30 abril, 2010

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os chicólatraschicolatras "Meu sorriso é uma fenda escavada no chão"

Circo de feras - Xutos e Pontapés


A vida vai torta
Jamais se indireita
O azar persegue
Esconde-se á espreita

Nunca dei um passo
Que fosse o correcto
Eu nunca fiz nada
Que batesse certo

sobre o caminho


Nada
nem o branco fogo do trigo
nem as agulhas cravadas na pupila dos pássaros
te dirão a palavra

Não interrogues não perguntes
entre a razão e a turbulência da neve
não há diferença

Não colecciones dejectos o teu destino és tu

Despe-te
não há outro caminho

(Eugénio de Andrade)

teenagers de 40

não há coincidências mas às vezes há coisas que coincidem. depois de uma conversa que mais parecia uma discussão com alguém que tem horror à velhice chego a casa e vejo na globo uma entrevista com o actor antónio fagundes tido pela maior parte das mulheres como um sex simbol. para mim é sobretudo um grande actor e um homem com h. não porque é macho como dirão alguns dos nossos bons latinos mas porque faz parte do grupo cada vez mais restrito de gente sensata que encara a vida como uma linha que segue como um rio mais ou menos agitado com bons e maus momentos com escolhas melhores que outras com ou sem arrependimentos o que conta mesmo é que saibamos aprender com os nossos fracassos. antónio tal como eu pensa que a velhice não é coisa que se esconda. bem podem as mulheres fazer plásticas aumentar os seios ou pôr botox porque ou levam o resto da vida a fazer plásticas e ficam tão esticadinhas que até dão vómitos ou depois de gastos todos os anéis optam por ficar ou não com os dedos. mais cedo ou mais tarde envelhecem tão de repente que ficarão irreconhecíveis ao espelho e o mais certo será morrerem de uma qualquer doença provocada pelas plásticas e ainda por cima com uma depressão do tamanho do tgv.tenho pena destas mulheres. tenho pena das mulheres e dos homens incapazes de aceitar a velhice como mais uma etapa da vida. tenho pena das pessoas que não aceitam os cabelos brancos a queda do cabelo ou as rugas.tenho pena da mulher com quem quase discuti hoje. tenho pena sobretudo porque fazendo parte do grupo de pessoas que se dizem capazes de dizer tudo na cara não é capaz de ter comigo uma conversa sem entrelinhas. tenho pena desta gente. porque seria muito mais fácil aceitarem o que a vida nos dá do que andarem à procura do segredo da eterna juventude. são tão jovens aos 40 que ainda não conseguiram aprender nada com a vida. lamento.

27 abril, 2010

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os chicólatraschicolatras "Eu, que não digo; Mas ardo de desejo; Te olho; Te guardo; Te sigo; Te vejo dormir"

Debaixo d'água/Agora - Maria Betania (clica aqui)

Debaixo dágua protegido salvo fora de perigo
aliviado sem perdão e sem pecado
sem fome sem frio sem medo sem vontade de voltar

Mas tinha que respirar

Debaixo dágua tudo era mais bonito
mais azul mais colorido
só faltava respirar

Agora sinto um gosto doce
Agora vejo a cor azul
Agora a mão de quem me trouxe
Agora é só meu corpo nu


Poeminha da negação da afirmação


Sou um homem bem comum
sem nenhuma aspiração.
Não quero ser general
e muito menos sultão.
Sou moderado de gastos,
de ambição reduzida,
não sonho ser big-shot
estou contente da vida.
Nunca invejei o próximo
nem lhe cobiço a mulher,
pego o meu lugar na fila
e seja o que Deus quiser.
Não sou mau pai, nem mau esposo,
Grosseiro nem invejoso
- só um pouco mentiroso.

