14 outubro, 2007

Uma voz na pedra

Não sei se respondo ou se pergunto.
Sou uma voz que nasceu na penumbra do
vazio.
Estou um pouco ébria e estou crescendo
numa pedra.
Não tenho a sabedoria do mel ou a do
vinho.
De súbito ergo-me como uma torre de
sombra fulgurante.
A minha ebriedade é a da sede e a da
chama.
Com esta pequena centelha quero incendiar o
silêncio.
O que eu amo não sei. Amo em total
abandono.
Sinto a minha boca dentro das árvores e
de uma oculta nascente.
Indecisa e ardente, algo ainda não é flor
em mim.
Não estou perdida, estou entre o vento e o
olvido.
Quero conhecer a minha nudez e ser o azul
da presença.
Não sou a destruição cega nem a
esperança impossível.
Sou alguém que espera ser aberto por uma
palavra.

(António Botto)

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