Um blog do dia a dia, com muitas estórias, alguma poesia, música, fotografia, crítica, comentários... para desabafar, porque sem um grito ninguém segura o rojão!
30 maio, 2011
Retrato do Povo de Lisboa
(foto de Nuno Sousa)
É da torre mais alta do meu pranto que eu canto este meu sangue este meu povo.
Dessa torre maior em que apenas sou grande
por me cantar de novo.
Cantar como quem despe a ganga da tristeza
e põe a nu a espádua da saudade
chama que nasce e cresce e morre acesa
em plena liberdade.
É da voz do meu povo uma criança
seminua nas docas de Lisboa
que eu ganho a minha voz
caldo verde sem esperança
laranja de humildade
amarga lança
até que a voz me doa.
Mas nunca se dói só quem a cantar magoa
dói-me o Tejo vazio dói-me a miséria
apunhalada na garganta.
Dói-me o sangue vencido a nódoa negra
punhada no meu canto.
(Ary dos Santos)
o meu voto é útil
há muitos anos que não se assistia neste país tão empobrecido a uma campanha eleitoral tão intensa. até eu que não tenho o hábito de assistir a debates dei comigo em frente à televisão não por estar interessada na propaganda de sempre mas para saber quem afinal é capaz de enganar melhor. tenho ouvido como de todas as outras vezes o apelo ao voto útil. mas afinal o que é o voto útil? para que serviram os milhões de votos úteis depositados ao longo destes anos nas urnas com cruzinhas no ps no psd ou no pp? não é preciso pensar muito para chegar à conclusão que o meu voto é muito mais útil que todos esses milhões de votos. e tem tido a vantagem de nunca me arrepender. voto útil é votar naquilo em que acredito. voto útil é votar no que considero melhor mesmo sabendo que provavelmente nunca ganhará eleições mas também sabendo que dentro ou fora da a.r. não vai trair o meu voto. não darei o meu voto a nenhum dos senhores que prometeram não aumentar impostos e depois com a desculpa do desconhecimento da verdadeira realidade das finanças a primeira coisa que fazem é aumentá-los. não darei o meu voto a quem alinha e depois pede desculpa. difícil mesmo é não ter que pedir desculpa. não darei o meu voto a quem quer privatizar um bem que é de todos como a água. já em miúda me revoltava contra quem vendia a água de todos como se fosse sua no interior de angola. não darei o meu voto a quem tem vergonha dos pobres e dá 30 altos cargos a cada um dos familiares ou amigos. se desse o meu voto a qualquer um dos senhores que contribuiu para o empobrecimento do país nunca mais seria capaz de me olhar no espelho. o meu voto como sempre será um voto útil. para mim e para quem o receber.
27 maio, 2011
o melhor do twitter
chicolatras os chicólatras
"Pense que eu cheguei de leve;
Machuquei você de leve;
E me retirei com pés de lã"
Clã - Amuo (clica aqui)
Nada nos falta, porque nada somos
Ao longe os montes têm neve ao sol,
Mas é suave já o frio calmo
Que alisa e agudece
Os dardos do sol alto.
Hoje, Neera, não nos escondamos,
Nada nos falta, porque nada somos.
Não esperamos nada
E temos frio ao sol.
Mas tal como é, gozemos o momento,
Solenes na alegria levemente,
E aguardando a morte
Como quem a conhece.
(Ricardo Reis)
Mas é suave já o frio calmo
Que alisa e agudece
Os dardos do sol alto.
Hoje, Neera, não nos escondamos,
Nada nos falta, porque nada somos.
Não esperamos nada
E temos frio ao sol.
Mas tal como é, gozemos o momento,
Solenes na alegria levemente,
E aguardando a morte
Como quem a conhece.
(Ricardo Reis)
é só
ouço e leio a todo o instante falar em perdoar. são as beatas os email's naturalmente construídos por gente que tem pouco que fazer ou que usa
tempo em que podia fazer algo de útil a brincar com o power point. são talvez desempregados ou quem sabe mal empregados. seja como for. cumprida a maior parte dos anos da minha vida aprendi que não sou ninguém para perdoar. mas sou gente que cresceu e todos os dias erra e todos os dias acerta e todos os dias aprende. há uns anos (bastantes) eu era capaz de manter raivas e ódios. hoje a ira não passa de uma lembrança e os ódios tornaram-se de estimação e não fazem mal a ninguém. aprendi a transformar tudo o que me desagrada muito em nada ou seja se alguém me mereceria uma raiva ou ódio há uns anos hoje merece uma indiferença tão grande que posso passar a vida ao lado dessa pessoa sem sequer me aperceber que ela existe. e não precisei de qualquer treino especial. a minha vida tornou-se muito mais interessante. talvez porque eu aprecie tanto estar comigo mesma ou simplesmente porque um dos meus ódios de estimação é ouvir dizer " a gente vamos" e outros insultos à oralidade da gramática portuguesa. e já que as palavras são como as cerejas sempre vos digo que nos devíamos preocupar mais com o nível de aprendizagem dos alunos do 12º ano do que com as novas oportunidades. é o que me apetece dizer. hoje.
