho visita-a no primeiro dia mas ela pede ao marido que não o leve mais. afinal o menino tem apenas 7 anos e ela acha que não é bom para ele estar naquele ambiente. e depois pensa que rapidamente sairá. mas apesar de um bom advogado Rachel vê o seu processo arrastar-se tornou-se numa vitima de caça às bruxas. acaba por passar pelo "buraco" por levar uma sova de outra prisioneira e os media que ao princípio fizeram dela uma heroína rapidamente a esquecem. as 48 horas de celebridade passaram rapidamente, mas Rachel não cede a nenhuma das chantagens que lhe vão sendo sucessivamente feitas para que revele o nome da sua fonte. entretanto a agente da CIA  é assassinada com um tiro à queima roupa à porta de casa. o advogado conta-lhe que o marido arranjou uma namorada e ela está cada vez mais só. mesmo o filho a afasta por achar que ela o abandonou em nome de outras causas. quando finalmente sai em liberdade e segue no carro da sua editora são mandadas parar e é lido a Rachel um mandado de prisão por atentar contra a segurança do Estado. no autocarro que a leva para a prisão Rachel lembra a conversa com Allison a menina filha da agente secreta morta e colega do seu filho na escola. a menina foi involuntariamente a sua fonte. e ela não poderia nunca trair a sua inocência. a estória é baseada em factos reais e é contada no filme "nothing but the truth". e é uma estória porque são cada vez mais raros os casos de gente com ética e espinha vertebral.

27 abril, 2009

A Walk On The Wild Side - Lou Reed (clica aqui)

Little Joe never once gave it away
Everybody had to pay and pay
A hussle here and a hussle there
New York City's the place where they said, Hey babe
Take a walk on the wild side
I said, Hey Joe
Take a walk on the wild side

Que há para lá do sonhar?


Céu baixo, grosso, cinzento 
e uma luz vaga pelo ar 
chama-me ao gosto de estar 
reduzido ao fermento 
do que em mim a levedar 
é este estranho tormento 
de me estar tudo a contento, 
em todo o meu pensamento 
ser pensar a dormitar. 

Mas que há para lá do sonhar? 

(Vergílio Ferreira)

"inventem-se novos pais"?


a conversa veio à baila no Marília Gabriela entrevista. à sua frente estava um médico psiquiatra e um magistrado do ministério público brasileiro para falar de sexualidade incesto e pedofilia. Cohen o psiquiatra explicou muito bem todos estes comportamentos no século XXI. falou-se no caso da menina de 9 anos que abusada pelo pai e grávida abortou e da sua excomunhão bem como da mãe e da equipa médica que participaram do mesmo. o pai abusador foi o único que escapou à excomunhão. sei que me estou a repetir. já aqui falei deste assunto mas realmente a coisa é demasiado séria para que possa passar ao lado perante mais esta achega no programa de Marília. ambos os entrevistados estão de acordo. a igreja tem vindo a atrasar o progresso em pelo menos dois séculos. disse Cohen que a igreja tem o seu tempo. todos temos o nosso tempo. mas esta igreja é uma igreja completamente retardada. uma igreja que faz isto a uma menina de 9 anos abusada e grávida do próprio pai é uma igreja a excomungar. pronto. caiam-me em cima. à vontade. é o que eu penso. é o que digo. estou farta da hipocrisia dos senhores que fazem esta igreja. estou farta do tom cadenciado e lento das suas palavras. tudo em mim se revolta quando ouço falar desta barbaridade. para terminar e porque a igreja se atrasou 200 anos para reconhecer a teoria de Darwin (até foi bastante rápida em comparação com outros assuntos) Cohen lembra que é preciso repensar a família do século XXI que não tem nada a ver com o retrato da família tradicional. por mais volta que se dê o nosso mundo está a tornar-se num paraíso para as famílias monoparentais que nem se incomodam a fazer filhos. adoptam os que já aí  estão. no que fazem muito bem!

26 abril, 2009

One last chance - James Morrison (clica aqui)

Ive got one last chance to get myself together
I cant lose no more time its now or never and Ill
try to remember who i used to be
Ive got one last chance to get myself together



Chico


Talvez não fosses forte 
para a felicidade, 
nem para o medo. 

