POEMA
Ponho palavras em cima da mesa; e deixo
que se sirvam delas, que as partam em fatias, sílaba a
sílaba, para as levarem à boca - onde as palavras se
voltam a colar, para cairem sobre a mesa.
Assim, conversamos uns com os outros. Trocamos
palavras; e roubamos outras palavras, quando não as
temos; e damos palavras, quando sabemos que estão
a mais. Em todas as conversas sobram as palavras.
Mas há as palavras que ficam sobre a mesa, quando
nos vamos embora. Ficam frias, com a noite; se uma janela
se abre, o vento sopra-as para o chão. No dia seguinte,
a mulher a dias há-de varrê-las para o lixo.
Por isso, quando me vou embora, verifico se ficaram
palavras sobre a mesa; e meto-as no bolso, sem ninguém
dar por isso. Depois, guardo-as na gaveta do poema. Algum
dia, estas palavras hão-de servir para alguma coisa.
( Nuno Júdice, in " As coisas mais simples" )
1 comentário:
Há quem guarde palavras no bolso... eu tenho a mania de meter tudo nos bolsos... às vezes descubro bem lá no fundo, um pedaço de ternura.
Enviar um comentário