Até parece de propósito. Acabei de sair da Casa do Alentejo, onde fui entregar a minha proposta de sócio, entro no blogue e dou com a prosa da Eduarda a tratar do tema que trazia e trago na cabeça para escrever. E não vou desistir do tema. Trata-se da ocupação do tempo. Da gente muito, muito ocupada, sem tempo! Mas antes disso deixem-me dizer-vos que talvez por influência das cantigas que ouvi, enquanto entregava os documentos na Secretaria da Casa do Alentejo, que tem, para quem não conheça, uma arquitectura linda, estilo árabe, embora velha, a precisar de mais reparações, por influência, dizia, das cantigas, que fui ouvindo, dei comigo a cantarolar nas ruas da Baixa, uma " moda " muito antiga, que já pouco ou nada se ouve, do tempo das vozes genuínas da minha infância, vozes da idade dos meus avós, na margem esquerda do Guadiana, que tem um floclore diferente, mais ondulado, mais arabesco, mais muçulmano:
" Resolvi ir até Lisboa,
Resolvi ir até lá,
Em busca de uma vida boa,
Que eu procuro
E não encontro cá.
Abalei,
Embarquei
No comboio,
Que assobiava pela linha,
Às vezes penso
Comigo,
E digo,
Não sei que sorte
É a minha.
E depois que cheguei
Ao Barreiro,
No barco
Que atravessa o Tejo,
Chora por mim,
Que eu choro por ti,
Já deixei o Alentejo..."
As recordações invadem o nosso coração. Até a foto, as 2 fotos que tirei, para entregar na Casa do Alentejo, para obter o meu cartão de sócio, me fizeram lembrar o meu pai, que há muitos, muitos anos, tirou comigo, neste lugar onde estou, nos Restauradores, na Estação do Metro havia uma máquina " à la minute", como se dizia, ainda tenho essa fotografia, querido pai, guardei-a sempre, junto de mim, estamos os dois bem bonitos, tu, um homem novo, eu, adolescente, agora estou quase velho e tu já partiste...
Sentei-me enfim em frente do computador. Tem razão a Eduarda nas palavras que dirige ao amigo dela, que também se chama Eduardo. Se vale a pena a gente deixar-se vencer por esta corrente, que sempre existiu, entenda-se, ao nível profissional, mas que agora está na moda. Nestes últimos dias, precisando eu de mudar de " operador" por causa da NET, lembrei-me de telefonar para um amigo meu, engenheiro, para lhe perguntar se o poerador que eu tinha em mente era o mesmo que ele tinha, precisava enfim de uma informação. O que sucedeu foi, logo que ele me atendeu, perguntar-me se o que me levava a tewlefonar era coisa de poucas palavras, se era que falasse, se não era...Claro, que não tem importância, sr engenheiro, logo falamos mais tarde. Devo dizer que as vezes que falo ao sr engenheiro é sempre assim.Nos últimos tempos da minha vida profissional conheci muita gente semelhante. Gente que casou com o emprego. Gente que só falava de trabalho. Um dia, ou melhor, uma noite, em vêsperas de Natal, lembrei-me de enviar um email ao meu Director. Olhei para o email, da casa dele, pensei: bom, não há problema, porque é para a casa dele. Hesitei, como é que ele iria reagir, mas lá mandei. Respondeu-me. Agradeceu. Só que, no outro dia, numa reunião de serviço, estava ele a cumprimentar, como sempre fazia, cada um de nós, antes dos trabalhos, e, quando passou por mim, disse-me:
- Sabe, Dr, recebi o seu email, mas olhe que sou um homem muito ocupado, mesmo em minha casa...
Conto este episódio, real, porque ele diz tudo das pessoas que só vêem uma coisa na vida: a produção, a tarefa, a produtividade...
Claro que também conheci outros dirigentes e trabalhadores, que sempre tentei imitar: aqiueles que sempre tinham tempo, que sempre tinham a porta abarta, que sempre estavam disponíveis para ouvirem os outros, que sempre tinham tempo para coisas pequenas como um bom dia, um olá, uma palavra, um carinho.
Admiro muito a última categoria de pessoas.
E gostaria que todo o mundo defendesse este último mundo, porque é o único que vale a pena.
É o mundo do trabalho e do amor.
Na nossa vida, que é breve.
E que tem coisas lindas, para além das portas do emprego.
Eduardo Aleixo
1 comentário:
Sabes que me irritam aquelas pessoas que quando precisam que as ajude o fazem cheias de pruridos porque estão a fazer com que "eu perca o meu tempo"? A minha resposta se bem te lembras é sempre "nunca há tempo perdido... todo o tempo é ganho". Mas é como dizes. Já falámos sobre isto de outras vezes. As pessoas andam a matar-se de raiva e solidão por falta de tempo. Para esquecerem o resto trabalham, trabalham , trabalham... nem sei porque é que Portugal está na cauda da Europa...
Enviar um comentário