Vamos fazer de conta que o acordo ortográfico é obrigatório. Melhor: vamos fazer de conta que eu me rendi à pontuação. Melhor ainda: faço de conta que as vírgulas não me incomodam. Posto isto o Mika aproxima-se e leva o carinho que pediu. Senta-se no sofá mais próximo de mim e, por ele, digito uma vírgula. Agora senta-se e trata da sua higiene pessoal. Primeiro lambe a pata direita e então lava a cara. Vai continuar o seu trabalho e só se interrompe para olhar os meus dedos que se passeiam pelo teclado, sem saber muito bem onde se encontra a vírgula. Tal como os vários calceteiros que, na avenida da República em Lisboa, se encontram há dias a fazer um trabalho que não me parece ter qualquer hipótese de chegar ao fim. E foi esta sensação que me fez parar e tentar perceber para que são precisos cinco homens para reparar meio metro de calçada. E afinal, se o método fosse seguido por todos os empregadores, talvez o buraco orçamental não sofresse tanto e, quem sabe, o problema do desemprego estivesse resolvido. O primeiro dos homens estica o braço para o pequeno monte de pedras e pega numa delas. Passa-a para um segundo homem que a passa a um terceiro que a pousa no chão. O quarto homem coloca a pedra com todo o cuidado junto das outras que formam a calçada e, então surge o quinto homem, o actor principal, o porta voz de todo o grupo, o porta voz de todos os que como eu, não andam por Lisboa a ver passar eléctricos, mas a aprender como se constrói a calçada portuguesa... eis o homem! O eleito para dar a imprescindível porrada na pedra!
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