31 agosto, 2017

os chicólatras
"Um lugar deve existir; Uma espécie de bazar; Onde os sonhos extraviados; Vão parar"

Chico Buarque

Dizem que Finjo ou Minto

 

Dizem que finjo ou minto 
Tudo que escrevo. Não. 
Eu simplesmente sinto 
Com a imaginação. 
Não uso o coração. 

Tudo o que sonho ou passo, 
O que me falha ou finda, 
É como que um terraço 
Sobre outra coisa ainda. 
Essa coisa é que é linda. 

Por isso escrevo em meio 
Do que não está ao pé, 
Livre do meu enleio, 
Sério do que não é, 
Sentir, sinta quem lê! 

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro" 

30 agosto, 2017

Ney Matogrosso - Por debaixo dos panos 1982 ÁUDIO HQ



O que a gente faz
É por debaixo dos pano
Prá ninguém saber
É por debaixo dos pano
Se eu ganho mais
É por debaixo dos pano
Ou se vou perder
É por debaixo dos pano...(2x)

É debaixo dos pano
Que a gente não tem medo
Pode guardar segredo
De tudo que se vê
É debaixo dos pano
Que a gente fala do fulano
E diz o que convém...

É debaixo dos pano
Que eu me afogo
Que eu me dano
Sem perder o bem...(2x)

O que a gente faz
É por debaixo dos pano
Prá ninguém saber
É por debaixo dos pano
Se eu ganho mais
É por debaixo dos pano
Ou se vou perder
É por debaixo dos pano...(2x)

É debaixo dos pano
Que a gente esconde tudo
E não se fica mudo
E tudo quer fazer
É debaixo dos pano
Que a gente comete um engano
Sem ninguém saber...

É debaixo dos pano
Que a gente
Entra pelo cano
Sem ninguém ver...(2x)

O que a gente faz
É por debaixo dos pano
Prá ninguém saber
É por debaixo dos pano
Se eu ganho mais
É por debaixo dos pano
Prá ninguém saber
É por debaixo dos pano
O que a gente faz
É por debaixo dos pano
Prá ninguém saber
É por debaixo dos pano
Se eu ganho mais
É por debaixo dos pano
Ou se vou perder
É por debaixo dos pano...

É debaixo dos pano
Que a gente esconde tudo
E não se fica mudo
E tudo quer fazer
É debaixo dos pano
Que a gente comete um engano
Sem ninguém saber...

É debaixo dos pano
Que a gente
Entra pelo cano
Sem ninguém ver...(2x)

os honestos trafulhas

Resultado de imagem para fotos do vigaristaaqui pelo portugal dos pequeninos mantêm-se os honestos trafulhas que criticam os grandes trafulhas sem perceberem que grande ou pequena, a trafulhice é a mesma. talvez a grande diferença esteja apenas no talento. tanto para as artes como para a mentira,  pequena e grande trafulhice só resultam com talento. e os chicos espertos espalham-se ao comprido. resta-lhes pois falarem dos grandes aldrabões  esquecendo-se que a única diferença são os montantes envolvidos.
o homem pediu um dia de folga ao seu superior que lhe explicou que naquele dia não podia ser. havia gente de férias e falta de pessoal. o homem no dia seguinte ligou para o emprego e avisou que se tinha magoado num pé e portanto não podia ir trabalhar... depois foi jogar futebol com os amigos, fez um vídeo e publicou no facebook... que génio da trafulhice! claro que no dia seguinte a declaração que apresentou no trabalho não foi aceite: o chefe tinha visto o vídeo no facebok.
outro homem decide que pode ganhar dinheiro sem sujar as mãos. decide arranjar trabalho a quem quer que seja (pedreiros, carpinteiros mecânicos) desde que estes lhe paguem dez por cento do serviço prestado. segundo ele não está a explorar ninguém uma vez que explica aos "agenciados" que devem cobrar aos clientes a percentagem dele. golpe de génio não e?
este é o pais dos pequeninos que se pudessem aplicavam golpes tão grandes como os tubarões que criticam. o pais dos trafulhas. dos honestos trafulhas.

