18 dezembro, 2008

nem assim é natal


sabes avó quando eu leio livros de um senhor chamado Mia Couto e que é moçambicano lembro-me sempre de ti e das tuas estórias. é claro que as tuas eram relacionadas com outras realidades de vida. eram passadas em países onde só existia gente branca e a guerra não existia. as guerras eram todas entre pessoas da mesma terra e eram relacionadas com água ou com terras ou com amores infelizes. mas eu gostava de te ouvir. era capaz de ouvir estórias que contavas sempre de modo diferente e onde gostavas de misturar umas facadas e uns cortes de cabeça que ainda hoje estou para saber se era por causa das tuas estórias que eu tinha tantos pesadelos. mas a verdade é que não me lembro de nenhum pesadelo relacionado com as tuas estórias. eram sobretudo dois pesadelos recorrentes e eram relacionados com situações da minha vida real. e ainda havia aquele que eu tinha das bonecas a chorar lembras-te? um dia descobriste que eu tinha esse pesadelo sempre que algum mosquito rondava os meus ouvidos. era sempre por esta altura que passava uns dias contigo. vinhas cá para casa e cosias a roupa de um ano inteiro e ficavas admirada com a quantidade de sopa que era preciso fazer porque estavas habituada a cozinhar só para ti e estranhavas que 3 crianças comessem tanto. mas ao fim de dois dias já estavas acostumada e adoravas ter os bisnetos sentados aos teus pés a ouvir as tuas estórias e a aprender os truques de magia que aprendeste quando fugiste com um grupo de saltimbancos. resolveste partir no dia de natal. para mim nunca mais foi natal de verdade. fazia o esforço de fingir que era de verdade porque os miúdos eram pequenos. mas hoje não preciso mais de fingir. hoje eu sei que não há natal. porque tu não estás cá o pai não está cá e a mana velha também não está. os miúdos são adultos e também não estão como estavam. e mesmo com a árvore de natal linda que resolvi fazer... mesmo assim continua a não ser natal.

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