Jantávamos num restaurante indiano, no coração de Lisboa, ali às Portas de Santo Antão. Os empregados, indianos, falam bastante mal português. O meu amigo faz o pedido. Por números. Às tantas interrompo-o, estás a pedir os pratos todos?, ele responde, estou apenas a pedir tudo o que pediste. O empregado que nos atende acena afirmativamente e sorri com um ar feliz enquanto o meu amigo continua a pedir. Numéricamente.
Continuamos a conversar. Somos interrompidos pela entrada em cena da candidata Helena Roseta, rodeada de um gupo (amigos ou família ou colaboradores, pouco importa). Tem um ar sereno. Não está ali em campanha. Está a gozar uma noite como qualquer trabalhador. Tem direito a esta pausa. Como eu. Como o meu amigo.
Entra então um daqueles vendedores de artesanato africano, que já fazem parte da paisagem turística de qualquer cidade europeia que se preze. Tenho-os encontrado por essa Europa fora, sobretudo nos países latinos. Portugal, Espanha e Itália estão cheios deles. Aparecem nos bairros típicos, nas praias que os turistas mais frequentam... geralmente as pessoas não gostam deles. Não os olham. Como se faz muita vez com os mendigos. (Para não vermos ou para não sabermos que existem?). Eu gosto deles. Gosto sobretudo de conversar com eles.
Depois do nosso não e de percorrer todo o restaurante tentando vender o que quer que fosse, abeira-se outra vez da nossa mesa e poisa no tampo dois relógios que tirou não sei de onde. Só tinha visto o artesanato. Pergunto-lhe se é senegalês, acena que sim, pergunto se de Dacar e ele continua a acenar com a cabeça que sim. E ri comigo. Brinco com ele em relação aos relógios. Digo-lhe que naquela mesa só usamos rolex verdadeiros. Ele olha-me e continua a rir. Insisto que aquela mesa é de pessoal dos rolex. Recolhe então a mercadoria e despede-se rindo.
O meu amigo repara. Diz-me, visto o que ele riu contigo? Vi. É muito bom rir, não é? Sobretudo de nada. De coisa nenhuma. Assim. Só porque temos vontade de partilhar um riso com alguém que não conhecemos de lado nenhum.
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