Olha as pessoas felizes: 
ocultam-se na felicidade 
como em casa, erguem 

muros, fecham as janelas, 
o medo 
é a sua fortaleza. 

O que disputam à morte 
é maior que elas, 
a morte não lhes basta. 

(Manuel António Pina)

a ultima oportunidade


Harvey é músico e trabalha em publicidade fazendo jingles publicitários. não é o que gostaria de fazer mas faltou-lhe o talento para ser pianista de jazz. divorciado da mulher prepara-se para ir a Londres assistir ao casamento da filha que aí vive bem como a ex mulher que voltou a casar e o futuro genro. Harvey está à beira de ser despedido. acham-no velho demais e pensam substituí-lo por alguém mais jovem e com outras ideias. quando lhe dizem que fique por Londres e goze o casamento da filha ele responde que segunda feira estará ao serviço. recusa-se a ouvir qualquer conversa que vá no sentido de ser despedido. no avião mete conversa com a passageira do lado uma mulher ainda jovem que lhe diz que precisa de dormir. Harvey é um homem só. um homem que não sabe como viver com a sua solidão. quando sai em Heathrow uma mulher aproxima-se para lhe fazer um inquérito ele responde que está demasiado cansado. em Londres dá por si num hotel que ele pensava estar ocupado por convidados para o casamento e pela filha. mas afinal todos estão hospedados em casa da ex mulher. só ele foi enviado para o hotel. o marido da ex mulher apoderou-se do papel de pai da sua filha e  esta acaba por lhe dizer que o convidou para a levar ao altar uma vez que tem estado muito mais próximo dela nos últimos anos que ele. Harvey desmorona. sorri à filha diz que compreende mas a verdade é que desmorona. decide partir para Nova York sem assistir ao casamento. um engarrafamento não lhe permite apanhar o avião que marcou e só no dia seguinte terá possibilidade de viajar. no bar vê a mulher dos inquéritos. está a ler. começa a conversar com ela e acompanha-a à aula de leitura. trata-se de Kate uma mulher solteira que vive preocupada com a mãe. quando ele diz o que se passou com o casamento da filha ela convence-o a ir ao casamento. ele diz que só vai se ela o acompanhar e acabam comprando um vestido para ela. na festa de casamento Harvey acaba por se reconciliar não apenas com a filha mas com toda a família. depois da festa já de madrugada combina com Kate encontrar-se com ela ao meio dia. ela espanta-se. afinal ele devia partir no dia seguinte mas ele diz que deve ficar. contactado pelo chefe em Nova York este diz-lhe que os miúdos não fizeram o que deviam e que o emprego afinal é dele. Harvey diz que é a sua última oportunidade e demite-se. no hotel os elevadores estão avariados mas ele está tão feliz que decide subir pelas escadas a correr. a sua arritmia dá sinal e ele acaba no hospital. Kate quando percebe que ele não virá fica triste mas pensa que é melhor assim. afinal o amor magoa sempre mais do que a solidão. quando sai do hospital Harvey procura-a e acaba por encontrar. é bem mais velho que ela mas afinal é a última oportunidade dos dois. ela está mais receosa que ele. afinal ela habituou-se a estar só. ele não foi capaz de se acostumar. mas decidem seguir juntos. daí há-de resultar o que quer que seja. nem que sejam apenas as lembranças de bons momentos (esta sou eu que digo). Dustin Hoffman e Emma Thompson fazem desta estória pouco original um filme que apetece ver. algo que roça a comédia romântica sem nunca deixar de ser uma estória sobre a solidão de todos nós.

