23 julho, 2008

Histórias que o escaravelho me contou


Há coisas que eu digo que sei que é difícil acreditar. Raramente me queixo do calor. Na verdade amo o Verão e dispenso o Inverno. Nem da roupa de Inverno gosto. Posso passar várias estações em comprar um peça de roupa. Não gosto do Inverno. É definitivo!
Mas o calor do interior às vezes pode fazer-me mal. Fez-me mal. Três dias de dor de cabeça que não houve comprimido que remediasse, duas noites sem dormir por causa do calor, uma torreira abrasadora: e ainda assim eu olhava em volta e as pessoas sorriam. Simpáticas as pessoas que me rodearam estes dias no Alentejo profundo. Se me dirigia a alguém pedindo alguma informação respondiam com sorrisos, houve até uma rapariga que ao lado do namorado lhe apertava o braço para que ele me desses a resposta pretendida com o ar mais tímido deste mundo. Mas ainda assim sorriu, quando agradeci e desejei bom dia.
E foi assim que me levantei bem cedo, tomei um duche frio e o pequeno almoço e me dirigi ao Redondo, vila do Baixo Alentejo que se encontra bastante bem cuidada e ruas desertas de gente, com as temperaturas a passarem os 40º ao fim do dia. Mas de manhã a estrada está concorrida e o calor ainda não sufoca. Vejo um burro e uma pequena carroça, perecem-me uma coisa de brincar. Apetece-me parar e fotografar. Impossível, não há onde parar o carro, a estrada está concorrida e eu tenho que chegar a tempo à Biblioteca Municipal do Redondo que é financiada pela Fundação Calouste Gulbenkian. Bendito judeu que mesmo depois de morto sabes o que fazes!
Pois é: aguarda-me "Histórias que o escaravelho me contou". Dois actores decidem levar a cena texto de Manuel António Pina em teatro de sombras. Uma coisa muito bonita de se ver. São apenas 20 minutos mas os miúdos espojados em cima de colchões espalhados pelo chão estão "agarrados" ao palco. De pequenino é que se torce o pepino. Diz o povo e é verdade.
Acabada a peça há mais duas horas e meia de "oficina". Os miúdos aprendem a fazer marionetas que se mexem através de arames. E depois cada grupo faz a sua própria estória e representa. Duas delas foram realmente muito bem inventadas, estruturadas e contadas. Num canto, uma menina linda de olhos claros e cabelos loiros, recusa-se a entrar na brincadeira. Percebo-lhe a timidez. Num primeiro impulso quase lhe digo que vá, mas depois lembro-me de mim naquela idade e penso "eu era assim"... e fico onde estou.
Ao fim da tarde faço a estrada de regresso. Tenho saudades do mar. É a primeira coisa que procuro quando regresso a casa. E ele ali está, imenso como sempre... E eu, como a miúda olho de longe e espero que ele não me reconheça.

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