(Millôr Fernandes)

obrigada amiga

o dia anunciava-se complicado. e se para alguns parece que a greve de transportes não existiu para mim existiu sim. e não fosse a minha chefe insistir em trazer-me a casa não sei quando chegaria. a verdade é que teria resolvido o meu problema sem qualquer dificuldade. a primeira hipótese seria ficar por lisboa comer alguma coisa ir ao teatro e apanhar um comboio depois da meia noite quando a greve tivesse terminado. a segunda esperar na estação do cais do sodré que algum comboio partisse. esta deixou de fazer sentido quando o radio começou a noticiar o fecho das estações do cais do sodré oeiras e cascais. portanto tive que arranjar uma terceira hipótese. afinal a mais simples de todas. ir de eléctrico até algés e depois a pé até oeiras. creio que serão mais ou menos dez quilómetros. sei que os faria com facilidade pois estou habituada a caminhar mas é verdade que debaixo de um sol escaldante talvez fosse menos fácil. acabei por aceitar a oferta da minha chefe que nem sequer mora perto de mim e por isso teve que alterar os seus planos não só porque sei que o fez de coração como sei que ficaria preocupada se não o fizesse. assim acabei por chegar a casa mais cedo que o costume. e ainda por cima consegui torcer um joelho ao andar de bicicleta o que me está a incomodar um pouco. espero estar bem amanhã. mais uma vez a minha fé na humanidade foi concretizada. e ainda por cima fiquei a conhecer uma lisboa que não me passava pela cabeça. nada como ser conduzida por alguém que nasceu e cresceu por ali. mais uma vez ficou-me a sensação de que não passo de uma saloia em lisboa. obrigada amiga.

26 abril, 2010

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os chicólatraschicolatras "Quem sou eu para falar de amor; Se o amor me consumiu até a espinha"

Seu Olhar - Seu Jorge (clica aqui)

Tem muito tempo na estrada
Muito tem
E como quem não quer nada
Você vem
Depois da onda pesada
A onda zen
É namorar na almofada
E dormir bem

quero saber


Quero saber se vens comigo
a não andar e não falar,
quero saber se ao fim alcançaremos
a incomunicação; por fim
ir com alguém a ver o ar puro,
a luz listrada do mar de cada dia
ou um objeto terrestre
e não ter nada que trocar
por fim, não introduzir mercadorias
como o faziam os colonizadores
trocando baralhinhos por silêncio.
Pago eu aqui por teu silêncio.
De acordo, eu te dou o meu
com uma condição: não nos compreender

(Pablo Neruda)

é bem feito


um mês a chegar ao fim com mais contestações. parece que ninguém liga nenhuma. é verdade que há greves e greves. quer dizer as consequências práticas são diferentes. sem dúvida uma greve geral dos transportes é algo que afecta a vida de muita gente e consequentemente de todos os sectores públicos ou privados. hoje por exemplo consegui chegar ao meu local de trabalho à hora de sempre. se calhar isto só aconteceu porque eu não fazia a mínima ideia de que havia esta greve. pensando melhor acho que alguém me disse mas não prestei atenção ou simplesmente não lhe dei qualquer importância. seja como for senti sobretudo à hora a que voltei para casa que muita gente teve problemas pois a uma hora em que os transportes andam já bastante "compostos" hoje havia menos gente até mesmo que a um fim de semana de inverno chuvoso. e amanhã é claro que as coisas vão piorar. afinal se hoje a greve foi apenas até às dez da manhã amanhã será o dia inteiro. pergunto se o prejuízo destes dias de greve de vinte mil trabalhadores não será superior ao que o estado gastaria a satisfazer um mínimo das reivindicações e dir-me-ão que o governo não pode abrir precedentes. pois é. só que já se abriram muitos precedentes e sem dúvida esta greve não afecta apenas as empresas a que pertencem os grevistas. afecta toda uma cidade as suas empresas e os seus serviços. mas lá que é bem feito lá isso é.

25 abril, 2010

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os chicólatraschicolatras "Tua beleza é quase um crime; Tu és a bunda mais sublime; Aqui deste covil"

João Afonso - Aqui em baixo (clica aqui)

Aqui em baixo é tudo azul
a lua veste de azul
anémonas são nossas caricaturas
E se a morte for azul
E dormir no fundo mar
onde os sonos nos confiam as lembranças.

Aqui em baixo é tudo azul
o arco-íris é azul
e é azul a chuva quando molha

Original é o poeta


Original é o poeta
que se origina a si mesmo
que numa sílaba é seta
noutro pasmo ou cataclismo
o que se atira ao poema
como se fosse um abismo
e faz um filho ás palavras
na cama do romantismo.
Original é o poeta
capaz de escrever um sismo.