25 abril, 2009

Venham Mais Cinco - José Afonso (clica aqui)

Venham mais cinco, duma assentada que eu pago já
Do branco ou tinto, se o velho estica eu fico por cá 
Se tem má pinta, dá-lhe um apito e põe-no a andar 
De espada à cinta, já crê que é rei d'aquém e além-mar
Não me obriguem a vir para a rua gritar
Que é já tempo d' embalar a trouxa e zarpar

Agora mesmo


Está gente a morrer agora mesmo em qualquer lado 
Está gente a morrer e nós também 

Está gente a despedir-se sem saber que para 
Sempre 
Este som já passou Este gesto também 
Ninguém se banha duas vezes no mesmo instante 
Tu próprio te despedes de ti próprio 
Não és o mesmo que escreveu o verso atrás 
Já estás diferente neste verso e vais com ele 

Os amantes agarram-se desesperadamente 
Eis como se beijam e mordem e por vezes choram 
Mais do que ninguém eles sabem que estão a 
                               [despedir-se 

A Terra gira e nós também A Terra morre e nós 
Também 
Não é possível parar o turbilhão 
Há um ciclone invisível em cada instante 
Os pássaros voam sobre a própria despedida 
As folhas vão-se e nós 
Também 
Não é vento É movimento fluir do tempo amor e morte 
Agora mesmo e para todo o sempre 
Amen 

(Manuel Alegre)

à espera da segunda parte


podia ter ficado em casa a ver as comemorações do 25 de Abril na TV. podia ter ido a uma das muitas festas organizadas por esse país fora. podia ter festejado de milhentas maneiras. acontece que na realidade não me parece que haja grande coisa para festejar. a liberdade não é pouca coisa. mas nestes 35 anos quantas vezes já tentaram retirar-nos o bem mais precioso que ganhámos com a revolução dos cravos? assim o meu dia seguiu mais ou menos como de costume. e se senti mais liberdade foi apenas porque estou de férias e posso fazer tudo o que tenho para fazer com calma. e posso até fazer coisas que não faço quando estou a trabalhar. a liberdade que senti hoje foi a de não ter horas para cumprir obrigações. foi a falta de pressão do dia a dia. acabei mesmo por festejar o 25 de Abril à minha maneira. vinha adiando foi hoje que vi o filme Che. que não me acrescentou nada de novo. uma ponta de desilusão pela tão parca intervenção de Rodrigo Santuoro que é um actor que eu amo. como filme nada de especial. como estória nada acrescenta ao já sabido. não percebo porque ninguém decide explorar a intervenção do Che noutros continentes. não percebo porque só se fala da luta na Sierra Maestra. gostei muito dos flashes em que aparece o próprio Che. foi do que gostei mais no filme. para ser franca e em relação ao mesmo homem interessou-me mais "os diários de Che Guevara". passado este Argentino fico à espera da segunda parte. pode ser que me entusiasme mais um pouco. assim como estou há mais de 30 anos à espera de segunda parte da revolução dos cravos.

24 abril, 2009

Traz outro amigo também - José Afonso (clica aqui)

Em terras 
Em todas as fronteiras 
Seja benvindo quem vier por bem 
Seja benvindo quem vier por bem 
Se alguém houver que não queira 
Trá-lo contigo também 
Se alguém houver que não queira 
Trá-lo contigo também 

Identidade


Preciso ser um outro 
para ser eu mesmo 

Sou grão de rocha 
Sou o vento que a desgasta 

Sou pólen sem insecto 

Sou areia sustentando 
o sexo das árvores 

Existo onde me desconheço 
aguardando pelo meu passado 
ansiando a esperança do futuro 

No mundo que combato morro 
no mundo por que luto nasço 

(Mia Couto)

a mulher de negro


quando vejo uma mulher realmente bela a primeira coisa que penso é será que ela tem a noção de ser realmente tão bela? cada vez mais raramente consigo ficar impressionada com a beleza. quero dizer. acho que as pessoas estão cada vez mais bonitas e então começa ser difícil encontrar alguém que me impressione verdadeiramente. hoje aconteceu. um dia calmo que me permitiu sair mais cedo do que usualmente do emprego e gozar aquela hora que antecede o início das horas de ponta. por isso encontrei caras diferentes das que costumo encontrar diariamente. a mulher que hoje me impressionou tanto estava sentada à espera que o comboio chegasse na estação. quando entrámos no comboio sentou-se de frente para mim. completamente vestida de negro o cabelo claro e os olhos azuis pareciam mais claros e mais azuis em contraste com o negro da roupa com um corte muito moderno. as unhas escarlate escuro contrastam com a pele muito branca e a roupa muito negra. um cabelo mais ou menos despenteado. a verdade é que tive que fazer algum esforço para deixar de olhar a mulher de negro. e admirei-me com a indiferença dos homens presentes na carruagem. parece que toda a gente anda demasiado preocupada  para sequer olhar para o lado. ou talvez me tenha dado para olhar porque estava maus descontraída do que o costume. afinal tenho pela frente a minha primeira semana de férias do ano. aquelas a que eu chamo as férias da primavera. esta estação que me devia deixar muito feliz e que me cansa um pouco... acho que é esta orgia de flores que me deixa os olhos cansados. e a alma também.