19 maio, 2011
Sexto andar - Clã (clica aqui)
18 maio, 2011
Os Velhos
Todos nasceram velhos — desconfio.
Em casas mais velhas que a velhice,
em ruas que existiram sempre — sempre
assim como estão hoje
e não deixarão nunca de estar:
soturnas e paradas e indeléveis
mesmo no desmoronar do Juízo Final.
Os mais velhos têm 100, 200 anos
e lá se perde a conta.
Os mais novos dos novos,
não menos de 50 — enorm'idade.
Nenhum olha para mim.
A velhice o proíbe. Quem autorizou
existirem meninos neste largo municipal?
Quem infrigiu a lei da eternidade
que não permite recomeçar a vida?
Ignoram-me. Não sou. Tenho vontade
de ser também um velho desde sempre.
Assim conversarão
comigo sobre coisas
seladas em cofre de subentendidos
a conversa infindável de monossílabos, resmungos,
tosse conclusiva.
Nem me vêem passar. Não me dão confiança.
Confiança! Confiança!
Dádiva impensável
nos semblantes fechados,
nos felpudos redingotes,
nos chapéus autoritários,
nas barbas de milénios.
Sigo, seco e só, atravessando
a floresta de velhos.
(Carlos Drummond de Andrade)
Em casas mais velhas que a velhice,
em ruas que existiram sempre — sempre
assim como estão hoje
e não deixarão nunca de estar:
soturnas e paradas e indeléveis
mesmo no desmoronar do Juízo Final.
Os mais velhos têm 100, 200 anos
e lá se perde a conta.
Os mais novos dos novos,
não menos de 50 — enorm'idade.
Nenhum olha para mim.
A velhice o proíbe. Quem autorizou
existirem meninos neste largo municipal?
Quem infrigiu a lei da eternidade
que não permite recomeçar a vida?
Ignoram-me. Não sou. Tenho vontade
de ser também um velho desde sempre.
Assim conversarão
comigo sobre coisas
seladas em cofre de subentendidos
a conversa infindável de monossílabos, resmungos,
tosse conclusiva.
Nem me vêem passar. Não me dão confiança.
Confiança! Confiança!
Dádiva impensável
nos semblantes fechados,
nos felpudos redingotes,
nos chapéus autoritários,
nas barbas de milénios.
Sigo, seco e só, atravessando
a floresta de velhos.
(Carlos Drummond de Andrade)
boudou sauvé des eaux
uma comédia de jean renoir de 1933. uma estória simples mas muito bem contada e interpretada. uma delícia estar na cinemateca a olhar imagens recuperadas de um filme com quase oitenta anos. e assisto deliciada solto gargalhadas como há muito tempo não acontecia e sinto uma felicidade infantil invadir-me. boudou querido como lhe chamaram em português é um vadio bronco mas simpático que se atira ao rio e é "salvo" por um livreiro que se assume como um verdadeiro burguês (interessante que na altura ser burguês era uma honra. hoje se nos foge a boca para a verdade e chamamos burguês a alguém somos imediatamente acusados de usar chavões de esquerda). adiante. depois de muitas peripécias a mulher do livreiro envolve-se com boudou que detestava e descobre que o marido namora a criada (pois aqui está outra palavra maldita nos nossos dias. empregada doméstica ou secretária do lar, peço desculpa). adiante. boudou fica rico com uma cautela que o livreiro lhe oferecera e casa com a criada (insisto porque no filme ela é tão criada quanto o patrão é burguês). acabado o casamento boudou vira o barco onde seguia com a noiva e os padrinhos e desaparece. a noiva chora a morte do marido acabadinho de agarrar e este consegue chegar à outra margem desfazer-se do seu fato de noivo e voltar à sua bela vida de vadio. cá fora dou por mim a pensar no quanto era difícil fazer um filme em 1933. ontem ri à gargalhada graças a esse senhor do cinema francês mais de 30 anos passados sobre a sua partida. vale a pena estar atenta à programação da cinemateca. sem dúvida.
