07 outubro, 2006

Loucos de Lisboa


Parava no café quando eu lá estava
Na voz tinha o talento dos pedintes
Entre um cigarro e outro lá cravava
a bica, ao melhor dos seus ouvintes
As mãos e o olhar da mesma cor
Cinzenta como a roupa que trazia
Num gesto que podia ser de amor
Sorria, e ao sorrir agradecia
São os loucos de Lisboa
Que nos fazem recordar
A Terra gira ao contrário
E os rios correm para o mar
Um dia numa sala do quarteto
Passou um filme lá do hospital
Onde o esquecido filmado no gueto
Entrava como artista principal
Compramos a entrada p'ra sessão
Pra ver tal personagem no écran
O rosto maltratado era a razão
De ele não aparecer pela manhã
Mudamos muita vez de calendário
Como o café mudou de freguesia
Deixamos de tributo a quem lá pára
Um louco a fazer-lhe companhia
E sempre a mesma pose o mesmo olhar
De quem não mede os dias que vagueiam
Sentado lá continua a cravar
Beijinhos as meninas que passeiam.
(João Monge)

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