05 junho, 2007

A velha senhora.

Desceu do 1º piso do autocarro e ficou à porta. As obras na rua retardaram suficientemente o andamento dos autocarros para que eu pudesse apreciar aquela velha senhora. Da altura de uma criança de 10 anos e com uns pés que calçavam calculo que um europeu 40. Trazia um vestido curto branco, que se segurava no pescoço à custa de alfinetes de ama.
A cara completamente pregueada de rugas deixava entrever, a quem se desse o trabalho de olhar cuidadosamente, que por trás daquelas rugas imensas se tinha escondido um dia um belo rosto. Hoje a cabeça, as orelhas (também cobertas de rugas, como eu nunca tinha visto outras) e os pés, completamente fora do contexto do resto do corpo. Tudo nesta velha senhora encolheu, excepto estes.
Não consegui perceber se o cabelo era de verdade ou se se tratava de uma peruca. Podia estar apenas imensamente sujo e dar-me a ideia de que era realmente uma peruca... ou pode apenas ter realmente caído e dado lugar à peruca.
Olhei a velha senhora demoradamente. Apoiava-se numa bengala de tamanho adequado ao seu corpo. Saiu do autocarro na paragem, com alguma agilidade. As pernas nuas mostravam também os sinais do tempo. De muito tempo. Calculei que a velha senhora terá mais de 100 anos. E pensei que provavelmente já assistiu a muitos funerais... mas não tenho a certeza de que assistirá ao seu próprio funeral... Porque quem chegou àquela idade com aquela agilidade, apesar de ver o seu tamanho extremamente reduzido, faz-me crer que atingiu a eternidade... Pelo menos para mim.

1 comentário:

Bartolomeu disse...

Hmmmmmm...
Muito interessante essa reflexão Maria Eduarda.
Portanto, xacáver setentendi...
Constatas-te "no teu tempo", uma senhora, chegada do tempo, dando a sensação de não ter tempo.
100 anos dizes tu?
Provavelmente conheceu Einstein... chega aqui o ouvido Maria Eduarda... será possível que a dama de branco, tenha tido um caso com o físico, e dele tenha nascido a teoria da relatividade?
Hmmmmm...