23 abril, 2009

So long, Marianne - Leonard Cohen (clica aqui)


Come over to the window, my little darling,
I'd like to try to read your palm.
I used to think I was some kind of Gypsy boy
before I let you take me home.

Idade


Conheci dias duradouros, 
o sol tão longo entre manhã e tarde. 
Um levantar súbito de luz 
por trás da crista das heras no muro velho, 
e depois descer no verão entre grades verdes 
e para além do portão como a cair no Hades, 
no inverno. Não havia tempo 
nos dias longos, mas a passagem diária 
do sol abençoado. 

Fiama Hasse Pais Brandão

à minha maneira


quando quiseste voltar era tarde demais. foi sempre o que mais nos distanciou. os tempos de cada um. eu impulsiva rápida a tomar decisões a dar passos rápidos e tu a ficares sempre para trás. por muito que eu atrasasse o meu passo tu não eras capaz de me acompanhar. mas não era isso que me incomodava. o que me incomodou sempre foi o facto de não fazeres um esforço para me acompanhares. por mais que eu atrasasse o passo tu não adiantavas o teu. nunca fizeste nada para me acompanhar. e foi por isso que te atrasaste de tal maneira que quando decidiste voltar eu me tinha habituado já a voar. no sentido literal da palavra. apanhava aviões para todo o lado. ao princípio era para fugir de ti de mim de nós de todos os lugares que tinha conhecido contigo. mas rapidamente comecei a gostar de viajar sozinha. de sentir que as minhas asas me podiam levar onde eu quisesse quando eu quisesse e ao ritmo que eu quisesse. comecei a sentir que era bom não me sentir obrigada a atrasar o passo. comecei a viver tudo o que não tinha conseguido viver até então. e quando tu percebeste isso começaste a levar-me ao aeroporto. por mais que eu dissesse não quero que te incomodes tu teimavas. levantavas-te de madrugada para me levares ao aeroporto. de caminho punhas as músicas que fizeram parte da nossa estória e eu falava de músicas novas de caminhos novos de amores novos. mas tu não te deixavas impressionar. na volta lá estavas tu à minha espera com ramos de rosas vermelhas nas mãos. só desististe quando me apaixonei por outro homem. aí disseste que eu estava a fazer uma burrada. tu sabias e eu sabia. mas naquele momento era o que eu tinha que fazer. era o passo que me faltava para perceber o quanto te tinha amado e o quanto amava agora a minha maneira de viver. mais livre do que nunca com um amor a mais de 100 km de distancia eu aspirava a liberdade como quem aspira a vida. e foi assim que percebamos que a melhor coisa para ambos seria sermos amigos. é isso que somos hoje. és o amigo com quem eu sei que posso contar em qualquer altura. espero que tu contes comigo da mesma maneira. e que sejas tão feliz como eu. à minha maneira. finalmente.

22 abril, 2009

Esquinas - Djavan (clica aqui)

Sabe lá o que é não ter e ter que ter pra dar
Sabe lá
E quem será
Nos arredores do amor
Que vai saber reparar

Qualquer coisa de paz


Qualquer coisa de paz. Talvez somente 
a maneira de a luz a concentrar 
no volume, que a deixa, inteira, assente 
na gravidade interior de estar. 

Qualquer coisa de paz. Ou, simplesmente, 
uma ausência de si, quase lunar, 
que iluminasse o peso. E a corrente 
de estar por dentro do peso a gravitar. 

