24 março, 2008

Coisas de quem não tem mais nada em que pensar...


Tem entre 30 a 40 anos (por aqui se vê como sou inútil quando tento adivinhar a idade de alguém), veste calças de ganga azul, uma camisola preta e um lenço à Arafat preto e branco. O cabelo está cortado por igual à maquina 1 e usa uns óculos escuros demasiado largos para o seu rosto. Vai sentado na mesma carruagem de metro em que sigo, num dia em que não houve hora de ponta nos transportes públicos. Cá para mim muita gente tirou hoje a sua tolerância de ponto, por mim até deviam continuar amanhã e depois e depois ad eternum... é que gosto muito de sentir Lisboa assim, a bater lentamente, como se fosse realmente minha.
O sujeito pega no telemóvel marca um número e começa a falar. Alto. Muito alto. Tão alto que eu, que levo os auscultadores do MP3 nos ouvidos consigo ouvir perfeitamente a conversa. Combina com alguém encontrar-se mais tarde em casa da Patrícia. Que lhe liguem para ele ou para ela... não neste momento não está com ela mas estará dentro de meia hora...
Desliga a chamada e inicia outra. Dá gargalhadas altíssimas como se a sua felicidade dependesse da sonoridade das gargalhadas. Como se esperasse que à sua volta todos começassem a rir à gargalhada. Desisto. "Desligo" do homem com óculos escuros demasiado grandes e demasiado escuros, numa tarde no metro de Lisboa e concentro-me na música que estou a ouvir...
Na estação do Rossio vejo o homem sair. Reparo que tem um modo estranho de caminhar. Meio desengonçado, numa tentativa de bambolear as ancas.
Penso para mim aquele andar não condiz com a sua aparência.

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