Ausentes

Hoje ao ver "Os ausentes" de Scorsese, lembrei-me. Nada que o filme me tivesse feito pensar. Na realidade é apenas mais um Scorsese sobre a realidade americana .

O que me fez lembrar foi o nome ausentes. Quem são os ausentes para cada um de nós. Para mim são todos os que se ausentaram da minha vida por um qualquer motivo. E voltei à minha infância.

E comecei a pensar nos da minha rua. Os meninos da minha rua, que era uma rua de vivendas de classe média (nesse tempo não se falava em classe média alta e classe média baixa... ou se era da classe alta, ou da média ou da baixa e ponto final...).

Pois os da minha rua eram o Jorginho, o Barrábas, o Tó-Zé, o Zezo, o Toni, o Euclides. Havia depois os mais crescidos que não mos davam confiança e os cotas.

A rua era de vivendas quase todas geminadas, duas a duas ou quatro a quatro (era o caso da vivenda em que vivia com a minha família). Tinham à frente pequenos jardins e atrás pequenos quintais. Eram vivendas de dois andares, onde geralmente no rés do chão ficavam a sala, a cozinha, uma pequena casa de banho e o quarto da empregada. Em cima ficavam os quartos.

Acontece que os jardins competiam em formosura uns com os outros. Havia um jardineiro, homem branco e já de certa idade, de barba e cabelo hirsutos que passava mais ou menos uma vez por semana a cuidar dos jardins.

Quando alguém lhe pedia para plantar no seu jardim uma roseira igual à da vizinha por exemplo, ele simplesmente retirava a que tinha posto na vizinha e plantava-a no jardim da cliente actual.

Daí que o seu apelido fosse o Rapinol. Assim que o homem acabava o seu trabalho e saía em direcção à sua própria casa, juntávamo-nos todos os da minha rua e seguíamo-lo gritando Rapinol, Rapinol... Quando ele se cansava de nos ouvir, voltava-se para trás e dava uma corrida em direcção a nós com a sua enorme tesoura de jardineiro que nos assustava e fazia dispersar...

Mas na vez seguinte tudo se repetia.

O Rapinol é também um dos ausentes da minha vida. Um ausente que ficou na minha infância.