16 maio, 2011
o melhor do twitter
chicolatras os chicólatras
"Há de haver algum lugar; Um confuso casarão;
Onde os sonhos serão reais; E a vida não"
Queda do Império - Vitorino (clica aqui)
Vinheta
Eu sei! Eu sei!
Se sair daqui, o rio me engolirá...
É o meu destino: hoje devo morrer!
Mas não, a força de vontade pode superar tudo
Há obstáculos, eu reconheço
Não quero sair.
Se tenho que morrer, será nesta caverna.
As balas, o que podem as balas fazer comigo
se meu destino é morrer afogado? Mas vou
vencer o destino. O destino pode ser
conseguido pela força de vontade.
Morrer, sim, mas crivado de
balas, destroçado pelas baionetas, se não, não. Afogado não...
Uma recordação mais duradoura do que meu nome
É lutar, morrer lutando.
(Ernesto Guevara – 17 de janeiro de 1947)
façam o favor de sair
ergo os olhos para perceber quem me olha daquela maneira. quero saber a quem pertence aquele olhar que me fez erguer os olhos do moleskine e descubro que é um olhar de "frete" como se dizia no tempo que foi do meu pai ou de "carneiro mal morto" e pertence a um homem jovem vestido como um guerrilheiro urbano. tem cabelo louro comprido e encaracolado e uma barba densa e não aparada. usa um brinco na orelha e tem um físico cuidado de guerrilheiro. usa botas tipo militar claro provavelmente compradas na feira da ladra a alguém que as comprou a alguém que as fanou ou surripiou quando terminou o serviço militar. há quem as traga por recordação e há quem queira pura e simplesmente uma vez na vida receber o soldo certo. o seu olhar não me larga e entretanto eu decido controlar as entradas e saídas no metro conforme as estações. em alvalade e roma saem as velhas bem vestidas e de cabelo ripado para disfarçar a falta do mesmo. no areeiro saem jovens de mala james bond na mão e na alameda pois sai gente de todo o género. daí ao martim moniz não sai nem entra muita gente mas aqui saem os orientais africanos ciganos muçulmanos enfim toda uma fauna de emigrantes que espalham em redor de si ondas de cor e aromas diferentes e de repente esqueci o guerrilheiro urbano. no rossio saem turistas e na baixa chiado sai uma multidão de gente jovem. no meio dessa multidão sai o meu guerrilheiro urbano. e eu fico mais só até ouvir a voz que diz cais do sodré estação terminal façam o favor de abandonar o comboio. se calhar não é bem assim mas o sentido é o mesmo.
11 maio, 2011
o melhor do twitter
ondjaki Ondjaki
[...] acesa - a tarde? depois do golpe da angústia ou durante o sopro que imita a vida?
... eu convoco aos meus sonhos a palavra rebelião!
Diálogo
Clã - Embeiçados (clica aqui)
faz isso por mim leonor
chegaste leonor como quem não sabe o que se passa neste mundo. e sabes. sabes tão bem que dormes. levas o dia todo a dormir. assim uma espécie de gatinha que dorme o dia todo e de repente despertas com toda a energia e viras o teu mundo do avesso. os teus pais não se queixam. eu que já passei por muitos bebés sei que tu trazes dentro de ti a minha revolta. e por isso choras a plenos pulmões. és muito pequenina e não sabes ainda gritar mas um dia destes aprendes. eu sei que aprendes. tu minha neta. tu a princesa desejada e esperada com muito amor. tu que hás-de crescer afastada de mim como o teu primo pablo e que eu hei-de amar da mesma maneira saudosa e triste quando sinto que tudo farão para que acredites que só tens uma família. tal como o país em que nasceste. só quem tem poder pode mandar. quem não tem submete-se. por isso te digo querida leonor aprende a rebelar-te. aprende rapidamente uma coisa tão simples como saber o que está certo e o que está errado. não deixes que te manipulem. não permitas leonor tu que nasceste princesa com um nome de rainha que te imponham verdades que não são tuas. tu que já nasceste num tempo tão distorcido num mundo virado do avesso abre esses pulmões e deita cá para fora tudo o que te incomoda. faz isso por mim que não posso gritar sem magoar quem amo. faz isso por mim leonor. eu que te hei-de amar até ao último dia da minha vida. mesmo que te digam que não.
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