encontrei a minha mãe a dormir. depois de três dias de muita agitação como me tinham informado fiquei feliz por perceber que essa agitação se está a desvanecer. é certo que a achei com um ar muito cansado mas quem não estaria ao fim de três dias sem dormir sobretudo quando se tem oitenta e cinco anos e uma doença ela mesma extremamente complicada. seja como for tinha saudades sobretudo da mané de quem já falei aqui por várias vezes neste espaço. é verdade. tinha saudades da mané e saí à sua procura nos lugares que sei onde ela costuma estar. sentada na sua cadeira no jardim não estava. na sala de estar não estava. perguntei por ela a quem de direito e pois claro lá estava ela a assaltar a despensa. saiu com umas bolachas de água e sal na mão e o seu ar de criança que cometeu uma infracção mas que sabe que não será punida por isso. entretida que estava com as bolachas não me ligou nenhuma. voltei para junto da minha mãe que estava hoje mesmo interessada em dormir. com todo o direito. olho para ela e não quero ver senão a minha mãe. dei comigo um dia destes a dizer que ela não é velha. tem oitenta e cinco anos mas é minha mãe. entendo finalmente o desgosto dela quando a sua mãe morreu sem sofrimento aos noventa e dois anos. para ela a mãe era ainda nova demais para morrer. assim também hoje a minha mãe é para mim nova demais para deixar de estar. volta a adormecer. alguém me diz que a dona mariana está muito triste porque a filha não foi visitá-la. vou à sala para tentar que se distraia dos maus pensamentos. e é quando estou conversando com ela que sinto alguém pegar-me na mão. por trás de mim a mané conduzia a minha mão para as suas costas. e ali estive a coçar-lhe as costas e foi difícil deixá-la. a verdade é que se ela não queria que eu deixasse de lhe tocar eu também não tinha vontade de a deixar voltar ao seu mundo interior. em pouco tempo criei laços naquele lugar. de tal maneira que muitas vezes me apetecia mesmo era ficar por lá. é que de certo modo encontro uma estranha paz naquele lugar. talvez seja apenas porque o meu anjo da guarda também paira por lá...
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