Ou planalto de vento. Milenária 
semeadura de meditação 
expondo à intempérie a sua área 

de esquecimento. Aonde a solidão, 
a pesar sobre si, quase que arruína 
a luz da fronte onde a atenção domina. 

(Fernando Echevarría)

então descansei


deixei-te porque te amava demais. pediste a verdade aqui tens. tudo o resto é mentira. tudo o que inventei para que me deixasses seguir com o plano que tracei. e é muito simples. queres saber agora. digo-te. pretendo apenas viver. viver sem me sentir doente. viver respirando a plenos pulmões. viver viajando para os lugares que quero conhecer. ver os filmes que eu quero. ler os livros que desejo. estar com os meus amigos. recuperar tudo o que o amor excessivo que te dediquei ou aquilo que eu pensava ser amor mas não era. era qualquer coisa de muito excessiva. qualquer coisa que me roubava o sono e a fome. qualquer coisa que só me dava sede. uma sede imensa diante do mar. o meu plano é pois apenas viver. assim. sem excessos. tranquila. capaz de me amar a mim mesma mais do que a qualquer coisa no mundo. ou talvez não. de qualquer modo quando fui capaz de parar consegui perceber que o que sentia por ti se tornou numa enorme obsessão. numa eterna dependência. num jogo que eu perdia todos os dias. uma mágoa que foi crescendo dentro de mim. uma amargura que ao princípio eu trancava dentro de mim. mas depois não podia mais sufocar a dor. o nó na garganta. a vontade de gritar frente ao mar. a vontade de estar só enrolada sobre mim mesma. voltar a ser apenas eu. a ser apenas um feto. viver protegida num saco de água morna. durante algum tempo estive assim. imóvel. não ouvia não via não me mexia. deixava-me embalar pelo vai e vem da água em que mergulhara. depois emergi. pouco a pouco fui abrindo os olhos e dediquei-me a escutar de novo. pouco a pouco fui abrindo os meus sentidos para a vida. pouco a pouco voltei a viver. voltei a rir. descobri-me muito mais interessante do que pensava e descobri porque me tinhas amado tanto. então descansei.

21 abril, 2009

Vai Levando - Chico Buarque e Caetano Veloso (clica aqui)

Mesmo com todo o emblema, todo o problema
Todo o sistema, todo Ipanema
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando
A gente vai levando essa gema
Mesmo com o nada feito, com a sala escura
Com um nó no peito, com a cara dura
Não tem mais jeito, a gente não tem cura
Mesmo com o todavia, com todo dia
Com todo ia, todo não ia
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando
A gente vai levando essa guia


Não é para Contar uma Estória que tu Escreves


Não é para contar uma estória que tu escreves e eu pinto 
nem para nos apontarem a dedo que limamos 
o bico aos pregos no avesso do mundo, nem a terra 
é o centro deste. O universo não usa 
adereços de cena 
nem liga a espelhos. Tem mais que fazer 
que nos copiar e tão-pouco ao fado pois ele é 
velho, não tem dentes, e tresanda 
ao ranço de uma açorda 
salgada e sem coentros. 

(Júlio Pomar)
apesar de tudo o que me rodeia consigo viver a alegria de gostar de trabalhar. não apenas do que faço mas do modo como apesar de tudo o consigo fazer. graças a uma pessoa capaz de fazer do que quer que seja uma festa. I é assim. para ela tudo pode ser motivo de festa. e como agora não há nada para festejar oficialmente pois invente-se. daqui a dois dias faz um ano que mudámos de edifício. é verdade que não temos melhores instalações. mas nem por isso deixa de ser uma festa. por isso após um almoço que nos foi oferecido por uma colega que se reformou há pouco metemos mãos ao trabalho e vai de começar a decorar a sala onde faremos o nosso almoço de 1º aniversário. vela já temos. e mais alguma coisa ainda que não perfeita como se pode ver na foto. é isto que faz com que as pessoas dêem o que têm e o que não têm. e quem não percebe uma coisa tão simples quanto esta não percebe nada de motivação nem do mundo do trabalho. estávamos nós a dar o trabalho por terminado por hoje quando passou uma colega de outro edifício. infelizmente não pode dizer o mesmo que eu. à frente do serviço dela está uma pessoa nova por fora e velha por dentro. uma daquelas pessoas que dizem "as pessoas têm que ser tratadas assim". uma daquelas pessoas que chega rapidamente aonde quer não por ter conhecimentos do trabalho mas porque mais vale cair em graça do que ser engraçada. felizmente depois de um período de luto calhou-nos na rifa I. choca quem não a conhece mas para quem a conhece é uma alegria e um privilégio poder trabalhar com ela. até me esqueço que há crise fora daquelas paredes... e dentro também.

