o rapaz com os auscultadores nos ouvidos balança a cabeça num movimento violento contra o peito. depois pára desliga os auscultadores e atende o telemóvel mas logo a seguir desliga a chamada e volta a ligar os auscultadores e a abanar a cabeça com a mesma violência como se quisesse dizer sim sim sim e eu chego a temer que a cabeça se solte do pescoço. a rapariga bem feita com cara de madona de olhos arregalados senta-se à minha frente e eu tenho dificuldade em largar aqueles olhos tão arregalados como se tudo à volta dela lhe causasse um tremendo espanto. a rapariga ao meu lado levanta-se para sair e a madona de corpo bem feito e olhos arregalados senta-se ao meu lado. concentro-me de novo no rapaz que continua a abanar a cabeça violentamente como se quisesse que ela caísse. finalmente também ele se dirige para a saída. fecho os olhos e vou assim até à última paragem quando ouço cais do sodré estação terminal senhores passageiros queiram abandonar o comboio. a multidão de fim de tarde desagua no cais e dirige-se às portas automáticas. sigo o meu caminho subo as escadas rolantes e eis-me no cais do comboio. sete da tarde. o céu muito nublado ameaça chuva. quem não saiba pensa que estamos no outono. se calhar estamos e eu não dei por isso.
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