Original é o poeta
de origem clara e comum
que sendo de toda a parte
não é de lugar algum.
O que gera a própria arte
na força de ser só um
por todos a quem a sorte faz
devorar um jejum.
Original é o poeta
que de todos for só um.

Original é o poeta
expulso do paraíso
por saber compreender
o que é o choro e o riso;
aquele que desce á rua
bebe copos quebra nozes
e ferra em quem tem juízo
versos brancos e ferozes.
Original é o poeta
que é gato de sete vozes.

Original é o poeta
que chegar ao despudor
de escrever todos os dias
como se fizesse amor.
Esse que despe a poesia
como se fosse uma mulher
e nela emprenha a alegria
de ser um homem qualquer.

(Ary dos Santos)

faltam-me. vocês.


quis escrever-te ontem mas o desânimo não deixou. como eu queria que aqui estivesses para me confortares um pouco. eu sei. as tuas filhas não me deixam só mas eu tenho saudades das anedotas que contavas... até das tuas imensas neuras tenho saudades sabes? mas hoje que é dia 25 de abril lembro-me bem das entradas triunfais que adoravas fazer de cravo vermelho na lapela. como tu gostavas de o mostrar... e sabes? eu sempre achei que tu fazias aquilo para chatear a mãe. e sabes que mais? hoje ela não ligou nenhuma como se fosse um dia que desconhecesse. e a verdade é que desconhece porque voltou aos seus tempos de menina. só quando me olha volta um pouco ao presente e diz a quem a provoca tu precisavas era de ter uma filha como eu. e fui com ela para comprar uns chinelos e quis que ela aproveitasse a paisagem mas está de novo tão alheia a nossa mãe. hoje não estou mais animada que ontem mana. só que o dia nasceu quente e solarengo e eu saí de casa logo de manhã e fui caminhar à beira mar e apesar da quantidade de gente continuava a andar e só pensava nela e só queria adivinhar o futuro e tentar saber como vou conseguir resistir assim tão só. assim. sem ti. sem o pai. o zé como se não estivesse. uma criança que se recusa a admitir verdadeiramente que a mãe está doente. muito doente. a única coisa que me deixa um pouco confortada é perceber que ela continua tão vaidosa como sempre. como tu. e rala-se porque eu ando de qualquer maneira e quer que eu vá ao cabeleireiro e me maquilhe mas eu vou brincando. afinal parecida com ela eras tu. e fazes-me falta. eu sempre fui mais parecida com pai. que me faz tanta falta. faltam-me. vocês.

23 abril, 2010

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os chicólatraschicolatras "Quem sou eu para falar de amor; Se de tanto me entregar nunca fui minha"

Shape Of My Heart - Sting (clica aqui)

I know that the spades are the swords of a soldier
I know that the clubs are weapons of war
I know that diamonds mean money for this art
But that's not the shape of my heart

He may play the jack of diamonds
He may lay the queen of spades
He may conceal a king in his hand
While the memory of it fades

sofro de não te ver


Sofro
de não te ver,
de perder
os teus gestos
leves, lestos,
a tua fala
que o sorriso embala,
a tua alma
límpida, tão calma...

Sofro
de te perder,
durante dias que parecem meses,
durante meses que parecem anos...

Quem vem regar o meu jardim de enganos,
tratar das árvores de tenrinhos ramos?

(Saúl Dias)

graças a d. quixote. de lisboa


ouço o médico dizer-me vá descansada está tudo bem consigo e percebo que afinal talvez eu estivesse mesmo preocupada mas não tivesse tempo para me preocupar com isso. ouvi-lo dizer vá descansada afinal deixou-me feliz. nunca precisei de muito para ser feliz. parece que continuo igual a mim mesma. de regresso a casa descubro-me sentada ao lado de d. quixote. não sei se é de lisboa este d. quixote. talvez seja um turista uma vez que a única coisa que transporta é uma câmara. mas há tanta gente que gosta de fotografia quem sabe este meu d. quixote com ar de quem tem mais de setenta anos mas se veste como se tivesse trinta calça ténis veste calças de sarja castanhas usa o cabelo grisalho tal como o herói de cervantes e a mesma barba também. embora não seja tão magro como o meu herói... afinal hoje o herói de cervantes talvez não fosse anoréctico. na cabeça um belo chapéu. sai uma estação antes de mim mas viajámos juntos por mais de dez minutos. é verdade que não trocámos uma palavra. é verdade que ele nem deu por mim. é verdade que jamais voltarei a vê-lo mas durante dez minutos eu viajei com d. quixote do século vinte e um é certo mas afinal nada é perfeito. talvez por isso no comboio olhando o rio e sabendo que vou entrar numa casa onde apenas estou eu pesa-me como poucas vezes a solidão. mas já passou. graças ao d. quixote. de lisboa.

