23 maio, 2007

A filha de Pepe

Gosto de estar com a filha de Pepe. Com a neta de Pepe. Com a minha amiga Pepa. Que sabe tudo dos idos de antes da revolução e também dos depois. Que me conta as suas estórias e também as estórias das velhas que ela ouve no Alentejo que a viu nascer e na Lisboa que a viu crescer mais tarde.
Com a filha de Pepe. Conversamos de tudo. Conto-lhe as minhas alegrias e as minhas tristezas. As minhas mágoas e as minhas aflições. Ela diz-me "fizeste bem, não podias fazer de outra maneira, tens que estar de bem contigo, isso é que é importante, não és conciliadora, és como és, é assim que nós os teus amigos gostamos de ti e quem não gosta, quem não aceita não é teu amigo, não dês importância, amiga". Ou puxa-me as orelhas quando eu vou contra a minha vontade, os meus princípios, em nome de coisas que nem sei muito bem o que sejam, uma vez que chego à conclusão que tudo o que realmente importa foi o meu pai que me ensinou na minha pequena infância, antes mesmo de entrar na escola...
Por isso gosto tanto desta Pepa. Porque me diz o que pensa sem estar à espera que eu emita a minha opinião para se mostrar depois, convenientemente de acordo.
Há mais: a filha de Pepe conhece toda a gente que importa conhecer. Só que às vezes fica calada. Quando eu falo de gente que ela conhece muito bem e que sabe que acabará por me fazer mal, cala-se. Depois quando eu lhe digo que devia ter-me contado ela põe o seu melhor ar de "não era nada comigo, mas eu sabia que te ias desiludir e contar-me tudo", e diz-me "tu és uma mulher inteligente, segura, não precisas do conselho de ninguém. Chegas rapidamente aonde a maioria anda a chafurdar anos e ultrapassas..." E eu olho-a e calo-me. Porque sei que não sou nada daquilo que ela diz. Quer dizer: sou mas não naquela proporção. Mas sei que no fundo ela tem razão. Há coisas que mais vale aprendermos por nós. Assim a lição fica bem estudada e não voltamos a cair na esparrela que cairíamos se alguém tentasse alertar-nos para determinados factos.
O que importa é que estive com a Pepa, filha de Pepe, antes de partir.

1 comentário:

Bartolomeu disse...

Tenho um conceito acerca dos homens e mulheres alentejanos... são sábios! mas são-no de um modo natural, está-lhes nos genes, talvez herança daquele povo místico do deserto. Reflexos d'aquela Catarina Eufemia, que enfrentou sem medos o torpe cabo GNR.
Conheço muitos alentejanos, no alentejo, são como o vinho e o pão, para manterem o sabor original, devem ser apreciados no local onde são produzidos.
Não duvides Maria Eduarda, se a Pepa do Pepe, olha fundo nos teus olhos, vê a tua alma, e afirma que és inteligente e segura... és de certeza assim mesmo, confia.