Tínhamos a cabeça e o coração cheios de ideais e uma vida inteira pela frente para os cumprir, para lutar por eles. Éramos capazes de tudo. Éramos capazes de mudar o mundo. E nessa altura o mundo era muito maior do que é hoje. Mas não nos poupávamos a esforços. Íriamos até ao fim do mundo e fim do mundo era a Índia, Katmandu e as vacas sagradas, lembras-te?
Corríamos Lisboa de mãos dadas, felizes. Parávamos ao mesmo tempo, onde quer que fosse para nos beijarmos. Escolhíamos espaços livres como os jardins da Gulbenkian e o castelo de S. Jorge... aqui tínhamos a sensação de ser donos do mundo. E também no alto de santo amaro junto à capela, lembras-te? Éramos jovens e não sabíamos. Não tínhamos idade. Aqui para nós, eu continuo a sentir exactamente o mesmo. Não tenho idade. Só que o mundo é hoje muito mais pequeno. Se eu não vou à Índia, a Índia vem aqui visitar-me quando lhe apetece. O mundo ficou de repente tão pequeno. E a miséria aumentou, a fome aumentou, os meninos de rua são cada vez mais, a pobreza globalizou-se e nós cruzámos os braços e percebemos que afinal não mudámos nada. Escrevemos, gritámos pelas ruas, corremos contra e a favor de tudo aquilo em que acreditámos mas não mudámos nada. Ainda acreditamos. Eu acredito. De ti não sei nada há tantos anos que não posso afirmar. Mas se leres isto, diz-me se ainda acreditas num futuro sem guerra, sem fome, sem miséria. Diz-me se ainda acreditas que os os filhos todos serão nossos, ainda que sejam filhos de outros corpos. Para sempre serão os nossos filhos. Eu ainda acredito. E tu?
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