22 abril, 2010

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os chicólatraschicolatras
"Quero lançar; Um grito desumano; Que é uma maneira; De ser escutado"

Everybody knows - Leonard Cohen (clica aqui)


Everybody knows that you love me baby
Everybody knows that you really do
Everybody knows that you've been faithful
Ah give or take a night or two
Everybody knows you've been discreet
But there were so many people you just had to meet
Without your clothes
And everybody knows

Sonho. Não sei quem sou.


Sonho. Não sei quem sou neste momento.
Durmo sentindo-me. Na hora calma
Meu pensamento esquece o pensamento,
Minha alma não tem alma.

Se existo é um erro eu o saber. Se acordo
Parece que erro. Sinto que não sei.
Nada quero nem tenho nem recordo.
Não tenho ser nem lei.

Lapso da consciência entre ilusões,
Fantasmas me limitam e me contêm.
Dorme insciente de alheios corações,
Coração de ninguém.

(Fernando Pessoa)

um olhar inesquecível

eu sei que tenho falhado mas as razões não são de somenos. a verdade é que muitas vezes na vida temos que optar e primeiro vem a dedicação e depois a devoção. não sei se é asim já não me lembro ouvi qualquer coisa como esta frase a um colega nos açores mas a verdade é que hoje já nem sei muito bem quem o dizia mas sim quase tenho a certeza que era o aguinaldo mas como diz a outra isso agora já não interessa nada. estou de volta e desta vez espero que assiduamente de preferência diariamente que é como eu gosto. do que não gostei foi de ser acordada esta madrugada por alguém que decidiu acordar-me para ficar calado(a) do lado de lá. não foi bem assim mas não vale a pena dizer tudo a verdade é que há coisas que é preferível calar para que depressa abandonem as nossas vidas. eu é assim que faço. é apenas um truque mas costuma resultar. e foi assim que saí cedo de casa o coração ainda desassossegado pela brincadeira de mau gosto pior ainda se foi feita por alguém que me conhece pois na situação em que me encontro é indiscutível que um telefonema fora de horas me estragou o resto da noite e também parte do resto de dia. no metro um rapaz de mais ou menos 17 anos com uns olhos enormes e um jeito feminino de se mover senta-se e fixa os olhos em mim. aguentei o olhar o mais que pude mas houve qualquer coisa naquele olhar que me obrigou a cerrar as pálpebras. felizmente o rapaz desceu o olhar para os meus pés e logo a seguir levantou-se e saiu. o tempo de uma estação de metro. o suficiente para reconhecer aqueles olhos em qualquer sítio. e depois ainda antes de chegar ao meu local de trabalho um rapaz na estação do campo grande do lado de lá da linha tirava fotografias. pensei que provavelmente estaria a fotografar ratos que por ali abundam e que muitas vezes tive o desejo de fazer. apareceu um segurança teve uma conversa com ele mas começou por tapar com a mão a câmara. o rapaz pegou na máquina meteu-a na mochila e foi-se. eu voltei ao meu tempo.

09 abril, 2010

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os chicólatraschicolatras "Sim; Pode vir uma enxurrada e carregar tudo o que eu tinha; Sim; Posso até gostar; Deixa eu sair sozinha"

Pra Declarar Minha Saudade - Maria Rita (clica aqui)

Pra decalrar minha saudade
Usei sinceridade que
Me dá certeza que você
Quando ouvir
O meu cantar,
Vai se lembrar que deixou
Do lado esquerdo do meu peito essa dor
Que tá difícil de curar

A praça


A praça da Figueira de manhã,
Quando o dia é de sol (como acontece
Sempre em Lisboa), nunca em mim esquece,
Embora seja uma memória vã.

Há tanta coisa mais interessante
Que aquele lugar lógico e plebeu,
Mas amo aquilo, mesmo aqui ... Sei eu
Por que o amo? Não importa. Adiante ...

