Não consigo olhar-me ao espelho. Quer dizer, vejo o cabelo, o nariz, a boca. Sobretudo a boca. Mas não me olho. Não olho os meus olhos. Ainda sinto na boca o beijo. O beijo dela. O beijo que me tirou o sossego. O beijo que me troxe a vergonha.
Aprendi o que é certo e errado. De pequenina. Sempre fui bem comportada. Não casei porque nunca tive um namorado que me fizesse ter vontade de casar. Sentia que faltava qualquer coisa na minha vida mas já estava habituada. A gente habitua-se. À tranquilidade com uma facilidade ainda maior. E eu estava assim. Tranquila. Passeava com as minhas amigas, tinha o meu trabalho, sempre me dei bem com as colegas, sou sossegada por natureza, não entro em conflitos, não sou uma guerreira. Aceito. Tenho aceitado sempre o que a vida me dá.
Aprendi o que é certo e errado. De pequenina. Sempre fui bem comportada. Não casei porque nunca tive um namorado que me fizesse ter vontade de casar. Sentia que faltava qualquer coisa na minha vida mas já estava habituada. A gente habitua-se. À tranquilidade com uma facilidade ainda maior. E eu estava assim. Tranquila. Passeava com as minhas amigas, tinha o meu trabalho, sempre me dei bem com as colegas, sou sossegada por natureza, não entro em conflitos, não sou uma guerreira. Aceito. Tenho aceitado sempre o que a vida me dá.
Nunca gostei de gente diferente. E para mim os homossexuais são diferentes. Não são gente normal. Não se pode contar com eles para constituir família, formar um lar. Foi o que sempre pensei.
Mas hoje.
Hoje ela beijou-me. E eu gostei. E é por isso que não consigo mais olhar-me no espelho. Como vou viver daqui por diante. Como é que eu posso amar outra mulher, se sei muito bem que isso está errado. Sempre esteve. Se decido avançar apesar de tudo. Se os meus sentimentos forem mais fortes do que noção do bem e do mal. Como viver com isso? O que digo aos meus pais que sempre me educaram como católica. Como volto a entrar na missa. Como olhar o Jesus crucificado e crucificá-lo por mais este meu pecado.
Mas sobretudo. A partir de hoje. Como olhar-me no espelho.
2 comentários:
Bartolomeu deixou um novo comentário na sua mensagem "Como olhar-me no espelho":
Ela beijou-te e gostaste, excelente.
Pior seria, ela beijar-te e não teres gostado. Desses sentimentos todos que te assaltam o espírito, ninguem te ia livrar, aposto, irias sentir "repulsa" dos teus lábios, da tua boca, do mesmo modo, irias viver no medo de ela te voltar a beijar e de teres de lhe manifestar o teu desagrado. Assim, tens o problema resolvido... ela beijou-te e tu gostaste, optimo. Se te sentes motivada a manter esse torvelinho de sentimentos e de sensações, permitindo que evoluam para um estágio de cumplicidade plena... ou deixares por isso mesmo e guardares a magia do momento lá no fundo do teu íntimo, é uma decisão que terás de enfrentar sozinha. Nem o catolicismo familiar, ou a retidão de comportamento nem as regras sociais fielmente observadas, terão a resposta que desejas. Terá de ser o teu coraçãozinho e a tua vontade a ditarem a direcção que os teus passos irão tomar. E ela, soube que gostaste?
Este comentário é do Bartolomeu. Acontece que ele deixou um comentário repetido na postagem sobre a coleção Berardo e eu sem querer apaguei este em vez do duplicado.
E não ia comentar coisa nenhuma. Mas já que aqui estou: ainda bem que pensas Bartolomeu que a estória foi comigo. Infelizmente ou não, não foi. É aqpenas um texto dos muitos que vou ineventando alguns com fundo verdadeiro, outros não. Mas é claro que podia ser comigo. Só que eu não viveria este dilema porque não tive uma educação religiosa. Felizmente ou não (mais uma vez) sou ateia e para mim todos os sentimentos são válidos e nobres desde que nos façam bem. Bem vindo pois Bartolomeu.Abraço.
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