20 abril, 2009

- Sting (clica aqui)

 I don't drink coffee I take tea my dear
I like my toast done on one side
And you can hear it in my accent when I talk
I'm an Englishman in New York
See me walking down Fifth Avenue
A walking cane here at my side
I take it everywhere I walk
I'm an Englishman in New York

Tenho medo de perder a maravilha


Tenho medo de perder a maravilha 
de teus olhos de estátua e aquele acento 
que de noite me imprime em plena face 
de teu alento a solitária rosa. 

Tenho pena de ser nesta ribeira 
tronco sem ramos; e o que mais eu sinto 
é não ter a flor, polpa, ou argila 
para o gusano do meu sofrimento. 

Se és o tesouro meu que oculto tenho 
se és minha cruz e minha dor molhada, 
se de teu senhorio sou o cão, 

não me deixes perder o que ganhei 
e as águas decora de teu rio 
com as folhas do meu outono esquivo. 

Federico García Lorca

sobre a crise tenho dito


assim não vale. tenho andado a apregoar que esta crise há-d trazer algum benefício. servirá para mostrar às pessoas que é possível ser feliz sem um excesso de consumo. tenho também feito campanha por uma ambiente mais limpo. e tenho feito a minha parte. aliás faço a minha parte há muito tempo. ainda ninguém acreditava que haveria crise já a eu a cheirava à distância. assim que o preço dos combustíveis começou a mostrar  a sua escalada imparável era de prever que o fim não podia ser outro senão este enorme buraco que nós mesmos ajudámos a escavar. mas arrepio-me quando ouço as noticias. a saber. a taxa de juro nunca esteve tão baixa. mas os bancos não estão aí para ajudar ninguém senão a si mesmos. por isso toca a subir o spread para os novos empréstimos. as empresas queixam-se dos mesmos bancos que aproveitam a mãozinha do estado para meterem mais a sua mãozinha nos empréstimos ás pequenas e médias empresas. os gestores condenados a pagar individualmente multas usam dinheiro das empresas para o fazerem. empresas que têm condições para laborar decretam o lay off e despedem aproveitando a boleia da crise. assim não dá. ou realmente todos os governantes começam a agir de uma maneira sistemática contra os abusos (nos USA Obama já disse que as taxas cobradas pelos bancos têm que baixar) ou não vamos a lado nenhum. ou nos consciencializamos todos que é tempo de parar e voltar a viver a vida que os nossos pais viveram (eu estreava roupa no dia de anos e no Natal e os meus pais sempre viveram acima da média e não fui infeliz por isso apesar de ver os meus amigos zangarem-se com os pais para trem umas caças levi's ou lois). é uma questão de educação. aos filhos devemos dar o necessário e explicar que o supérfluo é mesmo isso e portanto tratar-se á de uma excepção à regra. vi amigas minhas abdicarem de coisas simples para proporcionarem aos filhos roupa e calçado de marca. fabricaram os consumidores de hoje. tornaram-se elas mesmo consumidoras vorazes. agora é tempo de parar e pensar ou se algum dia sairmos deste buraco será para nos metermos num ainda maior. tenho dito.

19 abril, 2009

Amado - Vanessa da Mata (clica aqui)

Como pode ser gostar de alguém
E esse tal alguém não ser seu
Fico desejando nós gastando o mar
Pôr-do-sol, postal, mais ninguém


Sinto absoluto o dom de existir,
Não há solidão, nem pena
Nessa doação, milagres do amor
Sinto uma extensão divina

Certeza


Se é real a luz branca 
desta lâmpada, real 
a mão que escreve, são reais 
os olhos que olham o escrito? 