Isto de sensações só vale a pena
Se a gente se não põe a olhar para elas.
Nenhuma delas em mim serena...

De resto, nada em mim é certo e está
De acordo comigo próprio. As horas belas
São as dos outros ou as que não há.

(Álvaro de Campos)

está a começar

deixo a bicicleta no estacionamento o mais rapidamente possível. tenho o cuidado de verificar se está bem presa e sigo em passo acelerado para o comboio. tenho dois minutos e há que passar nas portas automáticas que parecem sempre ter o sinal verde no lado errado. mesmo assim acelero o passo e apanho o comboio à tangente. quero chegar cedo ao emprego porque é quando consigo desenvolver mais trabalho. tudo em sossego nada de perguntas nada de telefones. consigo um lugar sentada e a rapariga que está sentada ao meu lado tem os pés pousados no banco frente ao meu. é algo que me irrita muito. a falta de civismo. será que as pessoas que fazem isto não pensam que também elas se sentam em sítios onde alguém já pôs os pés? adiante. uma senhora chega para se sentar e a rapariga tira os pés do banco contrariada. olho para a senhora à minha frente por cima dos óculos a tentar perceber alguma reacção. a rapariga tirou os pés do banco mas manteve a perna esticada naquele sentido. a senhora com muita calma diz-lhe não se importa de tirar o pé da minha perna? é que francamente hoje não me apetece nada. acho esta calma com um certo humor fantástica. a rapariga responde que não lhe está a tocar. a senhora repete desculpe mas se não se importa não me apetece mesmo levar com o seu pé. finalmente a rapariga coloca as pernas direitas como devia ter feito de início. são estas pequenas coisas que vão preenchendo os meus vazios entre leituras e a espera do verão. que parece estar a começar.

08 abril, 2010

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Ondjakiondjaki o poeta / viu o seu poema inundado / e soube / que estava no rio de janeiro...

O Ritmo da Chuva - Fernanda Takai e Rodrigo Amarante (clica aqui)


Chuva traga o meu benzinho
Pois preciso de carinho
Diga a ela pra não me deixar triste assim...
O ritmo dos pingos ao cair no chão
Só me deixa relembrar
Tomara que eu não fique a esperar em vão
Por ela que me faz chorar

Uma certa quantidade de gente


Uma certa quantidade de gente à procura
de gente à procura duma certa quantidade

Soma:
uma paisagem extremamente à procura
o problema da luz (adrede ligado ao problema da vergonha)
e o problema do quarto-atelier-avião

Entretanto
e justamente quando
já não eram precisos
apareceram os poetas à procura
e a querer multiplicar tudo por dez
má raça que eles têm
ou muito inteligentes ou muito estúpidos
pois uma e outra coisa eles são
Jesus Aristóteles Platão
abrem o mapa:
dói aqui
dói acolá

E resulta que também estes andavam à procura
duma certa quantidade de gente
que saía à procura mas por outras bandas
bandas que por seu turno também procuravam imenso
um jeito certo de andar à procura deles
visto todos buscarem quem andasse
incautamente por ali a procurar

Que susto se de repente alguém a sério encontrasse
que certo se esse alguém fosse um adolescente
como se é uma nuvem um atelier um astro

(Mário Cesariny)

comme il faut

enquanto na tv vai dando aquilo que quase todos os portugueses estão vendo (futebol claro) que lhes faz bem tão bem quanto uma religião. o pessoal precisa de distracção. precisa de extravasar os desgostos o dia a dia chato e pequenino (não pequenino por tamanho mas pelo pouco que se lhe liga) e depois hoje nem é preciso ter um canal por cabo para ver o liverpool vs benfica que eu não sei a quantas anda porque estou a assistir à globo que sempre me vai dando séries de comédia de fazer inveja aos melhores. há coisas que são como são. para quem sabe e o resto são cantigas. e por falar em cantigas hoje assisti a uma cena bem engraçada. no comboio da nha de cascais seguiam vários rapazes ingleses. não deviam ter vindo ver futebol porque tinham um ara quase taõ bem comportado como os helderes. só não usavam a mesma farda. estavam de calças de ganga e t-shirt e espalhavam-se por dois bancos da carruagem. eu ia de olhos fechados querendo descansar um pouco de um dia de trabalho duro e sabendo que o dia não tinha ainda terminado. tentando enfim passar pelas brasas quando entrou um homem velho na carruagem vendendo carteiras para o passa a um euro. é claro que já toda a gente tem aquilo e o homem por ali vendo que naõ se governava dirigiu-se ao grupo de britânicos e num inglês impecável lá tentou vender a sua mercadoria. argumentou até que também servia para os títulos de transporte no reino unido. não teve sorte. mas pelo menos os meninos ficaram a saber que por cá até os pobres falam inglês. comme il faut.

