Gosto muito de atletismo. O tempo que a maioria dos portugueses passa a ver futebol, passo eu a ver provas de atletismo, quando são transmitidas pela TV. O que é raro. Acontece apenas quando se trata de provas europeias, mundiais ou olímpicas e aquelas maratonas que se vão fazendo, aqui mesmo pelo país, sobretudo as mais emblemáticas que são as das pontes de Lisboa. Uma vez por outra transmitem um corta mato e pronto.
E nunca percebi muito bem porque é que o atletismo é tratado como parente pobre em Portugal, quando é a modalidade que mais alegrias tem dado aos portugueses: quem esquecerá alguma vez Carlos Lopes ou Rosa Mota, por exemplo. Duas pessoas que são exemplos da tenacidade, do esforço, da luta necessários para alcançar medalhas de ouro em provas internacionais, sem qualquer tipo de apoio sério.
Pois bem: somos campeões da Europa dos 100 metros graças a Francis Obikwelu. Portugal é campeão da Europa graças ao africano, Obikwelu, nascido mais exactamente na Nigéria. A desclassificação de Dwain Chambers, por prática de dopping, guindou Francis para o primeiro lugar e respectiva medalha de ouro.
Francis está em Portugal desde os 16 anos. Veio correr uma prova de 400 metros e não voltou à Nigéria.
Nem o Benfica nem o Sorting o quiseram apoiar quando lhes bateu à porta, porque era um ilegal, um clandestino.
Foi trabalhar para as obras, comeu o pão que o diabo amassou até ser descoberto e "adoptado" por Isabel Ferreira, dirigente do Belenenses. Foi ela que o animou e mimou e iniciou o processo de naturalização.
Francis fala mal português. Mas fala como se tivesse realmente nascido em Portugal. Mais. Fala como se Portugal tivesse feito alguma coisa por ele.
Não fez. O meu país não fez nada por ti, Francis. Quem fez alguma coisa por ti foi essa mulher admiravel, que tratas como a uma mãe, porque és um miúdo grato, és um miúdo com caracter, és um miúdo porreiro.
Mas deste uma medalha de ouro a Portugal. Nos 100 metros. És um velocista, com muita garra. Não sei se Portugal saberá algum dia retribuir (pense nisto senhor engenheiro, uma vez que até gosta e pratica a modalidade), mas estou certa que os portugueses como eu, os que não se incomodam com a vinda de estrangeiros, os que agradecem a todos os que vêm por bem, os que vos recebem de braços abertos, sejam negros, amarelos ou brancos, nós agradecemos-te e a todos que, estando cá há meia dúzia de anos amam este país que nem sempre os sabe respeitar, não lhes reconhecendo os mesmos direitos enquanto trabalhadores, dificultando muitas vezes a entrada das suas crianças nas escolas, explorando ou fechando os olhos a situações de exploração.
Obrigada Francis. Obrigada a todos os Francis, Markus, Fong, Andrades que "invadem" o nosso país todos os dias.
"Traz outro amigo também. Seja bem vindo quem vier por bem"
1 comentário:
Este homem já nos tinha dado outra grande alegria nos jogos olímpicos últimos, é um homem de carácter, de raça, de uma humildade só vista em alguns, poucos, grandes Homens!
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