27 agosto, 2017


recados de italia (1)

italia tem recebido milhares de refugiados assim como a grecia. a união europeia fala fala mas não os vejo fazer nada... e isso chateia-me como diz o raj. mas adiante. conheci o jovem malik oriundo do burkina faso que conta uma estória de ir as lágrimas. o seu pais não e exactamente a siria ou a turquia mas os sonhos dos jovens são todos iguais. a europa  `e  o sonho americano para estes miúdos africanos. malik dormia na estação de pavia como todos os outros clandestinos. quis frequentar o ginásio para praticar pugilismo mas não tinha documentos e portanto não havia pugilismo nem sonho para malik. aqui entra uma jovem italiana que pratica a modalidade. malik aparecia todos os dias no ginásio decidido a vencer quem lhe negava o sonho pelo cansaço. a jovem italiana falou dele à mãe que decidiu falar dele aos amigos. e assim se formou uma corrente solidária. malik foi adoptado por uma família luso italiana que lhe arranjou trabalho e lhe deu casa. pratica pugilismo no ginásio. está integrado na sociedade tanto quanto um muçulmano pode estar integrado numa sociedade europeia.
fez 3 horas de viagem depois do trabalho para me conhecer. olhou-me como quem olha para a mãe que deixou em áfrica. ofereceu-me uma refeição e tratou-me como os africanos tratam os "mais velhos". e eu senti que a minha viagem valeu a pena.

Palavras para a Minha Mãe
mãe, tenho pena. esperei sempre que entendesses 
as palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz. 
sei hoje que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente. 

pelas palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste 
tanto e eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te 
desculpa, mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente. 

às vezes, quero dizer-te tantas coisas que não consigo, 
a fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia 
mais bonita que tenho, gosto de quando estás feliz. 

lê isto: mãe, amo-te. 

eu sei e tu sabes que poderei sempre fingir que não 
escrevi estas palavras, sim, mãe, hei-de fingir que 
não escrevi estas palavras, e tu hás-de fingir que não 
as leste, somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes. 

José Luís Peixoto, in "A Casa, a Escuridão" 

26 agosto, 2017

e disse o velho: as árvores abanam-se, para sacudir os pesadelos.

Chico Buarque - "Tua Cantiga" (Clipe Oficial)

Tua Cantiga
Chico Buarque
  
Quando te der saudade de mim
Quando tua garganta apertar
Basta dar um suspiro
Que eu vou ligeiro
Te consolar

Se o teu vigia se alvoroçar
E, estrada afora, te conduzir
Basta soprar meu nome
Com teu perfume
Pra me atrair

Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar

Quando teu coração suplicar
Ou quando teu capricho exigir
Largo mulher e filhos
E de joelhos
Vou te seguir

Na nossa casa
Serás rainha
Serás cruel, talvez
Vais fazer manha
Me aperrear
E eu, sempre mais feliz

Silentemente
Vou te deitar
Na cama que arrumei
Pisando em plumas
Toda manhã
Eu te despertarei

Quando te der saudade de mim
Quando tua garganta apertar
Basta dar um suspiro
Que eu vou ligeiro
Te consolar

Se o teu vigia se alvoroçar
E, estrada afora, te conduzir
Basta soprar meu nome
Com teu perfume
Pra me atrair

Entre suspiros
Pode outro nome
Dos lábios te escapar
Terei ciúme
Até de mim
No espelho, a te abraçar

Mas teu amante
Sempre serei
Mais do que hoje sou
Ou estas rimas
Não escrevi
Nem ninguém nunca amou

Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar

E quando o nosso tempo passar
Quando eu não estiver mais aqui
Lembra-te, minha nega
Desta cantiga
Que fiz pra ti
o homem da rosa

com as mãos atrás das costas o homem hesitou três ou quatro vezes antes de entrar. a sala estava cheia de gente e ele hesitava. de repente decidiu-se. avançou entre as pessoas e mostrando finalmente as mãos entregou-me uma rosa vermelha. creio que nem me ouviu agradecer. rapidamente saiu. creio que corou mas pode ser apenas impressão minha. apareceu depois outras vezes. sem flores. esta semana voltou e dirigiu-se a mim "se soubesse que estava cá tinha trazido uma flor".
reparei mais uma vez nos seus belos olhos azuis e creio que pela primeira vez olhei para as suas mãos: delicadas. mãos de quem gosta de oferecer flores. mãos que não esquecem a mulher com quem dividiu a vida; no dedo mindinho a aliança dela e no anelar a sua. e de repente desejei deixar por cá alguém que me lembre desta maneira. oferecendo flores a outras mulheres.