23 março, 2007

Evocando Manuel da Fonseca

Evocando o grande escritor alentejano, Manuel da Fonseca, transcrevo um dos mais belos poemas seus e dedico-o principalmente aos amigos, que não vejo há muito tempo, mas que sei por onde andam:
- Francisco Bélard. Hoje jornalista do jornal " O Expresso ". Era, de nós todos, o mais culto e o mais ponderado. Tinha um poder de síntese maravilhoso.
- Casimiro José Moreira Branco. O que só falava com pessoas que conheciam o Manuel da Fonseca e o Fernando Pessoa. Dizia ele, claro. Embora seja verdade que quando foi pedir namoro a uma rapariga da Escola Comercial de Beja, encontro marcado na porta norte do jardim da cidade e que teve uma duração muito curta, desistiu do pedido que fora responsável pelo encontro, encontro planeado ao milímetro das palavras, só porque lhe pareceu que a gaja não percebia nada de literatura.
- Arlindo Caldeira. Andava na alínes de História. Nunca mais o vi. Ganhou alguns prémios de ensaio no Diário de Lisboa-Juvenil, para onde eu também escrevia. Escrevia bem, o Arlindo. E as suas críticas eram sempre lúcidas.
- Fernando Silva. Hoje, Professor universitário e investigador. Lembras-te, Fernando, daquela bebedeira monstra que apanhámos, a discutir, horas e horas, bem regados de bagaço, se Myrtilis se escrevia com y, ou sem y?..
Todos éramos amigos, pobres e felizes, tal como Ernesto Hemingway dizia dos tempos de Paris, onde iniciou as suas lides literárias e começou a percorrer o mundo.
O nosso mundo era, porém, outro. O da " Meia Laranja ", local do centro de Beja ( Pax-Júlia ), onde víamos as " garinas " passar e combinávamos qual o fado de Coimbra que cantaríamos às nossa amadas na próxima serenata. Ao som da guitarra dedilhada pelo Bélard da Fonseca.
Poi é pensando principalmente nestes meus queridos amigos que passo a transcrever o seguinte poema de Manuel da Fonsaca:

MATARAM A TUNA
Nos domingos antigos do bibe e pião
Saía a Tuna do Zé Jacinto
Tangendo violas e bandolins
Tocando a marcha Almadanim.
Abriam janelas meninas sorrindo
Parava o comércio pelas portas
E os campaniços de vir à vila
Tolhendo os passos escutando em grupo.
Moços da rua tinham pé leve
O burro da nora da Quinta Nova
Espetava orelhas apreensivo
Manuel da Água punha gravata!
Tudo mexia como acordado
Ao som da marcha Almadanim
Cantando a marcha Almadanim.
Quem não sabia aquilo de cor?
A gente cantava assobiava aquilo de cor...
( Só a Marianita se enganava
Ai só a Marianita se enganava
E eu matava-me a ensinar...)
Que eu sabia de cor
Inteirinha de cor
E para mim domingo não era domingo
Era a marcha Almadanim!
Entanto as senhoras não gostavam
Fazim troça dizendo coisas
E os senhores também não gostavam
Faziam má cara para a Tuna:
- Que era indecente aquela marcha
Parecia até coisa de doidos:
Não era música era raiva
Aquela marcha Almadanim.
Mas Zé Jacinto não desistia.
Vinha domingo e a Tuna na rua
Enchendo a rua enchendo as casas.
Voavam fitas coloridas
Raspavam notas violentas
Rasgava a Tuna o quebranto da vila
Tangendo nas violas e bandolins
A heroica marcha Almadanim!
Meus companheiros antigos do bibe e pião
Agora empregados no comércio
Desenrolando fazenda medindo chita
Agora sentados
Dobrados na secretária do comércio
Cabeças pendidas jovens-velhinhos
Escrevendo no Deve e Haver somando somando
Na vila quieta
Sem vida
Sem nada
Mais que o sossego de falas brandas...
- Onde estão os domingos amarelos verdes azuis
Encarnados
Vibrantes tangidos bandolins fitas violas gritos
Da heroica marcha Almadanim?!
Ó meus amigos desgraçados
Se a vida é curta e a morte infinita
Despertemos e vamos
Eia!
Vamos fazer qualquer coisa de louco e hroico
Como era a Tuna do Zé Jacinto
Tocando a marcha Almadanim!
( Manuel da Fonseca ).
Quanto a nós, queridos amigos, prometo que vou contactar-vos para este gesto heroico que é os alemtejanos, tão contemplativos que somo todos, nos encontrarmos e cantarmos como nos velhos tempos...
Um abraço.
Eduardo Aleixo

6 comentários:

Maria Eduarda disse...

Quando o meu filho mais vel~ho fundou com outros colegas e amigoa a Scalabituna eu perguntava "para que serve uma tuna?" só para chatear. Hoje sei para que serve uma Tuna. Sei que acabaram os curos há que anos, mas sempre que podem aí estão eles, a fazer serenatas às namorads ou às mulheres. Por mim confesso que me emocionaram imenso quando me cantaram no casamento dele "Mãe Preta", depois de me terem enrolado na capa de um deles. Foi lindo! A emoção foi enorme... e eu fiquei a saber para que serve uma Tuna!

Anónimo disse...

Das duas uma: ou tu ou o Casimiro, não sabe o que é uma gaja!
Stela

Unknown disse...

Caro Eduardo

Ainda não sei para que serve uma tuna, mas já sei para que serve a Internet: para encontrar os amigos, mesmo tarde e a más horas.
Um abraço norme

Arlindo.

Unknown disse...

Oi, Arlindo, tão bom " ouvir-te ".
Sabes, já não escrevo neste blogue, mas a Eduarda deu-me conta de que me tinhas lido, enviando-me um email.
Se leres estas linhas ficas a saber que o meu endereço é: eduardoaleixo@sapo.pt
Há quantos anos!
Escreve-me.
Um abraço
Eduardo Aleixo

Unknown disse...

Arlindo: o meu endereço electrónico é o seguinte:

eduardoaleixo@sapo.pt

Unknown disse...

Arlindo, o meu endereço é o seguinte:

eduardoaleixo@sapo.pt


Um abraço


Eduardo