05 abril, 2010

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Ondjakiondjaki [o homem passou pelo bar, na entrada do famoso Bairro Operário, pediu algo 'quente'. 'Alguém sabe onde posso encontrar a Ceguinha?'...]

Redondo Vocábulo - João Afonso Afonso - (clica aqui)

Era um redondo vocábulo
Uma soma agreste
Revelavam-se ondas
Em maninhos dedos
Polpas seus cabelos
Resíduos de lar,
Pelos degraus de Laura

Não é para contar uma estória que tu escreves


Não é para contar uma estória que tu escreves
e eu pinto
nem para nos apontarem a dedo que limamos
o bico aos pregos no avesso do mundo, nem a terra
é o centro deste. O universo não usa
adereços de cena
nem liga a espelhos. Tem mais que fazer
que nos copiar e tão-pouco ao fado pois ele é
velho, não tem dentes, e tresanda
ao ranço de uma açorda
salgada e sem coentros.

(Júlio Pomar)

todos precisamos de ser amados

dia de sol. céu limpo e até algum calor apesar do vento. chego ao centro de recuperação e vejo a alegria da minha mãe. deu-me o melhor presente que eu podia receber. no sábado levei-lhe o livro do manuel alegre cão como nós. por ser bom pequeno e com letras grandes. hoje já o tinha lido. depois de ter passado anos a pedir-lhe que voltasse a ler porque sei que era uma coisa boa para a doença dela ela recusava-se. aliás fazia gala de recusar qualquer sugestão de familiares ou de amigos. hoje levei-lhe o um luís sepúlveda o velho que lia romances de amor e estou quase certa que no próximo fim de semana já o terá lido. entretanto para completar a minha alegria a mané aproximou-se de mim pegou na minha mão e pensei que queria que a levasse a passear a algum sítio. afinal queria apenas que eu lhe fizesse festas na cabeça e na cara. fantástica manerira de comunicar desta mulher autista que escolhe os amigos. ela sabe distinguir quem tem medo dela e quem gosta dela. foi pois um dia muito bem empregue porque um dia feliz é sempre algo que nos faz falta. afinal já uma vez aqui o disse todos precisamos de ser amados. e a mané também.

04 abril, 2010

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os chicólatraschicolatras "Mas depois de um ano eu não vindo; Ponha a roupa de domingo e pode me esquecer"

Haven't meet you - Michael Bublé (clica aqui)

I just haven't met you yet
Oh promise you kid
To give so much more than I get

I said love love, love, love, love, love, love,
I just haven't met you yet
Love, love, love,
I just haven't met you yet

A minha alma partiu-se


A minha alma partiu-se como um vaso vazio.
Caiu pela escada excessivamente abaixo.
Caiu das mãos da criada descuidada.
Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso.

Asneira? Impossível? Sei lá!
Tenho mais sensações do que tinha quando me sentia eu.
Sou um espalhamento de cacos sobre um capacho por sacudir.

Fiz barulho na queda como um vaso que se partia.
Os deuses que há debruçam-se do parapeito da escada.
E fitam os cacos que a criada deles fez de mim.

Não se zanguem com ela.
São tolerantes com ela.
O que era eu um vaso vazio?

Olham os cacos absurdamente conscientes,
Mas conscientes de si mesmos, não conscientes deles.

Olham e sorriem.
Sorriem tolerantes à criada involuntária.

Alastra a grande escadaria atapetada de estrelas.
Um caco brilha, virado do exterior lustroso, entre os astros.
A minha obra? A minha alma principal? A minha vida?
Um caco.
E os deuses olham-o especialmente, pois não sabem por que ficou ali.

(Álvaro de Campos)