14 junho, 2007

Em silencio

Deixemo-nos pois ficar assim em silêncio, ouvindo a nossa música. Lês o teu jornal e eu leio o romance. Sempre assim tem sido, não é?
Antes de ti ninguém entendeu os meus silêncios, sabes? Pior: não os toleravam. Queriam que eu emitisse opiniões sobre tudo e sobre nada. Exigiam-me manifestações de alegria e de dor em alta voz. Nada de silencios. E eu cada vez mais silenciosa. Ou faladora para evitar que me contassem o que eu não queria ouvir, percebes? Eu falando como uma metralhadora para não permitir que me confessassem o que eu não queria que confessassem. Eu fugindo logo que possível para aqui, para o meu canto, onde estav tão bem só e onde estou tão bem agora contigo: em silencio os dois.
Lês o jornal. Em silencio. Sem comentários. Não perturbas a minha leitura. Mais tarde, muito mais tarde, se houver realmente alguma notícia importante dir-me-ás. E eu pedirei que me passes o jornal para eu ler com os meus olhos, porque quem conta um conto acrescenta um ponto, sei-o bem demais, e quero ler e tirar as minhas conclusões. Não te chateias porque eu sou assim. Aceitas. Falas de mim aos amigos como se eu fosse rara. Eu sei. Sou rara para ti. Como dizes sempre, para ti sou única.
Como tu és para mim. Porque me deixas ler o romance sem me interromperes com apartes que nada me dizem. Porque não precisas que te diga o que sinto. Porque és capaz de ler nos meus olhos, na minha expressão, tudo o que sinto. Lês até nas minhas mãos. Nas minhas pequenas mãos como lhe chamas. De facto as tuas também são pequenas, se tivermos em conta o teu tamanho. Serão até mais pequenas do que as minhas. Mas eu calo o que penso. Porque tu sabes sempre o que penso. Porque tu sabes que eu gosto de estar assim: em silencio.

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