Duma palavra à outra 
o que digo desvanece-se. 
Sei que estou vivo 
entre dois parênteses. 

(Octavio Paz)

estás contente?


se aqui há uns anos quando foi primeiro ministro alguém me dissesse que um dia haveria de concordar em alguma coisa com Cavaco diria que era impossível. acontece que comecei por ter alergia cutânea de cada vez que ouvia ou via o senhor. depois a coisa agravou-se e só o facto de ouvir o nome do homem me deixava cheia de borbulhas. por isso quando ele foi eleito PR eu pensei já estou tramada de novo. não tarda nada começo para aí a coçar-me ora esta a minha vida... pois é. uma das coisas que eu aprendi com a vida foi a não dizer desta água não beberei. porque estou de acordo com o homem nos recados que enviou para fora sobre a actuação do governo nesta crise. e quem não percebeu que eram dirigidos ao governo ficou a saber quando o José enfiou a carapuça até ao queixo. e não só o fez sem referir de quem eram os recados como adoptou a sua atitude de sempre quando não lhe interessa responder a perguntas. faz silêncio. e a verdade José é que eu já te tenho dito que não é bonito comportares-te assim. já te tenho dito mas tu não me dás ouvidos. e olha que devias porque se te dou avisos é porque sou tua amiga. eu sei que não parece mas sou. e é por isso que não votei em ti. é por ser tão amiga que não votarei em ti ou no teu partido. sabes que depois de te ouvir dizer que o maior inimigo que tens nestas eleições é a abstenção apeteceu-me até fazer uma coisa que nunca fiz e votar na dita cuja. mas afinal o meu amor por ti venceu e decidi que na abstenção decididamente não voto. estás contente?

18 abril, 2009

Tereza da Praia - Caetano e Roberto Carlos (clica aqui)

Então vamos
A Tereza
Na praia deixar
Aos beijos do sol
E abraços do mar
Tereza

É da praia
Não é de ninguém
Não pode ser tua
Nem minha também
Tereza
É da praia

Os justos


Um homem que cultiva o seu jardim, como queria Voltaire. 
O que agradece que na terra haja música. 
O que descobre com prazer uma etimologia. 
Dois empregados que num café do Sul jogam um silencioso xadrez. 
O ceramista que premedita uma cor e uma forma. 
O tipógrafo que compõe bem esta página, que talvez não lhe agrade. 
Uma mulher e um homem que lêem os tercetos finais de certo canto. 
O que acarinha um animal adormecido. 
O que justifica ou quer justificar um mal que lhe fizeram. 
O que agradece que na terra haja Stevenson. 
O que prefere que os outros tenham razão. 
Essas pessoas, que se ignoram, estão a salvar o mundo. 

Jorge Luis Borge

e viva a vida


ouço a estória deliciosa de um homem que vive há 20 anos numa gruta na serra da Arrábida. tem 73 anos e não explica porque foi ali parar. diz apenas que não tem família mas que ali tem tudo o que precisa. e o que precisa não inclui água canalizada e luz. o espaço está atafulhado com caixotes e uma série de coisas que vai apanhando como desperdício. é por isso que tem um frigorífico que lhe serve de despensa. ali guarda a massa o arroz... tudo bem arrumado como ele mesmo diz. carne e peixe também tem. salga-os para não se estragarem. não troca a gruta por uma casa e se alguém o quiser tirar dali vai ter de lhe pagar muito bem. é o que afirma. não lhe falta nada diz. vive da pensão que não menciona para que morada é enviada. pensando bem o mais provável é que seja depositada num banco. afinal o homem existe. a cama é um travesseiro comprido de carneira. diz que dorme bem. provavelmente melhor que a a maioria dos portugueses que têm uma casa água luz telefone internet e uma porrada de contas para pagar ao fim do mês... isto digo eu. tem mais que muitos dos "malteses" que por aí andam. isto é ele que diz. não sei bem quem são os malteses. não creio que se refira por exemplo aos sem abrigo ou aos ciganos. o que sei no fim de toda esta estória é que está provado que cada um é feliz à sua maneira. este homem não quer mais nada da vida. tem o que precisa. ninguém para lhe chatear a cabeça. isto não sei já se foi ele ou se sou eu que digo. ou se repito. sei que é uma coisa muito boa não ter ninguém a chatear-nos a cabeça. de qualquer modo posso garantir que este homem não saberá nunca o que é a crise. nem a económica que vivemos nem a ambiental que nos espera. e também sei que devia ganhar um prémio por ser amigo do ambiente. apesar de não ter parado de fumar durante todo o tempo em que esteve debaixo do olho da câmara. o que me encanta não é o facto de um homem viver numa gruta. há vários casos conhecidos. um deles aqui mesmo no concelho em que vivo. o que me encanta é que há alguém que não se chora porque vive numa gruta. e é ali que é feliz. e viva a vida.

