Gostava sobretudo dos domingos de manhã quando pegavas em mim e no Zé e nos levavas a ver museus ou simplesmente a passear. Eram os dias mais felizes da minha vida e eu não sabia, porque aos 7 anos não se sabe quase nada, ou sabe-se apenas tudo o que é preciso ou seja aquilo que se aprende no jardim de infância que eu que não frequentei e aprendi contigo, pai.
Nesses dias íamos apenas os 3. Porque aos domingos à tarde quando saíamos com a mãe tu gostavas de a chatear e pedir-nos em voz alta que na rua te chamássemos primo. É claro que o ciúme dela começava a exacerbar-se e tu justificavas, que era verdade, uma vez que tu e ela eram primos, nós também éramos vossos primos e primos entre nós. Era uma das brincadeiras que tu gostavas de ter. Saí a ti, até nisso. Gosto de chatear, de moer, e não posso apanhar o ponto fraco de alguém porque não terá mais um bocado de paz na minha presença.
Há quem chame as crianças de muitas coisas. O EGV por exemplo chama-lhes jacarés. Nunca lhe perguntei porquê. Tu chamavas os filhos e os netos de macacos. Às vezes eu era um sagui. E um dia quando levei a Sandra a ver uma peça de teatro infantil, ali no Martim Moniz, um senhor que estava com a filha disse-me que a minha filha era muito parecida comigo. Eu respondi que era apenas minha sobrinha e ele então virou-se para ela e disse és uma menina muito bonita. A Sandra respondeu imediatamente, não sou uma menina sou uma macaca. Risada geral, claro.
Também nos mandavas lavar os talheres antes de nos sentarmos à mesa. Por isso quando na 1ª classe a professora estava a dar uma lição sobre higiene eu levantei-me e expliquei muito compenetrada que o meu pai nos obrigava sempre a lavar os talheres antes de comer. Ela achou tanta graça que esperou pela minha mãe para lhe contar.
Amanhã faz 9 anos que partiste. Nunca mais nada foi igual. Nunca mais fui verdadeiramente feliz. A saudade de ti é muito grande e sinto a tua falta todos os dias. Antes sabia que se precisasse, podia contar com os teus ouvidos e com a tua cabeça para me ajudar a fazer a coisa certa. Agora só posso contar comigo e nem sequer te posso perguntar se o que faço é certo.
Mas há uma coisa que sei, pai. Amo-te para sempre.
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