17 abril, 2009

Feeling Good - Michael Buble (clica aqui)

Stars when you shine
You know how I feel
Scent of the pine
You know how I feel
Oh freedom is mine
And I know how I feelIt´s a new dawn
It´s a new day
It´s a new life
For me

O amor é o amor


O amor é o amor — e depois?!
Vamos ficar os dois
a imaginar, a imaginar?...

O meu peito contra o teu peito,
cortando o mar, cortando o ar.
Num leito
há todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor
e trocamos — somos um? somos dois?
espírito e calor!

O amor é o amor — e depois?

(Alexandre O'Neill)

soy contra!


o plenário estava marcado há dias. já me tinha esquecido de como era estar num plenário com tantos trabalhadores e sobretudo com gente jovem interessada em participar activamente em dar o corpo ao manifesto. pensava que a chama se tinha extinguido de vez mas afinal estava enganada. parece que ainda há gente que se interessa pelos seus interesses enquanto trabalhadores. ainda há gente disposta a lutar por si e pelos outros. eu que já apostava que não havia direita nem esquerda havia apenas CEE começo a repensar a minha posição e a pensar que afinal as diferenças existem mesmo e quem sabe um dia destes o anarquismo ressurge em todo o seu esplendor e passamos a dispensar governos porque seremos capazes de tomar conta de nós. imaginem o mundo em que as pessoas não estão à espera que o estado cuide de si. um mundo em que todos se respeitem. um mundo aonde o dinheiro não é necessário. voltar a viver de trocas. estou a lembrar-me do professor Agostinho da Silva e com certeza quem o conheceu também. tenho saudades do tempo em que o ouvia. tenho saudades do professor. conhecê-lo foi um privilégio mesmo quando não sabia quem ele era. apenas um velhote simpático e capaz de me fazer esquecer do tempo para ficar à conversa. capaz de me fazer esquecer que tinha sido deixada ali plantada e agradecida por isso ter acontecido. mas aonde é que eu já vou? esta estória já contei. estava pois no plenário e vejo uma jovem colega fazer-me sinal para me candidatar a delegada sindical. sorri e abanei com a cabeça. a jovem que me conhece de posições mais duras não sabe com certeza que eu não sou sindicalizada nem nunca fui. como também não sabe que todo e qualquer lugar que envolva politiquice não está na minha natureza. essa não é a minha forma de estar na vida. mas darei toda a força aquelas(es) que aceitaram o desafio. porque são jovens e acreditam. porque afinal parece que o 25 de Abril não está ainda completamente perdido. hay gobierno? soy contra!

16 abril, 2009

The Boy From Ipanema - Diana Krall (clica aqui)

When he walks
He's like a samba
That swings so cool and sways so gentle
That when he passes each girl
He passes goes - ah Ooh,
but I watch him so sadly
How can I tell him I love him

O chão é cama para o amor urgente


O chão é cama para o amor urgente,
amor que não espera ir para a cama.
Sobre tapete ou duro piso,
a gente compõe de corpo e corpo a húmida trama.

E para repousar do amor, vamos à cama.

(Carlos Drummond de Andrade)